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O inquietante Dias Felizes, de Beckett, na montagem do Armazém Companhia de Teatro 

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Uma figura humana quase soterrada, com metade do seu corpo imerso na terra, como se engolfada por um morro ou montanha ou vulcão, não é possível saber bem. Alguns apetrechos ao seu redor parecem ser tudo o que tem, tudo com o que pode contar: bolsa, espelho, escova e pasta de dentes, revólver. Perto dela, o companheiro, um sujeito que pouco fala, pouco interage e se locomove de uma maneira dificultosa, como se não fosse capaz ou não quisesse se levantar. A movimentação, para ambos, parece uma limitada ou inviável operação. Uma atmosfera de decadência envolve os personagens. 

Fotos: João Gabriel Monteiro

Assim se apresenta a nós Dias Felizes, inquietante espetáculo de Samuel Beckett, na montagem do Armazém Companhia de Teatro, com direção de Paulo Moraes. A engenhosidade desse grande dispositivo cênico sobre o qual a peça se passa (montanha, morro, vulcão?) impressiona. Demoramos a entender o cenário, a compreender e assimilar a condição da personagem Winnie, interpretada por Patrícia Selonk, e em que consiste a estrutura que tem metade de seu corpo fagocitado e a outra metade, por enquanto, não. Tudo instiga nossa atenção e tudo parece ser uma questão de tempo.  

O espetáculo, em final de breve temporada no Espaço Armazém, na Fundição Progresso (onde fica a sede da Companhia), retrata o desespero, em uma metáfora que pode remeter às mais variadas circunstâncias, sempre renovadas, claro. Não é fácil acompanhar o monólogo de Winnie, na medida em que remete à nossa própria condição de seres humanos também fugindo de algo ou em busca desesperada de sabe-se lá o que, entregues a um caminho que não sabemos se escolhemos percorrer ou já foi percorrido por outrem. No caso de Winnie, não há para onde correr, mas talvez essa não seja uma prerrogativa da personagem. Parece haver uma angustiada tentativa de sobreviver à situação em que se encontra e à falta de escolhas. Efetivamente, está em jogo o tédio, o sentido da vida, o propósito de ser (ou sua ausência), ainda que essas questões não sejam nomeadas como tal.  

Tudo o que se vislumbra em Dias Felizes é a inviabilidade. O que Winnie nos aponta, através de seus gestos e falas repetitivos, por suas tentativas de comunicação com Willie (interpretado em dias alternados por Felipe Bustamante, Isabel Pacheco e Jopa Moraes), é a irremediável e progressiva escassez de possibilidades. E resta a pergunta: o que Winnie e Willie têm a ver conosco?  

Talvez haja apenas uma esperança: Winnie tem uma arma de fogo. O que pode fazer com ela, não se sabe, apenas se pode intuir. Esse amuleto, porém, parece sinalizar uma garantia, embora não seja possível saber até quando ela terá possibilidade de manuseá-la. Dias Felizes é um espetáculo que não promete felicidade e que remete à angústia que todos nós carregamos e às maneiras como tentamos lidar com ela. 

Serviço 

Dias Felizes, de Samuel Beckett 

Direção: Paulo de Moraes 

Elenco: Patrícia Selonk (Winnie), Felipe Bustamante, Isabel Pacheco e Jopa Moraes (Willie) 

Local: Espaço Armazém – Fundição Progresso. Rua dos Arcos, 24, Lapa, Rio de Janeiro 

Dias 1º a 18 de maio. Quintas, sextas e sábados às 19:30h e domingos às 19h. 

Ingressos, a partir de R$40, à venda pela Sympla https://www.sympla.com.br/produtor/armazemciadeteatro 

Capacidade de público: 102 lugares 

Classificação indicativa: 14 anos 

Duração: 75 minutos 

Ficha técnica 

Dias Felizes, de Samuel Beckett 

Direção: Paulo de Moraes 

Elenco: Patrícia Selonk (Winnie), Felipe Bustamante, Isabel Pacheco e Jopa Moraes (Willie) 

Tradução: Jopa Moraes 

Iluminação: Maneco Quinderé 

Cenografia: Carla Berri e Paulo de Moraes 

Figurinos: Carol Lobato 

Música Original: Ricco Viana 

Designer Gráfico: Jopa Moraes 

Fotografias: João Gabriel Monteiro 

Assessoria de Imprensa: Ney Motta 

Pedras Cenográficas: Alex Grilli 

Efeito Sombrinha: Paulo Denizot 

Videografismo: João Gabriel Monteiro e Paulo de Moraes 

Assessoria para Videografismo: Rico Vilarouca 

Colaboração Artística: Lorena Lima 

Produção: Armazém Companhia de Teatro

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