Cruel e honesto, “O Jogo do Exterminador” é muito mais profundo do que parece

É um tanto complicado retratar crianças fielmente em livros sem que elas fiquem bobas demais ou adultas demais. Poucos autores conseguiriam atingir essa medida como os excelentes Mark Zusak (“A Menina Que Roubava Livros”) e John Boyne (“O Menino do Pijama Listrado”) que são bons exemplos de crianças sendo crianças. Há sempre aqueles que conseguem levar para um outro patamar, aprofundando-se mais ainda neste ser complexo que é a criança, como fez Orson Scott Card em “O Jogo do Exterminador” (Ender’s Game) onde o protagonista tem apenas seis anos de idade, mas não se deixe levar por isso. É um mundo muito mais intrincado do que aparenta.

endersNum futuro tecnológico, a Terra já passou por duas guerras diferentes e quase pereceu. Uma raça alienígena se mostrou uma grande ameaça e com muito esforço e a sagacidade de Mazer Rackham, consegue derrotar as frotas inimigas e se consagrar herói. Temendo que os aliens voltem a atacar, a Frota Internacional é criada e com ela algumas regras que os humanos devem seguir, como exemplo só poderem ter dois filhos. Acontece que os Wiggin tem três crianças, Peter, Valentine e Andrew, graças a uma permissão especial do governo pois seus dois primeiros filhos são gênios, mas não exatamente o que eles estavam procurando. Talvez Andrew ou Ender, seja a resposta da qual eles precisam. Mas ele é um “terceiro”, uma raridade nos dias de hoje e por conta disso vive sofrendo nas mãos das crianças da escola e não tem sossego nem em casa, pois seu irmão é seu pior algoz. Peter tortura-o sempre que pode, longe dos olhos dos pais e ele só pode contar com Valentine para defende-lo.
Aos seis anos de idade Ender tem seu monitor removido pois o governo acha que ele já está pronto para ir para a Escola de Guerra se preparar para a Terceira Invasão. O Coronel Graff, Diretor da Escola, vai em pessoa até a casa de Ender busca-lo e lhe explica que ele é uma peça fundamental para a salvação do planeta. Seus pais são contra mas não há o que fazer. Graff leva Ender e lhe explica que daqui para frente ele está por conta própria; deve saber se impor e aprender a conviver com seus colegas. Ao entrar na nave que vai levá-lo até a escola que fica fora da órbita terrestre, Ender se depara com inúmeras outras crianças, mas ele sem dúvidas é o mais novo. A maioria tem dificuldade em sentar na cadeira e colocar o cinto por conta da gravidade na nave, mas ele rapidamente entende o que deve ser feito para espanto de todos. O Coronel Graff volta e enaltece Ender na frente de todos os outros meninos deixando-o em maus lençóis e com um péssimo começo pela frente. Logo, ele passa a ser o alvo principal das outras crianças e percebe que enquanto se destacar isso nunca terá um fim e que não há nada que ele possa fazer a não ser enfrentar o problema. O que ele não sabe é que tudo isso não passa de planos e estratégias dos comandantes da escola para ver se ele está apto a ocupar o cargo de comandante. Ender precisará enfrentar todos os desafios que lhe impuserem se quiser sobreviver a essa Escola e tentar entender como o mundo dos adultos funciona.
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Quando foi publicado lá na década de 80 causou uma enorme polêmica. Nunca antes crianças haviam sido retratadas desta maneira. A polêmica possivelmente foi gerada pelo fato dos adultos esquecerem o quão cruéis e mesquinhas crianças podem ser quando longe de seus olhos. O autor, Card rabiscou esta história desde a época em que estava na faculdade e aos poucos foi aprimorando, retirando e acrescentando elementos. O resultado é um universo extremamente complexo e real. Por mais que se passe no futuro a realidade em relação aos comportamento são palpáveis, críveis. Nos vemos submersos neste mundo, onde crianças são tiradas de seus pais e obrigadas a crescerem bem depressa e enfrentarem problemas típicos de adultos, alguns até que nem eles conseguem lidar. Tudo isso porque a mente de uma criança é completamente moldável, com uma visão única de situações que nos fogem no dia a dia.
Ao estudarem os anseios de Ender, eles passam a manipular toda e qualquer situação a sua volta, obrigando-o a tomar as decisões mais radicais e difíceis para se proteger. E o melhor, por mais manipulado que as crianças sejam, não há mentiras, nem meias verdades. Eles não tem tempo para serem crianças, então, não há porque trata-los como sendo uma. Dessa forma, você até esquece a idade deles em alguns momentos e se pega pensando se conseguiria fazer aquilo.
actors-info.com

“O Jogo do Exterminador” é apenas o primeiro de uma série de livros chamados de Enderverso e terá uma adaptação para os cinemas com Asa Butterfield, Harrison Ford, Ben Kingsley e Hailee Steinfeld que estréia nos EUA em 1º de Novembro e aqui em 20 de Dezembro de acordo com o IMDB.

A versão brasileira do livro foi lançada pela Editora Devir em 2006 e é bem difícil de encontrar. Para aqueles que dominam o inglês há novos exemplares disponíveis nas principais livrarias. A Editora Intrínseca lança na segunda metade de Novembro, um livro chamado “O Mundo do Exterminador” que irá analisar a obra. Certamente, vale a leitura de ambos.

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Comentários 2
  1. Melissa: Deixa eu complementar algumas informações sobre o livro no Brasil. O conto original foi publicado no início dos anos 90 (1991, eu acho) na Isaac Asimov Magazine, publicado pela Editora Record. Logo depois, o livro foi publicado pela editora Aleph. Sua continuação, o Orador dos Mortos, foi publicado logo depois. Infelizmente, as continuações nunca foram traduzidas. Somente depois que a Devir adquiriu os livros, é que foi publicado o terceiro da série, Xenocídio. Resta saber se os demais livros da série serão publicados.

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