Crítica: "Transcendence – A Revolução" falha ao discutir relação entre humanos e máquinas

No cinema, a ficção científica sempre procurou mostrar os aspectos positivos e negativos da interação entre homens e máquinas. Essa ideia já gerou obras e personagens marcantes, como o Hall 9000 de “2001: Uma Odisseia no Espaço” ou mesmo “O Exterminador do Futuro”. Com o advento da internet e a explosão dos smartphones e os tablets, essa relação atraiu a atenção de diretores e roteiristas que, quando sabem o que estão fazendo, conseguem realizar ótimos trabalhos, como o belo e sublime “Ela”, vencedor do Oscar 2014 de Melhor Roteiro. Quando é mal feito, resulta em filmes constrangedores como esse “Transcendence – A Revolução” (“Transcendence”).
TRANSCENDENCE
Na trama, escrita por Jack Paglen, o Dr. Will Caster (Johnny Depp) é um dos mais renomados cientistas especializados em inteligência virtual. Ele procura criar uma máquina capaz de ter uma consciência mais próxima possível da humana e seu trabalho, embora admirado, também é bastante questionado eticamente. Durante uma palestra, ele é vítima de um atentado provocado por extremistas anti-tecnologia, liderados por Bree (Kate Mara) e descobre que não tem muito tempo de vida. Desesperada, sua esposa Evelyn (Rebecca Hall) pede ao seu melhor amigo Max Waters (Paul Bettany) que ajude a transferir a consciência de seu marido para um computador através de um novo processo que ainda está em desenvolvimento antes que ele venha a falecer. O processo funciona e Will volta a “viver”, agora virtualmente, e sua “mente” é transferida por Evelyn para uma pequena cidade. O problema é que ele começa a ficar cada vez mais ávido por informações e se torna, alguns anos depois, uma espécie de ser onipresente que, ao mesmo tempo que cria aperfeiçoamentos para melhorar a vida das pessoas, acaba por torná-las suas escravas. Preocupado com Evelyn, Max tenta deter os planos de Will, contando com a ajuda do veterano Joseph Tagger (Morgan Freeman), do agente da CIA Buchanan (Cillian Murphy) e até mesmo de Bree e seus comparsas.
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Um dos graves problemas de “Transcendence – A Revolução” está na fraca direção de Wally Pfister, ganhador do Oscar 2011 de Melhor Fotografia por “A Origem” e habitual colaborador de todos os filmes de Christopher Nolan (que aqui assina como um dos produtores executivos) desde “Amnésia” (2002). Ele não consegue dar o dinamismo necessário para tornar o filme interessante e investe num andamento mais lento com o intento de fazer o público “refletir” sobre as questões levantadas na trama. Mas o que consegue, no fim das contas, é causar sono e indiferença. Quando a história deixa o seu lado “intelectual” para se concentrar na ação, em seu terço final, é aí que a coisa fica ainda pior, pois Pfister tenta emular o estilo de Nolan. Porém, fica claro que o “discípulo” está a anos luz de distância do “mestre”. O roteiro, aliás, também peca ao criar situações cada vez mais absurdas e sem sentido, como transformar as pessoas curadas pelas invenções de Will em “zumbis cibernéticos”, além de desenvolver mal os personagens, especialmente Bree, que no começo (talvez por ser a “vilã”) é uma pessoa fria e, no decorrer da trama, vai ficando mais sentimental.
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Cultuado pelo grande público por seus personagens excêntricos, Johnny Depp precisa sair do piloto automático que se submeteu para atuar o mais depressa possível. Parece que, depois da sua consagração como o Capitão Jack Sparrow na franquia “Piratas do Caribe”, Depp está fazendo variações de seu mais conhecido papel no cinema e aqui, não é muito diferente. Até a voz lembra o que ele realizou nos quatro filmes da Disney e, embora precise mostrar uma certa frieza (já que, em boa parte da trama, ele representa uma máquina), não consegue causar nenhuma empatia. O resto do elenco também não se destaca. A bela Rebecca Hall tem o trabalho mais difícil, já que teve que fazer muitas de suas cenas praticamente sozinha, falando para uma tela. Mesmo com essa dificuldade, ela realiza uma performance apenas correta e, especialmente na parte final, se limita a ficar com cara de assustada. Paul Bettany praticamente repete o que já fez em outros papéis e Cillian Murphy não tem muito o que fazer. Já Kate Mara sabe apenas fazer biquinho e cerrar os olhos para bancar a ativista obcecada. O maior desperdício, no entanto, é a má utilização do ótimo Morgan Freeman num papel que não acrescenta em nada nem à trama nem à sua consagrada carreira.
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Com elementos que lembram alguns aspectos do então inovador (por lidar com questões sobre a realidade virtual), mas hoje pouco lembrado “O Passageiro do Futuro” (1992), “Transcendence – A Revolução” poderia ter sido bem mais interessante se tivesse sido conduzido por um diretor mais experiente e talentoso. Infelizmente, Wally Pfister se mostrou ineficaz para estar a frente de um projeto tão grandioso e com grandes estrelas. Como o seu protagonista, ele ainda tem chances de produzir coisas mais interessantes com o tempo. Assim como Johnny Depp, que precisa escolher melhor seus futuros projetos e não desperdiçar seu incontestável talento. Caso o contrário, ele corre o risco de ter seu nome e sua carreira se tornarem uma vaga lembrança na memória de todos.

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