Gone, obra inédita no Brasil do renomado artista britânico Jock (pseudônimo de Mark Simpson), surge como uma ambiciosa narrativa gráfica de ficção científica distópica, centrada na jornada de Abi, uma jovem de 13 anos aprisionada em uma nave espacial generacional. Apesar do talento inquestionável de Jock como ilustrador — responsável por clássicos como The Losers e Batman: The Black Mirror —, a obra oscila entre momentos de genialidade visual e uma narrativa que, por vezes, tropeça em sua própria ambição.
Arte Expressiva e Atmosfera Cinematográfica
Jock consolida sua reputação como mestre do preto e branco dramático, com traços agressivos e composições que evocam tensão constante. Cada página de Gone é um exercício de estilo: a nave é retratada como um labirinto claustrofóbico, e os painéis transmitem a desesperança de Abi, perseguida como “um rato” pelos dutos de ventilação. A influência de seus trabalhos conceituais para filmes como Dredd e Aniquilação é evidente, conferindo à obra um caráter quase cinematográfico.
No entanto, essa força visual esbarra em problemas narrativos. Jock, que também assume o roteiro, opta por uma abordagem minimalista, evitando exposições didáticas sobre o mundo distópico. Embora isso possa ser um trunfo — criando mistério e exigindo imersão do leitor —, a execução peca em momentos cruciais. Cenas de ação tornam-se confusas, e a caracterização dos personagens secundários é tão difusa que muitos se fundem em uma massa indistinta de figuras ameaçadoras.
Abi: Uma Protagonista em Evolução (Mas Pouco Explorada)
A estrutura elíptica da história — com saltos temporais entre os capítulos — promete mostrar a evolução de Abi de criança a adulta, mas a obra não aprofunda suficientemente sua psicologia. Sua luta pela sobrevivência é visceral, porém previsível, ecoando arquétipos de heroínas distópicas sem acrescentar nuances originais. As referências a clássicos da ficção científica, embora numerosas, parecem mais homenagens do que reinterpretações críticas, como prometido no texto de apresentação.
Conclusão: O Brilho Visual Não Sustenta a Narrativa

Gone é uma obra paradoxal: tecnicamente deslumbrante, mas narrativamente irregular. Jock demonstra por que é um dos artistas mais influentes dos quadrinhos contemporâneos, mas sua estreia como roteirista integral revela limitações. A atmosfera opressiva e o traço expressivo compensam parte das falhas, mas não suficientes para elevar a história além de uma odisseia espacial medianamente envolvente.
NOTA:7,5