Chabadabadá: focos diversos numa série irregular

Uma confissão: sou avessa a maratonar séries. Talvez por ser uma millennial que cresceu acompanhando as séries preferidas um episódio por semana, sempre no mesmo horário – o que significa que vi “The Big Bang Theory” ao longo de doze anos, e não de algumas semanas. Talvez não goste das maratonas porque sou demasiado paciente e prefiro apreciar a arte televisiva em doses homeopáticas. Por isso me preparei para a maratona da série “Chabadabadá” no Canal Brasil, com os seis episódios em sequência, como quem se prepara para uma prova de resistência. Nem precisava: com história difusa, não faria mal o intervalo de uma semana ou mais entre os episódios.

Permeando toda a narrativa estão Quincas (Matheus Nachtergaele) e Joana (Hermila Guedes). Ele, cronista que publica em jornais, só percebe que a namorada Rita foi embora porque a tigela de ração do cachorro Bombom amanheceu vazia. Dono e animal ficam arrasados com a partida. Mas é cuidando de Bombom que Quincas consegue se reerguer: numa consulta ele conhece a veterinária Joana e começa um relacionamento com ela. Entre idas e vindas, eles vão levando, até que a história deles acaba numa nota conservadora, embora esperançosa.

Todas as demais histórias são de personagens que têm relação com Quincas ou Joana. Somos assim apresentados à cam girl Maria Fernanda, com quem Quincas conversa numa espécie de terapia erótica virtual. Há também o colega de trabalho de Quincas, Leandro, que descobre que o namorado o está traindo. Quincas ainda tira a sorte com a cartomante Dolores, amiga do garoto Kléber, que faz entregas de marmitex. A amiga de Joana, Laura, é informada pelo ficante que ele está apaixonado por outra. Cada trama paralela ocupa um episódio, e algumas delas, como a história de Maria Fernanda, que um dia atende seu professor da faculdade na sex cam, dariam mais pano pra manga e deixaram um gostinho de “quero mais”.

Há momentos em que os personagens olham para a câmera e falam frases de efeito, como quem troca confidências com o público. As histórias paralelas, ficamos sabendo, servem de inspiração para Quincas, não apenas como cronista da modernidade, mas como homem navegando os novos tempos e repensando o conceito de masculinidades – assim, no plural, e de preferência saudáveis e não truculentas. Em entrevista para a Folha de Pernambuco, uma vez que a série se passa no Recife, Nachtergaele disse, sobre seu personagem e sua jornada:

“O Quincas é o homem moderno brasileiro, que aprendeu a amar de uma forma e tem essa aventura pela frente para continuar conseguindo amar com as mudanças de comportamento. Ele é um personagem inteligente, sem muitos preconceitos, mas que ainda reage no relacionamento com as mulheres com uma estrutura um pouco machista. Durante os seis capítulos, ele será levado a aprender algumas coisas. É filosófico e divertido, bem-humorado e safado, inteligente e crítico”

O ponto de partida foi o livro homônimo de Xico Sá, – que conta com o curioso subtítulo “Aventuras e desventuras do macho perdido e da fêmea que se acha” – mas o roteiro ficou a cargo de Anna Carolina Francisco. A ideia da adaptação veio de Claudio Assis, creditado como diretor geral, que traz o dinamismo do novo cinema pernambucano para a obra.

A trilha sonora original é de Karina Buhr. Nascida em Salvador, mudou-se para o Recife ainda criança, onde começou longa e exitosa carreira na música. Também atriz e escritora, já participou da composição de trilhas sonoras para diversas produções audiovisuais.

A presença feminina em “Chabadabadá” não se observa somente na escrita e na trilha sonora. O primeiro e o último episódios foram dirigidos por Tuca Siqueira, enquanto os demais quatro foram dirigidos por Júlia Moraes. A sequência final, num contra-plongée no balanço, é pura poesia e até serve como metáfora dos relacionamentos: um de cada lado, cada um propelindo o brinquedo para frente ou para trás, mas ambos sempre em movimento.

Nachtergaele arremata, na entrevista supracitada, dizendo que “Chabadabadá é uma espécie de Sex & the City tupiniquim”. Nunca assisti – nem uma vez por semana, nem em maratona – a “Sex & the City” para dizer se a comparação faz sentido. Mas sei que a série brasileira, e tão profundamente pernambucana, se não é necessária por seus temas, ao menos garante diversão e uma boa maratona.

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