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Crítica: “Tomorrowland” e o admirável nostálgico mundo novo

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Adaptar uma atração de parque temático para o cinema é como tirar leite de pedra. Uma tarefa até mais ingrata do que transformar um jogo de videogame em filme. Imagine que em uma atração temática você tem alguns minutos de emoções programadas, muita adrenalina, uma sensação real e interativa, daí você tem de transpor isso para um espectador passivo durante duas horas. Há, é claro, o caso de Piratas do Caribe que foi muito bem sucedido financeiramente, tanto que uma quinta parte já está a caminho. Já “Mansão Assombrada”, estrelado por Eddie Murphy já com a popularidade em declínio, foi muito mal. Talvez o trunfo de “Piratas” seja o fato de ter usado apenas o nome da atração e a temática. Agora é a vez de Tomorrowland ser tranformada em filme.

A atração foi criada pelo próprio Walt Disney como uma área da Disneyland, na Califórnia em 1955. Na época, os americanos, no auge do triunfo do american way of life, imaginavam um futuro otimista e eivado de progressos. Ao longo dos anos, especialmente nos anos 1970, a visão das pessoas sobre o futuro começou a ficar sombria como uma espécie de reflexo da guerra do Vietnã, da recessão econômica desencadeada pela crise do petróleo em 1973, do caso Watergate, que mostrou para os americanos que seus políticos podem ser corruptos e da escalada da violência nas grandes cidades do país.

Foi imbuído do espírito daquela visão de futuro utópico da época que se concluiu o roteiro de “Tomorrowland – Um Lugar Onde Nada é Impossível”(“Tomorrowland”, EUA/2015) uma deliciosa aventura escapista dirigida por Brad Bird (de “Gigante de Ferro” e “Os Incríveis”). Na trama, Casey (Britt Robertson), uma adolescente otimista e vibrante com curiosidade científica, encontra um pequeno broche que abre uma passagem para uma dimensão paralela futurista. Em busca de explicações, ela chega, através da misteriosa garota Athena (Raffey Cassidy), até Frank (George Clooney), que esteve naquela realidade paralela quando garoto e hoje é um gênio desiludido. Eles então embarcam em uma missão para desvendar os segredos desse local enigmático em algum lugar no tempo e no espaço conhecido como Tomorrowland. O que eles devem fazer lá muda o mundo – e a eles próprios – para sempre, mas em seu caminho está o governador Nix (Hugh Laurie)

Bird, que também assume o roteiro, e o co roteirista Damon Lindelof (cocriador da série “Lost”), criaram a partir do argumento concebido pela dupla juntamente com Jeff Jensen, uma eficiente fantasia, recriando aquele futuro utópico imaginado há 50 anos, com carros e trens flutuantes, prédios altíssimos e tecnologia de ponta a serviço da sociedade. E já que o filme é baseado em uma atração de parque da Disney, seus realizadores se propuseram a reproduzir nas cenas a adrenalina de um autêntico brinquedo do parque, no melhor estilo de cinema das sensações, por isso já pode se dizer que esse é, disparado, o melhor filme baseado em atração de parque temático já feito até agora.

Esse clima de Disneyland toma conta logo no início do filme, quando Frank ainda garoto chega à Feira Mundial de 1964, magistralmente reconstituída. A Walt Disney Co. criou três atrações para aquela feira, porém a mais lembrada é ‘It’s A Small World’, que impressionava na época pelo seu uso de personagens robôs animatronics, e é nela que Frank começa sua jornada. A curiosidade é que ao recriar a Feira Mundial de 1964 para o filme, os cineastas tiveram a sorte de descobrir que uma das peças mais icônicas, a Unisfera, estava, na verdade, em Flushing Meadows, Nova York, do lado de fora do USTA National Tennis Center. As fontes do enorme globo ainda estão no lugar, assim como os jardins. Os cineastas enviaram um fotógrafo para Nova York para tirar fotos, de modo que pudessem usar as imagens reais como um elemento de composição nas cenas. Outro cenário interessante é a loja de memorabílias Blast From the Past, para onde Casey se dirige. Lá vemos um R2-D2 de Star Wars, o andróide de Planeta Proibido, o robô de Perdidos no Espaço, além de bonecos de filmes dirigidos por Bird, há um Gigante de Ferro na prateleira ao fundo, e um Senhor Incrível que cai no chão.

A visão otimista que permeia o filme, em contraste com a onda de futuro distópico que se instaurou no cinema desde os anos 80 é abertamente defendida por Bird. O diretor chegou a comentar: “Sempre que há uma tela em branco, há duas maneiras de vê-la; uma é o vazio e outra é a grande abertura a possibilidades. E é assim que eu gosto de ver o futuro — como uma grande possibilidade. É uma visão que se perdeu em termos de ver o futuro”.

Por fim, “Tomorrowland” é uma sessão da tarde de matizes nostálgicas no tom exato da aventura e feliz tanto nas cenas de ação quanto no conceito visual, confirmando o toque de Midas de Brad Bird, que dificilmente erra a mão em seus projetos. Sabendo do poder que a sala escura tem de nos fazer sonhar, ele nos entrega uma das pipocas mais saborosas do ano.

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