A saudável ambição do Cachorro Grande em “Electromod”

O último levante do rock brasileiro com projeção na mídia se deu ali pela virada do milênio. Na época, o disco físico ainda era a principal forma de se consumir música, e a MTV e o rádio ainda dedicavam espaço ao gênero. Isso sem contar com os meios alternativos, como vendas de discos em  revistas como a “Outra Coisa” do Lobão. Nessa época três então novas bandas se destacavam: os cariocas do Los Hermanos, os paulistas do Charlie Brown Jr. e os gaúchos do Cachorro Grande.

Os primeiros vinham com influência de Beatles, Mutantes e Bossa Nova; os segundos estavam em sintonia com a mistura de hardcore com RAP/Hip Hop do Rage Against the Machine e do 311. Já o Cachorro trazia uma mescla da tríade que formava os pilares da british invasion: Beatles, Rolling Stones e The Who. A isso, ainda adicionavam uma verve punk garageira. O disco de estreia deixava esses elementos bastante evidentes.

A formação atual conta com Beto Bruno (vocal), Marcelo Gross (guitarra), Rodolfo Krieger (baixo, substituindo o membro original Jerônimo Bocudo desde 2005), Pedro Pelotas (teclado) e Gabriel Azambuja (bateria). Depois de abrir os show dos Rolling Stones na etapa gaúcha da “Olé Tour” no início do ano, o Cachorro Grande finalizou seu último disco de estúdio “Electromod” (Coqueiro Verde/2016) que está sendo lançado nessa semana.

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Mais uma vez Edu K (vocalista de uma das principais bandas gaúchas dos anos 80, o De falla) foi chamado para produzir.  Ele já tinha sido responsável pelo anterior, “Costa do Marfim”, do qual pode-se dizer que “Electromod” é uma continuação direta. Foi a partir dele que deu-se uma guinada na sonoridade do grupo para algo mais psicodélico e experimental.

Se os primeiros trabalhos soavam como Beatles, Stones e Who nos primeiros álbuns, nos últimos eles têm evocado o período em que essas bandas embarcaram em uma maior ambição artística, ali pela segunda metade dos anos 60. E influências de Pink Floyd (fase inicial, com Syd Barrett à frente), Pretty Things e Mutantes também podem ser sentidas nitidamente. No entanto, apesar de a primeira faixa ‘Tarântula’ abrir com um batidão sacolejante, “Electromod” está longe um disco de música eletrônica. Inclusive é menos viajandão do que “Costa do Marfim”.

Neste, as guitarras se fazem notar de maneira mais assertiva, casando perfeitamente com os efeitos sonoros que vão surgindo para adornar as composições. A faixa-título, por exemplo, traz todo o espírito da fase inicial dos rapazes, mas com uma acelerada batida trance fazendo participação especial. A faixa seguinte, ‘Nem Tudo É Mais Como Era Antes’, já se baseia prioritariamente nos efeitos eletrônicos e consegue um bom resultado.

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‘Subir É Fácil, Difícil É Descer’ é uma das melhores músicas do álbum, e podia muito bem ter sido gravada em 1967. É uma das faixas em que Beto deixa o posto de vocalista para um colega, no caso aqui, quem assume é Krieger. Em ‘Pandora’ e ‘De Longe Todo Mundo É Normal’ a função fica a cargo de Gross e Pelotas respectivamente.

Na reta final do disco há o rockão ‘Eu Sei Que Vai Feder’, bem aos moldes dos primeiros trabalhos da banda. ‘Ben-Hur’ (nome dado por ser um dos filmes favoritos de Beto) fecha o disco fazendo uma perfeita síntese da faceta mais roqueira com a mais experimental. E a frase “essa coisa louca nunca mais vai acabar”, repetida como mantra no final, pode até ser entendida, entre outras coisas, como um aviso de que essa fase psicodélica irá se estender por mais álbuns.

Por hora, a receita funcionou. “Electromod” é um bom disco, que merecer destaque entre os lançamentos nacionais de 2016. Seguindo os passos de seus gurus, o Cachorro Grande busca olhar para fora da caixinha, sem perder a autenticidade, e, com isso, dar estofo à sua música. Para os nostálgicos e saudosistas, o álbum será lançado também em vinil e cassete. Bem ao estilo vintage defendido pelo grupo.

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