Demência 21 de Shintaro Kago, um redemoinho de surrealismo para testar sua sanidade

Navegado pela Internet, encontramos, para nossa grande satisfação, alguns animações de Shintaro Kago (駕 籠 真 太郎). O interesse pelo trabalho tão peculiar foi motivo de procurar alguma publicação em português, e não é que um dos seus mais celebrados trabalhos, Dementia 21, foi lançado ano passado.

Demência 21 de Shintaro Kago, um redemoinho de surrealismo para testar sua sanidade – Ambrosia

O autor e sua obra

Shintaro Kago (1969) é um autor de mangás alternativo, “O artista bizarro do mangá”, conhecido por seu trabalho que combina humor, erotismo, escatologia e surrealismo. Rotulado com o gênero eroguro, o próprio mangaká o reconhece como parte de sua identidade artística, embora esclareça que não o representa em sua totalidade. Esse gênero artístico consiste no uso do erotismo grotesco, onde Kago-san transgride mais com um traço surrealista, dadaísta e transgressora, rompendo com os métodos tradicionais do mangá.

Dementia 21 é uma compilação de contos onde o humor e a crítica social se confundem através de uma simbiose perfeita, publicada no Brasil pela editora Todavia. A edição compila os 17 primeiros capítulos em um único volume em 280 páginas,

A ilusão do surrealismo

Demência 21 de Shintaro Kago, um redemoinho de surrealismo para testar sua sanidade – AmbrosiaDementia 21 é um mangá de 7 volumes lançado no Japão desde 2011. A narrativa nos apresenta Yukie Sakai, uma menina diligente que trabalha em uma empresa dedicada ao atendimento domiciliar de idosos. Por sua dedicação no trabalho, sempre recebe boas avaliações de seus clientes, o que faz com que alguns de seus colegas a invejem. Situação esta que será o gatilho para que ela receba clientes cada vez mais extravagantes e misteriosos, onde Sakai tentará obter a pontuação máxima a todo custo.

Desse modo, Shintaro Kago nos apresenta em cada história um amálgama transbordante de surrealismo, humor e crítica social; uma avalanche de delírios entre a sanidade e a loucura, fruto de uma imaginação transbordante.

Quanto ao desenho, poderíamos dizer que é rápido, não muito detalhado, embora a definição ideal seja minimalista. O autor consegue expressar perfeitamente as emoções dos personagens com alguns traços enquanto consegue um contraste com cenas mais detalhadas no clímax de cada história, que refletem perfeitamente o estilo peculiar.

As histórias eroguro

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Não faremos uma análise rigorosa de cada história, já que nossa intenção é mostrar ao leitor as virtudes deste mangá e não estripar seu conteúdo; mas algumas histórias merecem serem enunciadas pela relevância apresentada.

Na segunda história, Yukie é designada para cuidar sozinha de três senhoras, em uma clara tentativa de diminuir suas avaliações positivas. Como se isso não bastasse, mais e mais idosos aparecem a cada dia que passa. Temos aqui uma crítica clara à sociedade que abandona os idosos quando eles não são mais que um estorvo, uma crítica às famílias que abandonam seus pais ao ver que eles não são mais úteis.

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Em Dementia 21 encontramos críticas aos problemas da sociedade, mas também histórias que exploram os mais profundos abismos do ser humano, como a terceira história que aborda sobre demência. Setsuko é a protagonista desta história e desde pequena tem poderes sobrenaturais que lhe permitem levantar objetos com a mente, mas à medida que envelhece torna-se cada vez mais incapaz de controlar os seus poderes.

É a demência que gradualmente a faz esquecer seus entes queridos, mas esses poderes extraordinários nos levam a um conto surreal que reflete sobre a existência e a memória.

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Nessas histórias podemos encontrar as situações bem delirantes, desde dentaduras parasitas, super-heróis idosos, ilhas semelhantes a Battle Royale onde se competem por um lugar de residência ou invasões alienígenas. Através da velhice, Kago explora, de forma impressionante e criativa, muitas áreas da vida, enquanto explora novas formas de se expressar com vinhetas, quebrando repetidamente a quarta parede.

A nona história é um exemplo ideal, onde Yukie é contratada para cuidar de um mangaká, a quem acaba ajudando a pintar vários de seus desenhos. A linha entre realidade e ficção é confusa nesta história, conforme Sakai começa a ver como o que acontece nas desenhos acontece na realidade.

O mangá atende as expectativas, recomendo a obra por nos levar a um cenário de fantasia e realidade, surrealismo e comédia, onde também há espaço para profundidade e crítica. Um trabalho que certamente dá pra ler mais de uma vez, pois é o tipo de título que precisa de mais de uma leitura para captar o pano de fundo de sua mensagem.

A edição da Todavia está caprichada, no mesmo formato das edições do selo Tsuru (Devir), com orelhas, capa cartão e papel offset de alta gramatura, uma boa tradução da Flávia Castanheira. Sem dúvida, uma obra que recomendamos que leiam.

Nota: Ótimo – 3.5 de 5 estrelas

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