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Festival do Rio: "Trash" e o que deixa de dizer entre a esperança e o lixo

O olhar estrangeiro sobre as complexidades sociológicas do Brasil, em especial de uma cidade tão emblemática como o Rio de Janeiro, sempre encontrou no Cinema sua maior pretensão. Orfeu Negro, adaptação da peça teatral de Vinícius de Moraes, dirigido pelo francês Marcel Camus em 1959 era nada mais que um visão idílica da realidade daqui. Trash – A Esperança Vem do Lixo, do diretor britânico Stephen Daldry, remete muito ao tipo de percepção que Camus teve com seu Orfeu. Baseado no best-seller homônimo do também britânico Andy Mulligan, o filme – que no livro não é ambientado em nenhum país específico, apenas sugerido como Terceiro Mundo – acompanha a verdadeira saga de três meninos – Gardo, Raphael e Rato – que vivem no lixão, e se envolvem numa perigosa investigação provinda do fato de um deles ter achado uma carteira. Logo, se descobre que essa carteira tem conexões políticas da cidade, podendo prejudicar muita gente poderosa.

Com roteiro do experiente Richard Curtis, a trama evolui com ininterrupta consistência narrativa (ainda que se permita soluções dramáticas, às vezes bem questionáveis) , aliás, Curtis é conhecido pela habilidade em aglutinar muitos personagens em seus filmes. Com um elenco de impressionar, com Rooney Mara (numa personagem mal aproveitada), Martin Sheen (que parece se divertir no clima tropical), Selton Mello (voltando a atuar) e Wagner Moura (dispensa comentários), Daldry aparenta manter um carinho especial com seus jovens atores, e suas interseções com esse elenco mais experiente. Apesar de, tecnicamente, o filme ter a excelência inglesa de seus realizadores – a fotografia acampa as diferentes tonalidades de luz da cidade de forma quase poética, ainda que bastante influenciada pelo que Fernando Meirelles fez em Cidade de Deus – o diretor deixa sobressair uma fragilidade recorrente em seu cinema: a falta de manejo nas doses de sentimentalismos.

Tirando seu trabalho preciso em As Horas e Billy Elliot, Daldry  sempre se excede na contextualização de suas tramas (só para para analisar: a sacarose lacrimosa de O Leitor ou a banalidade motivacional do irritante Extremamente Alto & Incrivelmente Perto. Em Trash, o incômodo está na insistência de fabular sobre a realidade carioca. Não que ela não possa ser vista como uma fábula social. Talvez até seja para as crianças que gravitam nela, mas soa ingênuo, principalmente quando a história esbarra em temas tão caros e urgentes num âmbito mais universal. Mesmo sendo um filme até interessante, num prisma distanciado, faltou evocar o que existe entre a esperança e o lixo.

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