A Guerra dos Rohirrim confirma a vastidão a ser explorada no universo de Tolkien

Depois da monumental versão cinematográfica de “O Senhor dos Anéis” empreendida por Peter Jackson, o caminho natural era de uma adaptação para as telonas de “O Hobbit”, que acabou se desmembrando desnecessariamente em uma trilogia (dois filmes bastavam). Depois disso, tudo apontava para um longo hiato do universo criado por J.R.R. Tolkien no cinema. A pausa foi interrompida por “O Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim”, em que, assim como na série da Amazon “Os Anéis do Poder”, a trama se volta para o passado, dessa vez no formato de animação, para contar um capítulo importante na cronologia da Terra Média.

Nesse novo capítulo da franquia, acompanhamos a história não contada por trás do famoso Abismo de Helm, a fortaleza icônica cenário de uma das batalhas cruciais dos eventos de O Senhor dos Anéis, mais precisamente no final de “As Duas Torres”. 183 anos antes das aventuras de Frodo e dos acontecimentos da trilogia original de livros/filmes, o destino do povo do reino de Rohan e de seu rei Helm Hammerhand, o último da primeira linhagem de reis, é selado na guerra com Wulf, lorde do povo Dunlending, que busca vingança pela morte de seu pai. Sobre Hera, filha de Helm, recai uma improvável liderança da resistência contra os ataques desse implacável inimigo, porém ela deverá se provar digna da missão antes que seja tarde demais.

A Warner retomou, com essa produção, o formato no qual a obra de Tolkien estreou no audiovisual. Naquela primeira ocasião, uma animação usando a técnica da rotoscopia, de 1978. Agora optaram pelo estilo anime, dirigido pelo japonês Kenji Kamiyama, que tem no currículo outras incursões em franquias hollywoodianas como “Star Wars: Visions” e “Blade Runner Black Lotus”. Ele também trabalhou em “Ghost in the Shell: SAC 2045”. A escolha por não se investir em um filme com atores ou mesmo em uma animação de traço ocidental serviu para conferir um diferencial, além de, claro, beneficiar-se da popularidade das animações japonesas entre o público mais jovem.

A mudança não afetou a coesão com a identidade visual dos filmes de Jackson, que é bastante sentida. Inclusive o tema de Rohan, da trilha sonora de Howard Shore, está presente em meio à nova composição de Stephen Gallagher, que segue estrutura semelhante. A transposição da Terra-Média é bastante acertada e a história guarda bastante fidelidade à matriz literária. Como o foco da trama é um dos reinos dos humanos, as criaturas mágicas ganham menos destaque, o que não quer dizer que não estejam ali de alguma forma. É um lado mais “realista” de Senhor dos Anéis, aproximando-se mais de um “Game of Thrones”, porém menos complexo.

É nítido que o projeto era ambicioso. O roteiro assinado por Jeffrey Addiss, Will Matthews (que também criaram o argumento junto com Philippa Boyens, roteirista e produtora da trilogia clássica), Phoebe Gittins e Arty Papageorgiou busca uma maturidade e uma ótica mais cinzenta e menos maniqueísta. Todavia, essa pretensão fica pelo meio do caminho, já que a história acaba se voltando para o clássico conflito do bem contra o mal bem estabelecidos como tais.

Apesar de não ser muito longo (2h15), e possuir menos momentos contemplativos (que existem, mas de forma mais comedida), a trama não se descuida do desenvolvimento dos personagens. Trata-se de um arco familiar semelhante ao do núcleo formado por Éowyn, Théodred, Éomer e o rei Theoden. A concepção adequada dos protagonistas garante o bom funcionamento narrativo, além das cenas de batalha que se mantêm fiéis às que eram vistas nos filmes em live-action.

“O Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim” não é original, nem se estabelece como divisor de águas das adaptações de Tolkien. Todavia, tem tudo para agradar aos fãs desse que é um dos universos mais cultuados da cultura pop/nerd. É um produto feito sob medida para capitalizar em cima de uma propriedade lucrativa e em nenhum momento esse propósito foi camuflado. No entanto, é feito com respeito aos aficionados e ao cânone, além de mostrar que há muito para se explorar dentro da vastidão criada pelo escritor. A história de Hammerhand é apenas citada brevemente nos apêndices, e já gerou um longa. Philippa Boyens já garantiu que vem muito mais por aí, além do já confirmado filme sobre Gollum. Os fãs ainda terão muitas oportunidades de viajar para a Terra Média na sala escura.

Sair da versão mobile