Na Lata: “Vertigo não é quadrinho adulto”

Uma provocação: acho que a Vertigo não é Quadrinho adulto. É HQ com mais sexo e mais violência, e no geral mais bem escrita, com idéias mais arrojadas, mas não é quadrinho adulto na acepção normalmente usada, de algo mais próximo da Grande Literatura. Vejo algo essencialmente adolescente nela: a idéia de que existe um mundo mais “real” ou “verdadeiro’ debaixo da aparente trivialidade cotidiana, acessível às pessoas mais “sagazes”. Existem mil variações disso (de Arquivo X ao Harry Potter), que fundamentalmente corresponde ao desejo adolescente de que o mundo seja mais excitante e cheio de aventuras do que ele realmente é. O desprezo adolescente pelo “homem médio” e o prazer em ser excêntrico (em geral adotando uma persona padrão de alguma tribo urbana). Isso vale para o Grant Morrison (vide “Os Invisíveis”), Alan Moore (“Liga dos Homens Extraordinários”), Neil Gaiman (“Sandman” ou “Livros da Magia) e Warren Ellis (“Planetary”), ficando nos exemplos mais conhecidos.

É claro que adoro tudo isso. Eu assumo que tenho muito mais facilidade em acompanhar super-heróis, sci-fi e histórias de crime do que Quadrinho Adulto.

O que considero HQ adulta, pra valer…. “Maus” do Art Spielgman (sobre o Holocausto judeu), as reportagens em quadrinhos do Joe Sacco (“Gorazde”, sobre a guerra da Bósnia), parte da obra dos Irmãos Hernández (principalmente as histórias sobre Palomar), “Asterios Polyp” do David Mazzucchelli, “Fun Home” de Alison Bechdel, “Epiléptico” de David B. (uma obra prima, sobre epilepsia, esquizofrenia e macrobiótica), as narrativas de viagens de Guy Delisle (são quase etnografias sobre a China, a Birmânia e a Coréia do Norte). Talvez o Charles Burns (“Black Hole”) e o Petter Bagge (“Ódio”). São trabalhos que falam da vida real, mesmo. Ou que contam histórias mais simples, até fantasiosas (em geral do folclore), mas com um grau de experimentação gráfica realmente séria – é o caso de “Goodbye Chenky Rice” de Craig Thomson, “A comadre do Zé” de Luciano Irrthum, “Morro da Favela” de André Diniz, o trabalho de Dave Cooper e “O menino mais esperto do mundo” de Chris Ware. Alguma coisa do Lourenço Mutarelli entraria aqui, mas acho que não “O Dobro de Cinco” (uma excelente série de histórias policiais, na real – assim como “O Corno que sabia demais” do Wander Antunes, Gustavo Machado e Paulo Borges).

E ficam algumas dicas pras moças, de quadrinhos realmente adultos: “Negrinha” de Jean-Christophe Camus e Olivier Tallec, “O espinafre de Yukiko” de Frédéric Boilet (erotismo fino e não-sexista), “Aya de Yopougon” de Marguerite Abouet e Clément Oubreire (sobre uma jovem africana), “Fat Free” de Jude Milner e Mary Milshire (autobiográfico, sobre uma mulher mega obesa que foi militante de um certo “orgulho-obeso” e depois encarou seus demônios internos, se livrando do problema).

 

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