Anaconda mostra que, em alguns casos, é melhor abraçar a galhofa

Anaconda (2025) reinventa o clássico trash dos anos 90 com humor, metacinema e bromance, apostando na química de Jack Black e Paul Rudd e na participação de Selton Mello.


Humor, nostalgia e metalinguagem para reinventar um clássico improvável.

Anaconda, o inacreditável zooterror de 1997 estrelado por Ice Cube, Jennifer Lopez e Jon Voight, nunca foi um filme para ser levado a sério. Quem tentou encará-lo dessa forma certamente saiu frustrado. Já quem o assumiu como puro trash acabou encontrando uma pepita do mais concentrado suco do cinema dos anos 90 — obra que, à época, parecia totalmente perdida, mas hoje é cultuada. Como aconteceu em diversos casos, o longa, que foi massacrado pela crítica, acabou se tornando um clássico. Depois de sequências pífias (essas, sim, assumidamente B), chega aos cinemas Anaconda (2025), que não é apenas uma continuação ou um reboot: trata-se de um metafilme, à maneira de O Novo Pesadelo: O Retorno de Freddy Krueger, da franquia A Hora do Pesadelo.

Um grupo de velhos amigos, cada um lidando à sua maneira com as incertezas da meia-idade, decide tirar do papel uma ideia que parecia apenas uma brincadeira: refazer o filme que marcou suas juventudes. Movidos pela nostalgia e pela vontade de reviver tempos mais simples, eles viajam até o Brasil, rumo à floresta Amazônica, para realizar um reboot de Anaconda, obra da qual são fãs declarados.

O que começa como uma aventura saudosista logo foge do controle, quando o ambiente hostil revela seus perigos — tempestades imprevisíveis, personagens violentos pelo caminho e criaturas ameaçadoras transformam a expedição em uma corrida desesperada pela sobrevivência. Entre tensão, ironia e companheirismo, a missão deixa de ser sobre cinema e memória e passa a ser sobre resistir, confiar uns nos outros e descobrir até onde a amizade pode ir quando a vida está literalmente em jogo.

O filme acerta ao adotar não apenas o conceito de metafilme, mas também o de bromance. A escolha da dupla Jack Black e Paul Rudd é especialmente feliz. Ambos extraem humor constante, ainda que repitam trejeitos e maneirismos já conhecidos. Mesmo sem oferecer grandes novidades em suas atuações, funcionam muito bem — e, de fato, se a química e o timing cômico da dupla não funcionassem, sobraria pouco para sustentar as referências ao clássico de 1997 e as piadas com a cultura pop.

Com um currículo ainda relativamente curto, o diretor Tom Gormican demonstra segurança ao extrair graça dessa retomada de Anaconda, com bom ritmo de comédia e timing correto, que muito remete mesmo ao clima dos anos 1990. O roteiro, escrito por ele em parceria com Kevin Etten — a mesma dupla responsável por Um Tira da Pesada 4: Axel Foley —, mantém o filme em constante movimento.

O novo Anaconda, no entanto, é muito mais sobre o amor pelo cinema que une dois amigos do que propriamente sobre a cobra ameaçadora. Isso, de certa forma, enfraquece a premissa, especialmente para os fãs do trash mais gore. Embora o trailer já deixasse claro o viés humorístico, talvez fosse interessante que a comédia não se sobrepusesse tanto ao terror.

O restante do elenco também cumpre bem sua função. Thandiwe Newton, como a mocinha Claire, e Steve Zahn, como Kenny, atuam sobretudo como escadas para Black e Rudd, mas têm muito mais relevância do que o personagem de Eric Stoltz no filme original, que passa praticamente toda a trama deitado em uma cama. Para o público brasileiro, há um atrativo especial: a presença de Selton Mello, em sua estreia em Hollywood logo após o oscarizado Ainda Estou Aqui. O ator imprime o cinismo que o texto exige para o treinador de cobras Santiago Braga e deixa transparecer sua veia cômica característica — inclusive com leves ecos de João Grilo, de O Auto da Compadecida. Soma-se a isso a participação do mineiro Rui Ricardo Diaz e da portuguesa Daniela Melchior, dublada para o português brasileiro.

No fim, Anaconda é um passatempo leve, que ri da própria franquia, da indústria do cinema e, ao abraçar a galhofa, revela até mais lógica interna do que o roteiro do filme original. Consegue condensar reboot, metafilme e até uma espécie de sequência de legado em uma linguagem satírica, à maneira de Pânico (2022). Uma grata surpresa — especialmente para quem assiste sem grandes expectativas.

Anaconda

Anaconda
65 100 0 1
Nota: 6,5 – Bom
Nota: 6,5 – Bom
65/100
Total Score iAnaconda (2025) aposta no humor, no metacinema e no bromance para reinventar a franquia cult dos anos 90. Veja nossa crítica completa do novo filme com Jack Black, Paul Rudd e Selton Mello.