Logo à primeira audição da banda Temples, a impressão que se dá é de estarmos ouvindo a uma das várias bandas que surgiram nos anos 60, mais precisamente por volta de 1966. Daquelas que são ótimas, mas que não chegaram a fazer grande sucesso na mídia, por estarem obscurecidas por Beatles, Rolling Stones e The Who. Você até dá uma procurada naquela série de compilações de bandas do período chamada Nuggets, e nada. Até que olha no Google e se dá conta de que é uma banda surgida em 2012, que debuta com seu primeiro álbum em 2014. Sun Structures é uma verdadeira viagem no tempo.
Formada na cidade de Kettering, Inglaterra (conhecida por uma forte indústria de calçados erigida no século XIX), a banda é composta pelo vocalista e guitarrista James Bagshaw, o baixista e vocalista Thomas Warmsley, o baterista Sam Toms e o guitarrista e tecladista Adam Smith. Eles lançaram seu primeiro single, “Shelter Song“ em 2012. Depois de um atribulado 2013, passaram a fazer shows e gravar o álbum, mas já tinham lançado dois singles (“Colours of Life”, em junho e “Keep in the Dark”, em Outubro). O álbum só ficaria pronto no início de 2014.
O Temples é classificado como Neo-Psychodelia, mas a classificação pode ser questionada, pois não há em sua sonoridade nenhum elemento moderno que indique o “neo”. O Temples vai mais fundo no mergulho no passado do que os escoceses do Cosmic Rough Riders ou os conterrâneos do Kula Shaker, por exemplo. Eles são como o Black Crowes, que em 1991 lançaram “Shake Your Money Maker”, em meio às microfonias e distorções do grunge, mas querendo soar como uma banda ali por volta de 1972. A referência às influências dos rapazes surge logo na capa do álbum, claramente uma alusão à capa de “Who’s Next”, disco do The Who considerado o melhor da banda.
Os Beatles são a inspiração predominante nas composições do Temples, mas também são perceptíveis ecos de Who, Byrds e Pink Floyd na fase Syd Barrett. Produzido por Bagshaw, o disco, lançado pelo selo Fat Possum, conta com 12 faixas distribuídas em pouco mais de 52 minutos. A faixa que abre o álbum, ‘Shelter Song’ é o casamento perfeito da sonoridade dos Beatles na fase Rubber Soul com os dois primeiros trabalhos do The Who. Talvez seja a faixa que sintetiza todo o clima do disco, sendo assim um perfeito cartão de visitas. Já a segunda faixa nos remete ao Pink Floyd do álbum “The Piper At The Gates Of Dawn”, o debut da banda. Já ‘The Golden Throne’ evoca a música pop superproduzida e orquestrada (da qual os Beatles também se apropriaram) daquele período. Keep The Dark, ‘Mesmerise’ e ‘Move With The Season’ mantêm a atmosfera lisérgica. Ao ouvir Colour to life, a sétima faixa, chama atenção pela beleza dos arranjos. George Martin ouvir ficará orgulhoso dos meninos.
O que torna inevitável as comparações com o quarteto fantástico de Liverpool, além das melodias, é que Bagshaw canta com o mesmo timbre de John Lennon, às vezes tão idêntico que chega a assustar, como na faixa ‘A Question Isn’t Answered’. Já Test of Time usa como base a mesma batida de ‘Tomorrow Never Knows’, que já havia sido usada pelos Chemical Brothers em parceria com Liam Gallagher do Oasis.
O resultado é igualmente satisfatório, como a música de 1996. A audição do som dos Temple prova que emular o passado não é pecado se for feito com verdade, honestidade, talento, e o principal: personalidade própria. Do contrário, seria apenas uma banda cover tocando no Cavern Club na Beatles Week.