Muitas vezes, pensar e entender emoções pode ser uma tarefa complexa. Foi na tentativa de compreender as suas próprias que o autor e promotor de justiça mato-grossense, Rinaldo Segundo, começou a escrever sobre elas e desses escritos se originou a obra “Emoções: A Grandeza Humana” (144 páginas, Editora Labrador).Constituído por oito contos contos ficcionais, cada um sobre uma diferente emoção, a obra explora a complexidade humana e também dramas sociais como crianças abrigadas, racismo, diferenças sociais e populismo jornalístico, com os quais o autor teve contato por conta de sua profissão.
Rinaldo, nascido em Várzea Grande e atualmente residente de Cuiabá, é formado em Economia e Direito com mestrado em Desenvolvimento Sustentável pela Harvard Law School. Como promotor de Justiça, atua na área de homicídios e crimes sexuais contra crianças e adolescentes.
Antes dessa obra, Rinaldo já havia publicado “Sonhando com Harvard”, em que compartilha suas memórias e conta os passos e iniciativas que o levaram a uma das melhores universidades do mundo, além da não-ficção “Desenvolvimento Sustentável da Amazônia” que, por sua vez, trata do aquecimento global e do desmatamento amazônico, discutindo um modelo de geração de riquezas e redução do desmatamento que dialoga com os desafios ecológicos globais. O livro é fruto da pesquisa de Rinaldo enquanto esteve na universidade americana. Para o futuro, o autor pretende escrever um segundo volume de contos ficcionais. Mais uma vez, relacionado às emoções, porém trazendo um lado mais sombrio delas e levantando temas mais espinhosos.
Confira abaixo uma entrevista completa com o autor:
Você escreveu o livro para entender melhor suas emoções, certo? Você pode falar um pouco mais sobre isso?
Descobri o tema das emoções ao buscar identificar as minhas próprias emoções. Convivo com a dor alheia em meu trabalho como Promotor de Justiça, testemunho mães que perderam os seus filhos, crianças sexualmente abusadas e vulnerabilidades sociais. Em alguma medida, tais dores se tornam minhas também, e convertem-se em ilusões e desilusões nos casos em que atuo.
Como Promotor de Justiça, em um cargo que representa a força estatal, e como homem nascido nos anos 70, cujas emoções eram naturalmente negadas, escrever uma ficção sobre as emoções foi uma libertação. Acho que traduzir a dor alheia, e a minha também, em histórias me tornou mais humano.
As emoções são também universais. Nossos antepassados as sentiram, nossos descendentes as sentirão. É um ponto comum na experiência humana, embora nem sempre identificadas, reconhecidas e permitidas. Escolhi temas sociais para dialogar com alguns desafios de nossa época.
Como foi o processo de escrita do livro?
Estou escrevendo os contos do livro há quatro anos. Como trabalho durante o dia, usei as noites e finais de semana. Agradeço a compreensão da minha parceira neste processo, que foi divertido e também penoso. Divertido, quando encontrei os personagens, os parágrafos e as frases que considerei adequados à história. Penoso, quando a busca da adequação revelou a minha imperfeição.
No fim, vivi cada uma das emoções retratadas nos contos do livro. Apareceu a solidão durante a escrita e a revisão, a alegria do ourives ao moldar uma frase bem-sucedida, a vergonha oriunda da autocrítica quando havia insatisfação, a esperança de terminar a obra quando não conseguia escrever. Raiva? Senti quando as palavras, como um quebra cabeças de um milhão de peças, se escondiam de mim. Com a raiva, vinha o medo, do julgamento do alheio. Mas a paixão por escrever predominou, e sinto-me muito feliz com a publicação do livro.
Por que você trouxe à tona questões sociais no livro?
As questões sociais foram trazidas, pois estão incorporadas em minha vida. Sinto uma necessidade angustiada de falar sobre elas.
Você tem outros livros publicados, um de memórias e outro técnico. Mas essa foi a sua primeira vez escrevendo no gênero de ficção, certo?
Sim, foi a minha primeira experiência no gênero ficção. Apesar de escrever contos há algum tempo, só agora me senti confiante para publicar. Gostei muito da experiência.
Escolhi a ficção pela versatilidade. É possível falar sobre tudo, em assuntos diversos, e com sensações diferentes através de personagens. Este recurso é fantástico. Nós, humanos, adoramos uma boa história também, não é?
E quais são suas principais influências literárias e artísticas?
De Lima Barreto, fui influenciado pela sua angústia com as injustiças. Machado de Assis influenciou (ou deveria influenciar) a escrita de quase todo mundo. Gosto muito também do angustiado Hemingway. O conto sobre a raiva foi influenciado pelo “As Neves”, do Kilimanjaro. Ao escrever, pensei muito também nos filmes do Kieślowski. Sempre gostei bastante da trilogia das cores e do decálogo.
Quais são os seus projetos atuais de escrita? O que vem por aí?
Pretendo escrever um segundo volume de contos ficcionais relacionados às emoções, mas agora envolvendo um lado humano mais esquisito e sombrio, com emoções como a tristeza, o ciúme e o desprezo. Quero articular igualmente temáticas sociais e músicas em cada conto. Gosto da ideia de uma música aludindo a um texto. É uma energia boa. Gostaria de escrever um livro de memórias sobre a experiência de trabalhar em crimes sexuais praticados contra crianças e adolescentes. Pretendo expor o bastidor, os desafios, e o abismo que ainda precisa ser superado para proteger e reparar essas crianças e adolescentes.
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