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Duas peças curtas de Matéi Visniec no espetáculo Os bolsos cheios de pão

Em 30 de março, estreou, no Teatro de Arena do Sesc Copacabana, o espetáculo Os bolsos cheios de pão. Dirigido por Fernando Philbert, compõe-se de duas peças curtas do dramaturgo Matéi Visniec: Os bolsos cheios de pão e O último Godot. Esta última abre o espetáculo e temos finalmente o personagem Godot aparecendo em cena. Não apenas isso, mas também conhecendo seu criador, Samuel Beckett, tendo a chance de fazer comentários sobre o texto, podendo reivindicar coisas. Na outra peça, dois senhores dialogam e se indagam sobre um cachorro que teria sido atirado a um poço. Os personagens são estrelados por Louise Cardoso e Luiz Octavio Moraes.

Duas peças curtas de Matéi Visniec no espetáculo Os bolsos cheios de pão

Em O último Godot, que tem início com os dois personagens ainda desconhecidos, sendo expulsos de um lugar que logo saberemos que é o teatro, há um estranhamento: eram apenas eles que assistiam às encenações, o teatro vazio, segundo relatam um ao outro, e eram apenas eles que estavam lá todos os dias. No entanto, o teatro está fechando. A ocasião dá chance a que Godot se queixe de não aparecer em nenhum momento da obra. Ele então insiste, com o texto e um lápis na mão, para que seja encaixado em alguma cena, qualquer cena, por mais breve que seja. Beckett, por sua vez, se espanta ao conhecer o próprio personagem que criou e que desconhece. Não saberá explicar as motivações de sua criação dramatúrgica. Ao redor deles, somos levados a imaginar um contexto estranho, de ruas vazias, de isolamento. Ou, em alguns momentos, de estranhos observadores. Também somos levados a imaginar a lixeira do teatro, e tudo o que se pode encontrar ali e que não tem mais lugar. As metáforas do fim da dramaturgia, o debate sobre a autoria, o lugar a que são relegadas a arte e a cultura, tudo isso permeia esse primeiro momento do espetáculo. Assistindo a essa peça curta, além do desconforto de pensar o quão familiar foi, recentemente, uma espécie de longa e indeterminada pausa do teatro (se pensarmos no contexto pandêmico) e o quanto nos assombra o desvalor da cultura em governos neoliberais/fascistas, há outro incômodo que permeia esse encontro absurdo: trata-se de uma pergunta que não é enunciada e que me atravessou – onde seria encenada essa peça adaptada, com edição do autor e colaboração do personagem, se o teatro fechou? Ou, sua tradução: qual o sentido do esforço de Godot? Que diferença faz, se não há mais teatro?

Duas peças curtas de Matéi Visniec no espetáculo Os bolsos cheios de pão

Os bolsos cheios de pão, por sua vez, traz outro incômodo: no infinito debate entre os dois personagens sobre a causa da atual situação de um cachorro no fundo de um poço, sobre ele estar vivo ou morto, sobre a possibilidade de animais se matarem e o que é ou não característico do humano, sobre o desinteresse da humanidade em relação ao que não redunda em “bufunfa e mais-valia”, vemos os argumentos e contra-argumentos rodarem em torno de si, mudarem de direção, irem e voltarem, suscitando outra indagação – serão, em grande medida, muitas das conversas todas assim? Reformulando: caso estivéssemos olhando de fora nossos próprios debates, pareceriam absurdos a nós mesmos? Ainda que os personagens estivessem ali pensando em maneiras de salvar o cachorro e arriscando hipóteses, em vários momentos a palavra que me vem à mente para definir esse debate é mesmo estrangeira, e peço desculpas por isso: pointless. Quantas discussões pointless sustentamos em nossas vidas e só o enxergamos depois? Ao final dessa segunda peça curta, vamos compreendendo melhor a própria situação em que se encontram esses dois personagens.

