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Diversidade em Hollywood prenuncia fim do imperialismo cultural?

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Recentemente saíram várias matérias na internet e na mídia impressa sobre a revolta considerada racista dos nerds em relação às escolhas de elenco feitas para filmes de seu tão caro universo da ficção científica e dos quadrinhos. São declarações de descontentamento com a escolha de um ator negro para viver Johnny Storm, o Tocha Humana do novo Quarteto Fantástico, e uma certa estranheza em relação ao fato do personagem Finn, um dos protagonistas de “Star Wars: O Despertar da Força”, e primeiro rosto a aparecer no teaser trailer que parou a internet em novembro de 2014, também ser afrodescendente. Isso sem contar com o grande temor de que o novo Homem Aranha dos cinemas viesse a ser o sucessor de Peter Parker, Miles Morales, que é mestiço negro e hispânico. Saindo da seara racial, mas ainda tratando de minorias, há o Flash, que ganhará seu longa metragem em 2018 e será interpretado por Ezra Miller, um ator assumidamente gay. Contudo, os nerds radicais em relação à personificação nos cinemas de seus personagens favoritos têm de aceitar o fato de que o multiculturalismo chegou à Hollywood, e isso é sintomático.

De uns anos para cá, as bilheterias dos filmes hollywoodianos em outras praças fora dos EUA representam a maior parte no montante dos lucros dos filmes, diferente de vinte anos atrás, em que o grosso da bilheteria vinha do mercado doméstico. E ironicamente o que está impulsionando essa significância das bilheterias internacionais é justamente aqueles que outrora eram conhecidos como mercados periféricos, como América Latina e Ásia. Até mesmo no mercado interno estadunidense, a metade do público pagante (em alguns casos até a maioria) é formada por uma audiência étnica, ou seja, negros, latinos, descendentes de asiáticos etc. Com isso o cinema precisa dialogar com esse público que paga ingresso e compreensivelmente quer se ver nas telas. Não foi à toa que o remake de Karatê Kid foi estrelado por um menino negro e que, ao invés de se mudar com a mãe para uma outra cidade americana se muda para outro país, não por acaso, a China, que acaba de se firmar como o maior mercado consumidor de cinema do mundo, apesar das restrições da mão de ferro do Partido Comunista Chinês.

Também não é por acaso que o elenco de “Star Wars O Despertar da Força” contará com um negro e um latino no trio de protagonistas. Oscar Isaac é guatemalteco (seu nome completo é Oscar Isaac Hernandez) e em homenagem a seu país, que serviu de locação para Yavin, seu personagem também será originário deste planeta. Isso em uma franquia que se iniciou com um trio de protagonistas formado por dois homens brancos americanos e uma mocinha recém chegada de um período na Inglaterra forçando um sotaque britânico, o que só denuncia o sinal dos tempos.

A ascensão dos cineastas latinos, confirmada com a indicação de Alfonso Cuarón ao Oscar por “Gravidade” e com a vitória de Alejandro González Iñárritu este ano por “Birdman” configuram como outro relevante indicador, uma vez que, se as bilheterias estão cada vez mais globais, o olhar por trás das lentes deve ser cada vez mais universal e nada melhor do que diretores estrangeiros para alavancar a ampliação dos horizontes para além do quintal do Tio Sam. Hollywood sabe que suas produções não podem mais olhar apenas para o umbigo americano.

Isso significa que eles desistiram de manter a cultura mundial (ou pelo menos ocidental) sob seu jugo? De forma alguma. Foi apenas uma adaptação mercadológica, que tem seu lado positivo a dar uma opção mais ampla e variegada às plateias do mundo todo, mas que por outro lado, é uma conveniente camuflagem que permite que continuem perpetuando sua cultura como dominante, mas sem alarde, sem evidências, fazendo com que nos sintamos abraçados por ela. Muitos pensam que por não vermos mais um homem branco metralhando indivíduos de outra etnia sob a bandeira da liberdade, isso significaria o declínio do imperialismo cultural ideológico hollywoodiano. Na verdade, eles nunca foram tão fortes em sua abrangência como agora.

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