'Irmãs' de Raina Telgemeier traz um olhar sincero sobre vínculo familiar

O que significa ter um irmão? Para quem tem, sabe que um milhão de problemas e um outro milhão de vantagens. Tensões e brigas, problemas de espaço, a diferença de gostos, interesses, conflitos bobos sobre pequenas coisas, momentos de conexão, o riso compartilhado, os medos, a proximidade, a distância, o amor incondicional, o ódio irracional chegando em ondas incontroláveis, a capacidade de ignorar o outro, as fantasias de ser apenas uma criança, a idealização da solidão, as comparações odiosas entre irmãos, a vitimação, todos e cada um dos sentimentos que quem possua irmãos é perfeitamente refletido na história que Raina Telgemeier nos conta.

Irmãs (Sisters, tradução de Guilherme Miranda) segue a ambientação com a protagonista  de Sorria (Smile) e sua reação com sua irmã. Raina reconstrói seu relacionamento com sua irmã, cinco anos mais nova, e conta duas histórias em paralelo.
Nas páginas marcadas por um tom amarelo, narra a história de sua vida; seu desejo de ter uma irmã, o anúncio da notícia dada por seus pais, seu desejo de conhecer sua irmã e depois, pouco a pouco, os desentendimentos de uma realidade que sua irmã não se parece com nada do que imaginou. Amara não responde às suas expectativas ideais, com critérios e gostos próprios que Raina acha repugnante (seu amor por cobras e animais em geral), um senso de humor que ela não entende, muita genialidade e um milhão de outros detalhes que a deixam louca.

A graphic novel de Raina usa seu humor e seu encanto característicos para contar a história da sua relação com a irmã caçula, que se desdobra ao longo de uma viagem de carro de sua casa em São Francisco até uma reunião familiar no Colorado.

Sem celulares, sem tablets, e nenhuma outra forma moderna como conhecemos hoje em dia. Raina tinha só um walkman com o qual afasta-se  tudo o que acontece no carro, a conversa da mãe, as músicas do irmão e as impertinências da irmã.

Qualquer leitor que foi adolescente nos anos 1980 vai lembrar perfeitamente a sensação de ter walkman como um escape da vida familiar. As canções ouvidas à exaustão, a realidade que cada música conduzia, as letras que conectavam com o que estava acontecendo fora de sua casa, sua família, de seu ambiente. Música para escapar.

Nessa viagem, as irmãs descobrem o vínculo que as une e se surpreendem. Elas, que até então só sentiam estranhas e condenadas a viverem juntas, percebem que há muito mais que os une do que os separa e, acima de tudo, uma precisa da outra para enfrentar o mundo lá fora e construírem sua história.

Una narrativa de descoberta do vínculo fraternal, contada com humor e realismo. Para quem conviveu com irmãos, os detalhes apresentados pela autora mínimos que sejam causam um flash de ” aconteceu comigo”. No meu caso, como qualquer outro leitor adulto, Irmãs faz emergir um sorriso fácil, e sua leitura proporcionou momentos nostálgicos, numa leitura rápida, sem muitos problemas argumentais. Para o leitor com filhos adolescentes, é uma representação gráfica do que acontece em sua casa e, para o leitor pré-adolescente, trata-se de um quadrinho com personagens com o qual se identificará facilmente.

O desenho da HQ é um mero veículo para contar as relações das irmãs, é um traço simples e plano, esquemático quase, mas que de maneira eficaz retrata as relações naturais que todos reconhecemos, a família, com todos os seus ângulos, atritos, faíscas e refúgio. Com cores de Brandon Lamp no melhor estilo toon, como em um desenho animado, mas que repassam os significados presentes na obra.

Publicado pela Devir, que mais uma vez capricha na edição, seguindo o acabamento e o formato do original. De leitura fluida e leve, Irmãs é um título em quadrinhos que, se você é um adulto, não mudará sua vida, mas faz você sorrir quando sua vida refletida em algum daqueles momentos apresentados na sua narrativa. Se você tem filhos adolescentes, é uma forma maravilhosa para compartilhar entre eles o que já aconteceu em sua família. Recomendo.

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