O Mercado Nacional de Quadrinhos Desmoronou Fronteiras

Artigo escrito pelo emérito Delfin.

O texto feito por Marcio Baraldi no último artigo do Bigorna antes de seu fechamento oficial – sobre o fim do sonho do quadrinho nacional, atacando de forma completamente irracional e leviana Mauricio de Sousa e defendendo posições arbitrárias e retrógradas – apenas diz muito sobre o pensamento de uma parcela de criadores nacionais que, ao mesmo tempo que se diz injustiçada pela mídia, gostaria muito de estar dando as cartas no mercado editorial ou, pelo menos, queria que ele tivesse um teor nacionalista mais exacerbado. Houve muitos defensores exaltados desse nacionalismo no Brasil, mas os mais conhecidos dentre eles não constam entre as figuras mais positivamente lembradas pela sociedade democrática. Entre eles estão, por exemplo, Plínio Salgado, o famoso líder integralista brasileiro (o integralismo, lembrando, é um movimento político social de viés ultranacionalista, atacando o estrangeiro de forma incisiva e que, hoje em dia, ainda existe) e os defensores da ala cultural dos movimentos de direita e do exército brasileiro, que conduziram, nos anos 1960, ao estado de coisas que conduziram o país ao golpe militar de 1º de abril de 1964. Baraldi, que faz um tipo de humor de nicho que, por acaso, eu gosto, vem demosntrando repetidamente um tipo de posicionamento que o alinha a este pensamento antigo, mas não é apenas ele: há todo um setor da sociedade que, cada vez mais, sinaliza o crescimento radical de opiniões alinhadas ao ultranacionalismo e à ultradireita do país.

O Mercado Nacional de Quadrinhos Desmoronou Fronteiras – Ambrosia

Ser nacionalista é diferente de ser brasileiro. Estamos às portas do centenário da semana de 1922 e as pessoas ainda não entenderam isso. O nacionalismo fecha fronteiras, limita a população, faz com que nos prendamos a conceitos tão distantes da realidade atual que muitos não compreendem que não é preciso perder uma identidade pátria, que é algo muito mais do sentimento de cada pessoa, para caminhar rumo à união de povos e nações. É o caminho para o qual o mundo converge, ser um mundo, não um bando de nações e fronteiras picotados pelo globo em divisões imaginárias que, desde Yuri Gagarin, se sabe com absoluta certeza que são arbitrariedades impostas por grupos de pessoas que apenas ambicionam o domínio e não o convívio fraternal, como é natural que seja. As fronteiras, o desejar o que está do outro lado do muro do vizinho, é o que move todos os tipos de guerras, desde as familiares até as globais. E o texto de Baraldi apenas tenta insuflar pessoas a criar, defender e atacar fronteiras.

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É por isso mesmo que eu acho que, enquanto um conjunto argumentativo de ideias (e não de fatos apresentados, porque Baraldi relembra grandes nomes do quadrinho nacional que precisam ser lembrados, não como argumento para criação de fronteiras, mas para a preservação da memória e criação de uma identidade nacional, que nos faça lembrar de nossas origens e se torne parte de uma história maior, a mundial), acredito que o texto publicado derradeiramente no site Bigorna não deva constituir parâmetro para nenhuma discussão que se pretenda mais séria. Pois foram posicionamentos como esse, no fundo, que isolaram o site em um nicho dentro de um nicho muito específico, ajudando a fazer com que, por exemplo, o prêmio que leva o nome do criador do quadrinho nacional, Angelo Agostini, se tornasse uma das premiações mais risíveis e lamentáveis da área, justamente por não ser representativa da realidade.

P.S.:
Há dois pontos sobre o artigo de Baraldi que eu queria discutir. O primeiro é quando ele fala sobre o quadrinho como “categoria”. Apesar de concordar que somos profissionais na área, seja desenhando, escrevendo ou mesmo criticando, creio que essa só pode ser uma visão de quem está há muito tempo vivenciando a realidade editorial com olhos organizacionais da política sindical brasileira, o que cria uma visão meio distorcida de como as coisas realmente estão. Mas há de se lembrar que Laerte, por exemplo, cresceu com sua carreira nos anos 1970 e 80 no meio de movimentos sindicais. E olhem, que bom, no que deu.

Outro ponto é o principal do texto dele: como o quadrinho pode estar desmoronando, se ele nunca esteve tão bem em termos de visibilidade, produção, qualidade e mesmo distribuição (inclusive para os independentes)? E, ouso dizer, pode tirar o Mauricio de Sousa das contas (do passado e de agora, para sermos justos) que isso continua a ser uma verdade. Eu não tenho dados concretos para corroborar o que eu estou dizendo, tudo bem, mas é como diria o inoxidável Galvão Bueno nas transmissões de Fórmula 1: é no visual.

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