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Como Star Wars conquistou o universo

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25 de maio de 1977, como qualquer data histórica, tinha tudo para ser um dia qualquer. Pelo menos para o cinema, sobretudo de ficção, aquele fim de semana de feriadão do Memorial Day nos EUA foi um marco. Era a estreia de Star Wars, que aqui para nós durante muito tempo foi Guerra Nas Estrelas – até a determinação de que os mercados seriam unificados pelo nome original em inglês. Depois daquele verão o mundo do entretenimento não seria mais o mesmo.

Se tivéssemos uma máquina do tempo como o DeLorean do ‘De Volta Para O Futuro’ (outra grande marca do cinema de fantasia), votássemos para 1976 e disséssemos para os executivos da Fox o que aquele projeto visto como um filme “B” se tornaria, nem o mais otimista acreditaria. A falta de fé era tanta que o estúdio planejava até vender o filme para uma distribuidora alemã de produções trash. Depois de ouvir vários nãos de outros estúdios, George Lucas, diretor e roteirista de Star Wars, se dirigiu à Fox, que não estava exatamente em seu auge, e ofereceu o script.

Foi recusado também, contudo um dos executivos convenceu os demais a dar uma chance e resolveu apostar no projeto. Algo que só poderia acontecer mesmo nos anos 70, já que hoje esse tipo de risco jamais pode ser corrido em um grande estúdio.

O orçamento era modesto em se tratando de uma produção hollywoodiana, mesmo para a época. Foram 9 milhões de dólares, quando uma superprodução custava, em média, algo em torno de 15 a 20 milhões. Os cálculos mais otimistas, inclusive do próprio Lucas eram de que a bilheteria ficaria em torno de 20 a 30 milhões de dólares arrecadados no mercado doméstico (o mercado internacional ainda não tinha o peso que tem hoje).

Enganaram-se redondamente. O filme fez inacreditáveis 380 milhões nos EUA e se tornou a maior bilheteria de todos os tempos até então. Porém, se não fosse um acidente automobilístico, talvez o fenômeno não tivesse existido.

Lucas era louco por automóveis na juventude e ele transpõe isso para a tela no filme Loucuras de Verão, o antecessor de Star Wars. Mas um sério acidente de carro o fez ficar meses na cama de um hospital e isso aposentou seu sonho de ser piloto de corrida. Pod Racers e Speeder Bikes não foram inventados à toa, foram sem dúvida uma forma de compensar a frustração. Durante a longa recuperação, Lucas passou a devorar mitologia e publicações relacionadas à criação de mitos no mundo ocidental.

Uma leitura que o cooptou em especial foi o trabalho de Joseph Campbell “O Herói de Mil Faces”. O jovem resolveu então estudar cinema e tinha em mente um dia filmar uma saga grandiosa que teria a aventura das cinesséries dos anos 40 e 50 e a argamassa mitológica apreendida em suas leituras.

Adicionando-se a isso, elementos de Western – a casa dos tios do Luke em chamas com os corpos carbonizados remete a ‘Rastros de Ódio’ de John Ford e a cena em que Han Solo atira PRIMEIRO em Greedo na cantina de Mos Eisley é referência clara aos westerns spagetti de Sergio Leone – filmes de capa e espada, filmes de samurai de Akira Kurosawa (‘A Fortaleza Escondida’ é uma forte influência no roteiro de Star Wars) tudo isso envolto em um delicioso revestimento de space opera à la Flash Gordon e Buck Rogers, mas com efeitos especiais da categoria de ‘2001: Uma Odisseia no Espaço’ de Stanley Kubrick, o filme que despertou Lucas para a possibilidade de filmar sua saga espacial sem que tudo parecesse tosco demais.

Para conceber os efeitos especiais que deixaram todos estupefatos foi criada uma companhia especialmente para isso, a Industrial Light & Magic, que tinha à frente Denis Muren. Segundo ele, a preocupação não foi a evolução tecnológica em si, mas o aperfeiçoamento da dinâmica de movimento. Em primeiro lugar, a equipe de Muren buscou refinar o processo de fotografia em blue screen.

Trata-se de uma técnica em que atores, naves em miniatura e qualquer outro objeto sejam filmados à frente de um grande fundo azul, que depois é substituído por outras imagens, que podem ser cenários estáticos, paisagens reais ou um conjunto de elementos em movimento previamente registrado em película. Com a sobreposição de pessoas e objetos a esse fundo em separado, criando assim, a ilusão de que ambos convivem na mesma cena.

A grande inovação mesmo foi o “motion control” criado com as câmeras com rotação pré-programada, algumas instaladas nas miniaturas e outras à distância. A combinação minuciosa do movimento das naves com o das câmeras é que faz com que os objetos se movessem com uma fluidez e credibilidade jamais vistas antes no cinema. Foi essa a técnica responsável pela abertura com o gigantesco destroyer ganhando a tela. O resultado foi o cinema das sensações, inaugurado com ‘Tubarão’ de Steven Spielberg, elevado à enésima potência.

Ao contrário do que muitos pensam, quando chegou às telas, Star Wars não era assim tão desconhecido. O filme a princípio seria lançado em dezembro de 1976, o que não ocorreu devido a atrasos no cronograma da produção. Porém a novelização já estava pronta e foi para as bancas mesmo sem ter o filme nas telas. Também foi lançada pela Marvel, uma série em quadrinhos baseada no roteiro do filme. Muitos dos que faziam a enorme fila em frente ao Chinese Theater em Los Angeles já conheciam o livro ou a HQ. Eram os fãs de primeira hora que ansiavam por ver tudo aquilo em movimento na telona.

O lançamento se deu em apenas 32 cinemas, porém, as filas não arrefeciam, o boca a boca só aumentava o sucesso do filme, que obrigou algumas salas a funcionarem 24 horas. Até que não houve alternativa a não ser ampliar o circuito. Star Wars também inovou implementando o merchandising, até então dominado exclusivamente pela Disney – hoje dona da franquia.

Isso se deu pelo seguinte acordo: a Fox seria a detentora do filme e Lucas o detentor dos direitos sobre produtos licenciados. A principio parecia desvantajoso para o diretor, mas o sucesso do filme alavancou o sucesso das vendas de produtos, mostrando que a experiência do cinema podia sim ser prolongada e o resto é História.

Star Wars funcionou por trazer de volta ao cinema americano, que naquela década de 70 refletia o niilismo da ressaca de Watergates, Vietnã e crise do petróleo, o escapismo assumido de um feel good movie. Era o filme certo, na hora certa, promovido de forma magistral. Era a velha história do bem contra o mal, construída em cima arquétipos e com um conceito fabular.

Estão ali elementos clássicos como o vilão de negro, o jovem valoroso, o anti-herói, a princesa a ser salva , o velho sábio, mas com uma nova roupagem traduzindo a estrutura ancestral de aventura, da jornada do herói dos tempos da Ilíada de Homero, para aquela geração do quase final de século XX, do alvorecer da era da informática.

Essa mistura de qualidade da obra, inovação em seu conceito, ao mesmo tempo fiel à tradição narrativa dos contos de fada –o que o fez tão universal – e a forma eficaz de promoção resultou em um dos maiores fenômeno de mídia da cultura moderna

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