Personalidades do cinema: A obra de Tim Burton

Personalidades do cinema: A obra de Tim Burton – Ambrosia

Nenhuma surpresa quando, na noite do Oscar, o prêmio de direção de arte foi para Alice No País Das Maravilhas. Filmes de Tim Burton sempre são fortes candidatos na categoria, o que pode ser explicado pelo fato de Burton ter sido desenhista e animador da Disney, fazendo com que tenha critério apurado para selecionar quem vai desenhar o visual de seus delírios fortemente darks.

Tido como uma espécie de garoto problema de Hollywood, pela temática sempre sombria de seus filmes, além de um sarcasmo bem peculiar, o californiano de Burbank Timothy William Burton, nascido em 25 de agosto de 1958, começou sua carreira solo no cinema em 1982 com os curtas Vincent e Frankenwinnie (que virarão longas 3D em breve). Seu primeiro longa foi As Aventuras de Pee Wee de 1985. A chegada ao mainstream veio com Os Fantasmas Se Divertem de 1988. A comédia de humor nigérrimo trazia seu amigo pessoal Michael Keaton como um morto vivo nada convencional chamado Beetlejuice que ensina um casal de recém finados vivido por Alec Baldwin e Gena Davis a assombrar os novos proprietários da casa em que moravam quando vivos. A atração de Burton pelo mundo dos mortos, pelo bizarro e sombrio permeariam a carreira do diretor. O filme teve um resultado satisfatório nas bilheterias americanas, custou 15 milhões de dólares e faturou 73 milhões, mas a consagração comercial do cineasta viria no ano seguinte.

Personalidades do cinema: A obra de Tim Burton – Ambrosia

Em 1988, a Warner Bros, detentora dos direitos da D.C. Comics, encomendou para o aniversário de 50 anos de Batman, um longa metragem ambicioso como fora Superman, O filme de 1978. Para tal, o estúdio convocou Tim Burton para a direção, que se inspirou fortemente na graphic novel Batman O Cavaleiro das Trevas de Frank Miller, até mesmo para recuperar a imagem do personagem no meio audiovisual uma vez que havia virado caricatura na série camp dos anos 60 e essa era a imagem que boa parte do público guardava de Batman live action. Com uma campanha de marketing mastodôntica (que redefiniu a estratégia de divulgação de blockbusters daí por diante) o filme, orçado em 35 milhões de dólares faturou mais de 250 milhões só nos E.U.A, porém as opiniões se dividiram. Boa parte dos fãs do homem morcego consideraram equivocada a escolha do beetlejuice Michael Keaton para o papel principal, por ser baixinho, pouco charmoso e um tanto velho. O roteiro frouxo, com personagens mal desenvolvidos, como a deslumbrante e inconsistente Vicky Vale (Kim Bassinger no auge da beleza), também desagradou pela falta de ritmo e as cenas de ação em sua maioria nada eletrizantes. Porém a direção de arte primorosa e a atuação visceral de Jack Nicholson salvaram o show, além das piadas de humor negro característicos de Burton que pontuavam o script.

O filme seguinte do diretor foi Edward Mãos de Tesoura de 1990. Estrelado por Johnny Depp, com quem criaria uma duradoura e profícua parceria, e Winona Rider, o filme contava a história de Edward, que fora criado por um cientista que morreu antes de lhe dar mãos, colocando em seu lugar, tesouras. Era uma versão dark, melancólica e moderna de Frankenstein. Edward vai parar em um típico subúrbio norte americano, é adotado por uma família de classe média, cuja filha (Winona Rider) lhe desperta interesse. Visto pela vizinhança como um ser estranho porém bondoso e prestativo, por usar suas mãos de tesoura para atividades na vizinhança como jardinagem e corte de cabelos, o personagem passa em seguida a ser visto como ameaça, é nessa altura que Burton desenvolve uma crítica à mentalidade medíocre da classe média americana e sua rejeição a tudo que difere de sua vidinha suburbana. Na direção de arte não se tem idéia da época em que o filme se passa, por horas parece situado na década de 50 e é essa a intenção de Burton, mostrar que a classe média americana é completamente parada no tempo.

