O Brasil, em sua personalidade social, é um baita terreno fértil para o cinema. O problema é que o cinema daqui ainda não tem sabido cultivar essa fertilidade tão evocada por seu próprio meio. Alemão é a personificação mais clara disso. Ainda que a tendência “favela movie” que tomou o cinema nacional nos anos 2000 já há muito demonstre desgaste, sua, digamos, sobrevivência ainda é uma ressonância dos excelentes tratados pioneiros de Fernando Meirelles com sua obra-prima Cidade de Deus, e José Padilha, com seus efervescentes Tropas de Elite.
Sua trama acompanha a já histórica tomada policial do conjunto de favelas do Complexo do Alemão, em novembro de 2010, que abria um precedente político-social com a implantação das UPPs (Unidades de Polícias Pacificadoras). A opção do roteiro até se ensaiava interessante com a claustrofóbica trama de policiais infiltrados encurralados com o desmantelamento do tráfico na complexa rede de favelas. Mas é esse mesmo roteiro que revela-se o grande algoz do filme como um todo. Ao substituir a urgência do fato pelas arestas do melodrama, Alemão cai numa irrevogável sucessão de clichês esquizofrênicos que, ora vira um derivativo do tema proposto, ora demonstra não conseguir sustentar as relações estabelecidas para emoldurar um retrato crível do que factual. Um exemplo disso é o rendimento do elenco, com um Cauã Reymond limitado num arquétipo e um Antônio Fagundes desperdiçado em falas constrangedoras. Outro ponto lamentável é sua trilha incidental: das mais inconvenientes que já vi num filme.
O diretor José Eduardo Belmonte parece, mais uma vez, mão saber lidar com o mainstream. Quando fazia seus filmes underground como Se Nada Mais Dar Certo e A Concepção demonstrava um domínio de sua narrativa tão assertivo que seus universos conseguiam suplantar maneirismos indies. Depois do irregular Billi Pig, agora com Alemão, Belmonte faz um filme de mera apatia artística, se submetendo a um roteiro equivocado e sem conseguir delinear interpretações eficazes (Marcello Melo Jr, Caio Blat e Mariana Nunes são exceções, brilhando na tela). Em suma, Alemão desperdiça seu potencial dramatúrgico, ao não desenvolver o meio para planificar dramas pessoais que nada acrescentam ao discurso da qual está explicitamente atrelado. Ou seja, a personalidade complexa do Brasil está aí. Só resta um bom analista para poder desvendá-la cinematograficamente. Não foi dessa vez…
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