Há cineastas que quando anunciam um novo projeto, inevitavelmente criam uma grande expectativa por parte do público e da crítica. Quando anunciou seu novo longa, “Aqui”, Robert Zemeckis sabia que causaria barulho por dois motivos: o primeiro por reunir Tom Hanks e Robin Wright como um casal trinta anos depois de “Forrest Gump”; o segundo por estar retornando ao tema que o consagrou como um diretor de prestígio, no caso, o tempo. Só que a viagem temporal não se dá por um carro adaptado e sim através da passagem natural das épocas (na trama, claro, pois para nós realmente parece uma viagem no tempo) a bordo de uma… casa.
O filme busca explorar a profundidade da experiência humana através de gerações conectadas por um único espaço: uma casa, mais precisamente sua sala. A trama acompanha diversas famílias ao longo do tempo, mostrando as transformações do mundo desde os primórdios da humanidade até um futuro próximo, sempre por meio das histórias vividas nesse local especial. O ponto central é o casal Richard (Hanks) e Margaret (Wright), que está prestes a deixar o lar onde construíram memórias repletas de momentos marcantes, entre alegrias e perdas.

O longa é baseado na aclamada história em quadrinhos de Richard McGuire, com apenas 6 páginas, publicada em 1989, e expandida para uma graphic novel de 304 páginas em 2014. Zemeckis frequentemente recorre ao efeito de recorte de HQ, mais ou menos como fez Ang Lee em Hulk, obedecendo o estilo gráfico da obra original., escolha estética que confere elegância à produção.
Zemeckis também aproveita o conceito dos quadrinhos de McGuire para brincar de Terrence Malick. É impossível não comparar algumas passagens com a linguagem do diretor, sobretudo no filme “A Árvore da Vida”. Nesses momentos do roteiro, que o diretor assina com Eric Roth (outra parceria retomada de “Forrest Gump”) o filme encontra certa fragilidade. O intuito era propor um ensaio existencial através dos tempos, traçando na linha do tempo da humanidade a forma como vidas e histórias se entrelaçam em um mesmo lugar. Porém, como não é estabelecida uma mínima conexão entre as épocas, além é claro, da casa, esse fim não é totalmente alcançado.

A questão do uso de inteligência artificial foi bastante criticado, e, de fato, o resultado nem sempre é o que se pretendia. Principalmente no rejuvenescimento dos atores, que funciona em alguns momentos e em outros causa uma certa estranheza. Zemeckis passou a se divertir com tecnologia nos últimos anos, tendo passado um período produzindo apenas animações, como O Expresso Polar e A Lenda de Beowulf, todas em CGI e já antecipando a onda 3D deflagrada por “Avatar”. Ele parece ter aceitado pagar o preço do pioneirismo, provavelmente confiando que o filme possa ser visto como avant-guarde daqui a alguns anos. Veremos.
Os trunfos de “Aqui” compensam suas claudicações. Zemeckis repete aqui vários de seus maneirismos que ajudaram a tornar “De Volta Para o Futuro” e “Forrest Gump” obras tão marcantes para a cinefilia (há, inclusive, um “equivalente” ao relógio da torre) e, claro, a química entre Tom Hanks e Robin Wright que não se dissipou nessas três décadas. São pontos que valem o ingresso para os fãs do cineastas.
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