Livro “O abismo é um instante” tece o tempo no silêncio do verso

Deixo à atração dos imãs o valor contratual das imagens. Talvez a primeira imagem nascida tenha feito da zanga uma miçanga dos pais. O primeiro cobertor de uma fantasia é uma zanga zigue-zague de uma ordem não obedecida. Descida às raias da imaginação, a zanga é a razão dionísica  da física, do atropelo entre o dito e o interdito.

Uma imagem vale mais que uma carta na manga? Claro que para todo bom ilusionista e a poesia é uma arte da ilusão, basta olhar para um poema, ele camufla aquilo que você esqueceu de olhar. Gostaria que a ilusão fosse luzidia. E que ela fosse até certa distância,  a distância do poema, onde olhamos os claros – tons? Do sentido. O reverso da luz é o poema, pois há em ver milhares de conteúdos entre a pergunta que te faço e o espaço que respondes num poema.

O livro do poeta Samuel Malentacchi, O Abismo é um instante, pela Editora Penalux, é este laboro histórico de luzes acesas no quarto; aquela ida à fazenda da Avó onde existem mitos que são engolidos por bocas do parente trovador. Suas imagens são tão precisas, ainda lidando com os arquétipos da cultura de massa, do medo, este componente avassalador de criação imagética. As palavras nos poemas do Samuel lidam com trituração; com mastigação; com antes de tudo; a aglutinação  dos contrários.

“Tracei minhas fraquezas até secar a palavra que fui 

estou no jeito da despalavra”.

A  linguagem no poeta traça tudo que vê, vestígios, restos, fome, mas pelo gosto de suas melodias nos enebria. É uma liturgia do corpo na palavra mais significante. Tais imagens lidam com o calabouço da zanga, aquela palavra gira não na desdita, mas na potência do verbo, aqui não ligado a discurso, mas sim, aos processos lúdicos de afecções  – volitivas.

A matéria prima do texto ficcional deveria ser a sujeira esgarçada.

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