Duas peças curtas de Matéi Visniec no espetáculo Os bolsos cheios de pão

A cena final é belíssima, com sua poética e simplicidade, porque ali, naquele encontro ritmado enfim, não resta dúvida sobre o sentido dos encontros e dos empenhos, esse sentido que não precisa de complemento. Trata-se, por fim, de um delicado espetáculo, que dá chance a certa amplitude de construções de significado e em que temos a oportunidade de entrar em contato mais uma vez com a obra dramatúrgica de Visniec, pela tradução de Roberto Mallet, nessa encenação cuja cena final garante certo alívio e alinhava a beleza que permeia a montagem.

Ficha técnica

Direção: Fernando Philbert

Autor: Matéi Visniec

Tradução: Roberto Mallet/É Realizações Editora

Elenco: Louise Cardoso e Luiz Octavio Moraes

Cenografia: Natália Lana

Figurinista: Mel Akerman

Iluminação: Vilmar Olos

Direção Musical e Música Original: Marcelo Alonso Neves

Movimento: Toni Rodrigues

Visagismo: Rose Verçosa

Identidade Visual e Projeto Gráfico: Ludmila Valente – Brain Storm Design

Assessoria de Imprensa: Ney Motta

Fotografia: Cristina Granato

Redes Sociais: Orla Comunicação Integrada

Assistente de Direção: Ana Victoria Almeida

Produção: Cristina Leite e Gledson Teixeira

Realização do Espetáculo: Louise Cardoso Produções Artísticas

Serviço

Sesc Copacabana – Arena

Rua Domingos Ferreira, 160, Copacabana, Rio de Janeiro.

Informações: 21 2547-0156

Temporada: 30 de março a 23 de abril de 2023, quinta a domingo, às 20h

Valor do ingresso: R$ 30,00 (inteira) R$ 15,00 (meia entrada para casos previstos por lei, estendida a professores e classe artística mediante apresentação de registro profissional) R$ 7,50 (credencial plena SESC) Gratuito (público PCG)

Funcionamento da bilheteria: Terça a sábado – 09hs às 20hs e Domingos 13hs às 20hs

Duração: 70 minutos

Classificação: 12 anos Realização SESC

Em 30 de março, estreou, no Teatro de Arena do Sesc Copacabana, o espetáculo Os bolsos cheios de pão. Dirigido por Fernando Philbert, compõe-se de duas peças curtas do dramaturgo Matéi Visniec: Os bolsos cheios de pão e O último Godot. Esta última abre o espetáculo e temos finalmente o personagem Godot aparecendo em cena. Não apenas isso, mas também conhecendo seu criador, Samuel Beckett, tendo a chance de fazer comentários sobre o texto, podendo reivindicar coisas. Na outra peça, dois senhores dialogam e se indagam sobre um cachorro que teria sido atirado a um poço. Os personagens são estrelados por Louise Cardoso e Luiz Octavio Moraes.

Em O último Godot, que tem início com os dois personagens, ainda desconhecidos, sendo expulsos de um lugar que logo saberemos que é o teatro, há um estranhamento: eram apenas eles que assistiam às encenações, o teatro vazio, segundo relatam um ao outro, e eram apenas eles que estavam lá todos os dias. No entanto, o teatro está fechando. A ocasião dá chance a que Godot se queixe de não aparecer em nenhum momento da obra. Ele então insiste, com o texto e um lápis na mão, para que seja encaixado em alguma cena, qualquer cena, por mais breve que seja. Beckett, por sua vez, se espanta ao conhecer o próprio personagem que criou e que desconhece. Não saberá explicar as motivações de sua criação dramatúrgica. Ao redor deles, somos levados a imaginar um contexto estranho, de ruas vazias, de isolamento. Ou, em alguns momentos, de estranhos observadores. Também somos levados a imaginar a lixeira do teatro, e tudo o que se pode encontrar ali e que não tem mais lugar. As metáforas do fim da dramaturgia, o debate sobre a autoria, o lugar a que são relegadas a arte e a cultura, tudo isso permeia esse primeiro momento do espetáculo. Assistindo a essa peça curta, além do desconforto de pensar o quão familiar foi, recentemente, uma espécie de longa e indeterminada pausa do teatro (se pensarmos no contexto pandêmico) e o quanto nos assombra o desvalor da cultura em governos neoliberais/fascistas, há outro incômodo que permeia esse encontro absurdo: trata-se de uma pergunta que não é enunciada e que me atravessou – onde seria encenada essa peça adaptada, com edição do autor e colaboração do personagem, se o teatro fechou? Ou, sua tradução: qual o sentido do esforço de Godot? Que diferença faz, se não há mais teatro?