1992 foi mais uma vez o ano do morcego. Cercado de grande expectativa, a continuação de Batman, Batman O Retorno foi o grande sucesso do verão daquele ano. Com Michelle Pfeifer no papel de Mulher Gato e Danny DeVitto como Pinguin, o filme era ainda mais sombrio do que o antecessor, mas tinha um roteiro ainda mais desconexo e decepcionou boa parte do público. O filme trazia várias referências ao movimento expressionista alemão, seja no visual Dr. Caligari de Pinguin, e no personagem de Christopher Walken batizado como Max Shreck  (homônimo do ator de Nosferatu), além da direção de arte e do jogo de sombras mais acentuado do que no filme anteiror. No final daquele ano foi lançado O Estranho Mundo De Jack, animação stop motion produzida por Tim Burton e dirigida por Henry Selick (James and the Giant Peache e Coraline e o Mundo Secreto) que por ter a cara de Burton, até hoje muita gente acha que a direção era dele.

Personalidades do cinema: A obra de Tim Burton – Ambrosia

Ed Wood de 1994 foi a obra prima de Tim Burton. Considerado até o hoje o melhor filme do cineasta, narrava a história do pior diretor de todos os tempos e suas esquisitices (como gostar de se vestir de mulher, por exemplo) com atuações memoráveis de Johnny Depp no papel título e Martin Landau como ex Drácula Bela Lugosi. Ed Wood é também o único filme de Tim Burton sem a trilha sonora de Danny Elfman, neste filme a trilha ficou a cargo de Howard Shore (A Cela e a trilogia Senhor dos Anéis). Usando o cineasta que mesmo desprovido de talento insistia em fazer cinema por amor à sétima arte, Tim Burton fazia sua declaração de amor ao cinema, principalmente aquele feito pelos bizarros, loucos e excluídos, categoria em que ele se achava inserido, apesar de bem sucedido na indústria cinematográfica. A atuação comovente de Martin Landau na pele de Bela Lugosi no fim da vida decadente e viciado em morfina lhe rendeu um Oscar de melhor ator coadjuvante em 1995. Há de se ressaltar também a bela fotografia em preto e branco como os exemplares de Ed Wood.

Marte Ataca, filme seguinte inspirado em uma série de figurinhas dos anos 50, trazia uma invasão alienígena cheia de sarcasmo e humor negro, em uma antítese ao patriotismo épico de Independence Day lançado cinco meses antes. Apesar de um elenco estelar que contava com Jack Nicholson (impagável em dois papéis), Pierce Brosnan, Glen Close, Annette Benning, Danny DeVitto, Sarah Jessica Parker, uma Natalie Portman adolescente, Michael J. Fox e Priscila Presley, Marte Ataca fracassou nas bilheterias. Tim Burton se reencontraria com o sucesso três anos depois com A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça, lançado em 1999. Baseado no conto Sleepy Hollow, trazia Johnny Depp no papel de Ichabod Craine, o anti herói medroso e hesitante acompanhado de Katrina (Christina Ricci roubando a cena).

O primeiro projeto de Burton no século XXI era tão ambicioso como o de vinte anos antes. Tratava-se de uma releitura do clássico Planeta dos Macacos adaptação do livro do francês Pierre Boulle  que ficou imortalizado por Franklin J Schaffner em 1968 e tinha Charlton Heston como protagonista. Mark Wahlberg assumiu o papel que fora de Heston, Helena Boham Carter que viria a se tornar senhora Burton interpretava uma chimpanzé ativista dos direitos dos humanos e Tim Hoth um cruel símio numa inspirada atuação. A despeito do orçamento inflado de 100 milhões de dólares e da maciça campanha de marketing o filme teve um desempenho abaixo do esperado nas bilheterias, mas não chegou a fracassar. Na verdade tratava-se de um filme nada autoral e os fãs de Tim Burton se incomodaram em ver o cineasta atuando como mero diretor de aluguel. Para compensar, o filme seguinte seria, por assim dizer, seu 8 e 1/5.

