Em 2016, ano que o país foi sacudido pelo processo de impeachment da então presidente Dilma Rousseff, as diretoras Anna Muylaert e Lô Politi conseguiram o que poucos profissionais do audiovisual interessados naquele momento histórico do país, tiveram a chance de ter: acesso íntimo ao Palácio da Alvorada, especialmente nos momentos que antecederam o fato.
Não só à Alvorada (nome do lançamento), mas também à própria presidenta. Esse privilégio resultou numa abordagem que lembra a do mestre Eduardo Coutinho em Peões, onde o todo é construído pelo olhar mirado aos funcionários secundários de um espaço físico que de alguma maneira refletia a situação institucional vigente.
A resignação de Dilma diante da urgência dos bastidores para sua destituição, mostrada na intimidade possível de uma câmera apontada para si, é o que mais fala sobre o documentário. Tem-se ali um indivíduo em perspectiva pelas instituições que o forjaram. Não é um filme sobre o impeachment em si, mas sobre ela e o ambiente em que se inseria no momento da hoje entendida, conspiração.
A direção é sensível ao buscar metáforas espaciais sólidas quando a presidente não estava em foco. Por isso, seja quando Dilma discorre sobre a banalidade do mal, citando Hannah Arendt, seja quando vemos um pássaro preso perto do espelho d’água, o filme está sempre de alguma forma, testemunhando e provocando para além do que se vê. Em se tratando de um documentário, onde a realidade pressupõe-se factual, sob a perspectiva “inventada” de um olhar, isso é um valor e tanto para seu resultado. Entretanto, sendo lançado após exemplares no assunto como O Processo (2018) e Democracia em Vertigem (2019), que propunham complexidades nessa relação da presidente com o impeachment sofrido, Alvorada perde muito do frescor, mesmo sendo tão íntimo, até porque nenhuma documentação do episódio fugiu desse ponto de vista do indivíduo a mercê de meios e fins. Mesmo levemente esvaziado, o documentário acrescenta mais uma observação ja esmiuçada.
Nota: Bom – 3 de 5 estrelas
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