         Os bolsos cheios de pão, por sua vez, traz outro incômodo: no infinito debate entre os dois personagens sobre a causa da atual situação de um cachorro no fundo de um poço, sobre ele estar vivo ou morto, sobre a possibilidade de animais se matarem e o que é ou não característico do humano, sobre o desinteresse da humanidade em relação ao que não redunda em “bufunfa e mais-valia”, vemos os argumentos e contra-argumentos rodarem em torno de si, mudarem de direção, irem e voltarem, suscitando outra indagação – serão, em grande medida, muitas das conversas todas assim? Reformulando: caso estivéssemos olhando de fora nossos próprios debates, pareceriam absurdos a nós mesmos? Ainda que os personagens estivessem ali pensando em maneiras de salvar o cachorro e arriscando hipóteses, em vários momentos a palavra que me vem à mente para definir esse debate é mesmo estrangeira: pointless. Quantas discussões pointless sustentamos em nossas vidas e só o enxergamos depois? Ao final dessa segunda peça curta, vamos compreendendo melhor a própria situação em que se encontram esses dois personagens.

A cena final é belíssima, com sua poética e sua simplicidade, porque ali, naquele encontro ritmado enfim, não resta dúvida sobre o sentido dos encontros e dos empenhos, esse sentido que não precisa de complemento. Trata-se, por fim, de um delicado espetáculo, que dá chance a certa amplitude de construções de significado e em que temos a oportunidade de entrar em contato mais uma vez com a obra dramatúrgica de Visniec, pela tradução de Roberto Mallet, nessa encenação cuja cena final garante certo alívio e alinhava a beleza que permeia a montagem.

Ficha técnica

Direção: Fernando Philbert

Autor: Matéi Visniec

Tradução: Roberto Mallet/É Realizações Editora

Elenco: Louise Cardoso e Luiz Octavio Moraes

Cenografia: Natália Lana

Figurinista: Mel Akerman

Iluminação: Vilmar Olos

Direção Musical e Música Original: Marcelo Alonso Neves

Movimento: Toni Rodrigues

Visagismo: Rose Verçosa

Identidade Visual e Projeto Gráfico: Ludmila Valente – Brain Storm Design

Assessoria de Imprensa: Ney Motta

Fotografia: Cristina Granato

Redes Sociais: Orla Comunicação Integrada

Assistente de Direção: Ana Victoria Almeida

Produção: Cristina Leite e Gledson Teixeira

Realização do Espetáculo: Louise Cardoso Produções Artísticas

Serviço

Sesc Copacabana – Arena

Rua Domingos Ferreira, 160, Copacabana, Rio de Janeiro.

Informações: 21 2547-0156

Temporada: 30 de março a 23 de abril de 2023, quinta a domingo, às 20h

Valor do ingresso: R$ 30,00 (inteira) R$ 15,00 (meia entrada para casos previstos por lei, estendida a professores e classe artística mediante apresentação de registro profissional) R$ 7,50 (credencial plena SESC) Gratuito (público PCG)

Funcionamento da bilheteria: Terça a sábado – 09hs às 20hs e Domingos 13hs às 20hs

Duração: 70 minutos

Classificação: 12 anos Realização SESC

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