Se apoderando de Peixe Grande E Suas Histórias Maravilhosas, baseado na obra de Daniel Wallace, Tim Burton fez uma contestação a todos aqueles que criticam suas histórias absurdas através do contador de causos Edward Bloom (vivido na maturidade por Albert Finney e na juventude por um carismático Ewan McGregor), cujo filho não acha a menor graça em suas histórias fantásticas contadas sem o menor pudor para todos, sem levar em consideração seu absurdo. Burton perdera seu pai pouco antes de começar a filmar e por ter tido uma relação complicada durante a vida, a relação pai e filho dos personagens ganhou um toque pessoal. Um emaranhado de personagens bizarros, direção de arte primorosa trilha de Danny Elfman e ainda referências à obra de Fellini. Os fãs do cineasta agora não tinham do que reclamar.

2005 seria um ano bastante profícuo para Tim Burton. No verão lançou sua versão de A Fantástica Fabrica de Chocolates de Roald Dahl, cuja versão de 1971 ficara imortalizada nos corações e mentes durante anos de reprises na sessão da tarde ganhando status Cult. Mas Burton deu cara nova à versão, adaptando-a a seu estilo e o público aprovou, foram 206 milhões de dólares somente nos E.U.A. dois meses depois foi a vez do elogiadissimo A Noiva Cadáver, animação stop motion com auxilio da computação gráfica com vozes de Johnny Depp e Helena Bonham Carter, seus atores favoritos em uma trama sobre um noivo que se casa inadvertidamente na presença de uma falecida que vem do túmulo exigindo que ele seja seu esposo. Assim como Depp e Carter, outro ator de A Fantástica Fábrica de Chocolate que voltou como dublador foi Christopher Lee. Assim como em Beetlejuice, o mundo dos mortos é mostrado por Burton com cores e suingue, enquanto o dos vivos é cinzento e sem graça.

Personalidades do cinema: A obra de Tim Burton – Ambrosia

Em 2007 o cineasta realizou uma adaptação do musical macabro da Broadway, Sweeney Todd, O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet,  com Johnny Depp se consolidando de vez como ator fetiche. Seu último filme foi Alice no País das Maravilhas, filme 3D que foi a segunda maior bilheteria de 2010. Tratava-se de uma continuação da saga de Alice de Lewis Carrol. Apesar do sucesso comercial, os fãs se decepcionaram com o colorido e pouco consistente ângulo encontrado por Burton, esperava-se algo sombrio (como a obra literária), uma personagem mais complexa e um roteiro menos infantil. Os próximos projetos de Tim Burton são Frankenweenie 3D e Dark Shadows, que já está em pré-produção, ambos para 2012. Tim Burton é indubitavelmente um dos nomes mais relevantes e autorais de Hollywood. Por mais que o acusem de se repetir e trabalhar sempre com o mesmo elenco, é um cineasta de estilo próprio e inconfundível, que nunca toca um projeto pensando no sucesso poderá vir a obter, e sim se o projeto em questão pode assumir uma face e personalidade compatível com a dele.

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Comentários 4
  1. Cesar, eu adorei! Tim Burton é simplesmente sensacional e único, como você mesmo disse. Só acho que você poderia ter colocado mais fotos, muitas fotos! (risos). De qualquer forma, um texto que reúne as obras de arte de Burton é realmente tudo o que eu queria! Parabéns.

    1. Pois é, Fora, eu também queria colocar mais fotos, rsrs, mas é um website, tem que ser clean. Mas se fosse revista impressa eu ia entupir de imagem, hahaha.

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