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Crítica: “Vício Inerente” fascina graças a trama complexa e “viajante”

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Um dos mais celebrados diretores americanos que surgiram nos últimos 20 anos, Paul Thomas Anderson conseguiu a proeza de causar uma grande expectativa dos fãs de cinema de todo o mundo sempre que anuncia um novo filme. Felizmente, ele ainda consegue, ao mesmo tempo, intrigar e seduzir o público com propostas criativas e bem diferentes da maioria dos cineastas em atividade, mesmo que os resultados finais não sejam totalmente compreendidos por boa parte do público em geral. Isso pode ser observado, especialmente, em sua mais recente empreitada: o drama policial “Vício Inerente” (“Inherit Vice”), inspirado no livro de Thomas Pynchon, que tem elementos do cinema noir, embora seja contado de uma maneira fora do convencional e, ainda assim, causa um certo fascínio em quem embarcar nesta verdadeira viagem.

Ambientada nos anos de 1970 e narrada pela esotérica Sortilège (Joanna Newson), a trama se passa em Los Angeles e é centrada em Larry “Doc” Sportello (Joaquin Phoenix), um investigador particular adepto da filosofia hippie e do consumo de drogas. Uma noite, ele recebe a visita de sua ex-namorada Shasta Fay (Katherine Waterson), que lhe pede para descobrir o paradeiro de seu atual amante, o empresário Mickey Wolfmann (Eric Roberts). À medida em que avança em suas investigações, Doc acaba tendo que lidar com personagens bizarros, como a esposa de Wolmann (Serena Scott Thomas), o policial Christian “Pé Grande” Bjornsen (Josh Brolin), o saxofonista Coy Harlingen (Owen Wilson), que trabalha como informante da polícia, e sua mulher Hope (Jena Malone). Aos poucos, a situação fica cada vez mais complicada com o desaparecimento de Shasta e outros acontecimentos envolvendo um estranho grupo que pode estar ligado a assassinatos, sequestros, tráfico de entorpecentes, o que deixa Doc com problemas bem maiores do que esperava enfrentar.

Para contar a história de “Vício Inerente”Paul Thomas Anderson (que também escreveu o roteiro) utilizou um recurso interessante, que foi mostrá-la como se fosse vista pelos olhos de seu entorpecido protagonista, o que gera cenas inusitadas, delirantes e até mesmo bastante divertidas. Porém, o ponto forte do filme é, ao mesmo tempo, sua fraqueza. Em alguns momentos, a trama perde um pouco do seu sentido e algumas situações ficam mal explicadas ou sem solução, o que pode desagradar ao público que busca alguma lógica para o que está assistindo. Além disso, o ritmo arrastado a partir da segunda metade do filme também prejudica a compreensão de alguns fatos, o que pode gerar mais perguntas do que respostas ao fim da sessão. Ainda assim, a produção salta aos olhos graças à boa recriação da época e seus personagens insanos, que se metem em situações beiram o surrealismo, ainda mais do que geralmente se espera de um drama policial. Aliás, vale ressaltar que não há grandes cenas de tiroteios ou outros clichês comuns neste tipo de filme, o que só atesta a sua originalidade.

Felizmente, Anderson também contou com ótimos atores à sua disposição para a sua adaptação do livro de Pynchon. Joaquin Phoenix, que voltou a trabalhar com o diretor após “O Mestre”, seu filme anterior, volta a mostrar porque é um dos melhores atores da atualidade. Sua atuação, meticulosa e carismática, tornam o seu protagonista bem interessante, ajudado também pela ótima caracterização hippie e que não liga muito para a aparência. Mas ainda assim, uma pessoa crível em sua busca pela verdade, mesmo que não entenda muito bem como chegar a ela. Josh Brolin, cada vez mais especializado em tipos durões, também não faz feio e embarca nos delírios da trama com alguma dignidade, fazendo uma boa dupla com o investigador, assim como Benicio Del Toro, que vive o estranho advogado do “herói”. Uma curiosidade é rever Reese Witherspoon ao lado do protagonista, dez anos depois dos dois estrelarem “Johnny e June”, que deu a ela o Oscar de Melhor Atriz de 2005. Aqui, Witherspoon vive uma promotora que tem um caso com Doc e pode ajudá-lo a resolver o caso.

Mas, além de Phoenix, os principais destaques do elenco são Martin Short, como um dentista um pouco fora de controle que rouba todas as cenas em que está presente, e a pouco conhecida Katherine Waterson, que mostra sensualidade como a femme fatale da história e que faz todos ao seu redor perderem a cabeça por ela, ainda que esconda de todos suas reais intenções. Já Owen Wilson e Jena Malone estão interessantes com seus personagens chapados que vivem um estranho casal e que são responsáveis por alguns dos momentos mais cômicos e bizarros do filme.

Amparado por uma ótima trilha sonora de canções obscuras dos anos 1970 e a habitual colaboração de Jonny Greenwood, “Vício Inerente” é um tipo de filme capaz de deixar David Lynch (e seus fãs) com um belo sorriso no rosto ao acender das luzes. Mas quem não curte produções enigmáticas pode realmente detestar a nova  proposta de Paul Thomas Anderson. Mesmo assim, vale conferir (talvez até duas vezes para “pescar” todos os elementos presentes na história), apesar das ressalvas.

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