Três perguntas ao escritor André Timm

André Timm é gaúcho, de Porto Alegre, radicado em Santa Catarina. “Insônia” (Design Editora, 2011), seu livro de estreia, foi Menção Honrosa no Prêmio SESC de Literatura. “Modos inacabados de morrer”, seu primeiro romance, foi o vencedor da Maratona Literária da editora Oito e Meio na categoria prosa. Mantém o site 2 mil toques, projeto autoral em que convida escritores a compartilharem suas rotinas e processos ligados à produção literária. Fizemos três perguntas ao escritor. Confira abaixo:

Ambrosia: Você usa a segunda pessoa na narração da história de Santi. Como você modulou a voz para ela se tornar fluída durante todo o processo do livro? 

André Timm: Todo o livro é narrado em capítulos curtos e, em grande parte, sem divisão de parágrafos, estimulando uma leitura quase que de um só fôlego. Isso, acredito, ajudou a trazer uma fluidez e um senso de urgência que compensam um pouco o peso da narrativa em segunda pessoa. Mas, para além disso, essa pessoa narrativa um tanto incomum, de certa maneira, foi uma aposta. Ao jogar o leitor com tanto ímpeto na pele de Santiago, eu acreditava que de um momento em diante a segunda pessoa poderia se tornar quase que invisível, especialmente depois do estranhamento inicial que ela causa. Quando a experiência de leitura alcança essa condição e essa parede é derrubada, a partir desse momento o leitor é Santiago e tudo que se sobressai é a história.

  • Como o distúrbio da narcolepsia entrou no seu romance? E como você o trabalhou narrativamente? Você já tinha interesse por distúrbios do sono já em outros livros?

AT: O sono (ou sua ausência) é um tema recorrente na minha produção. Interessa-me esse universo, bem como o do onírico, pois vejo nisso figuras de linguagem bastante poderosas que estabelecem paralelos interessantes com muito do que acontece no mundo hoje; essa letargia em que vivemos; essa sensação de não-pertencimento, como se estivéssemos enclausurados nesse eterno mito narrado por Platão, habitando uma caverna em que tudo aquilo que presenciamos não passa de sombras de alguma outra realidade que não está à nossa vista; ou ainda, essa constante sensação de vivermos um pesadelo eterno.

Meu livro anterior, por exemplo, Insônia, traz diversos contos que se passam em diferentes apartamentos de um mesmo edifício em que moradores insones têm algumas de suas histórias e dramas narrados. Em “Modos Inacabados de Morrer” eu passo ao extremo oposto: de personagens que pouco dormem, salto para um protagonista cujo problema é justamente dormir demais e à revelia da própria vontade.

O estímulo inicial para a criação de Santiago surgiu quando me deparei com um documentário que mostrava a vida de Dee Daud, um britânico que sofre de uma condição muito severa de narcolepsia, exatamente como a de Santi. Dee foi essencial na construção do personagem, visto que o entrevistei algumas vezes durante o processo de escrita. Com o entendimento de quem era Santiago e de como sua vida poderia ser afetada devido à doença, o processo narrativo se desenvolveu muito a partir das situações dramáticas que poderiam decorrer desse estado.

  • Fiquei sabendo que você foi para um hotel escrever este livro. Como foi este processo? Como ele influiu na tua escrita?

AT: Para terminar o romance, me isolei em um hotel de uma pequena cidade no interior de Santa Catarina. Foi uma medida extrema, naturalmente, uma espécie de tour de force cujo objetivo era voltar para casa com um primeiro rascunho pronto. Depois, ao retornar, tive tempo de reescrever as partes que julguei necessárias até chegar na versão final do livro. Importante observar que além de toda a estrutura narrativa pronta, cheguei com uma parte do romance já escrito. Ou seja, além de já ter a tônica do romance muito bem definida, eu já havia pensado em todas as cenas que deveriam ser escritas até o final. Mas mais do que tudo, esse processo foi um desafio e um aprendizado. Trancar-se sozinho por dias num quarto e conviver com seus fantasmas, personagens e sua próprias limitações enquanto escritor requer muita persistência. A batalha maior nunca é contra a página em branco, mas contra nós mesmos e nossas inseguranças.

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