Drama político “Belas Promessas” não empolga, mas vale por Isabelle Huppert

As roupas chiques e os sorrisos largos das fotos de eventos oficiais podem nos levar a crer que a vida dos políticos e de seus assessores é cheia de glamour. Balela: por trás de tudo que é “oficial” existe o extraoficial, o dia a dia de lutas políticas e muita burocracia. São em geral estes bastidores do poder que interessam ao cinema e dão origem a filmes quase documentais, como este Belas Promessas.

Falta pouco tempo para acabar o mandato de Clémence (Isabelle Huppert) como prefeita. Seu foco atual é a revitalização de um grande conjunto habitacional chamado Bernardins, nos subúrbios. Quem a ajuda nessa empreitada é o chefe de gabinete, Yazid (Reda Kateb), ele próprio ex-morador dos Bernardins. As pedras no sapato de Clémence serão muitas, entre elas o líder comunitário Michel Kupka (Jean-Paul Bordes) e o locador de apartamentos Frederic Esposito (Soufiane Guerrab).

Clémence é política raiz: em vez de decidir tudo em reuniões a portas fechadas, ela vai onde o povo está, no caso, o povo dos Bernardins, e tenta estabelecer um diálogo com eles, o que inclui diversas belas promessas de melhorias. O corpo a corpo com os eleitores é primordial para ela, mesmo que diga, nesses momentos de encontro e diálogo, coisas que não são necessariamente verdades.

Belas Promessas dialoga abertamente com dois filmes franceses recentes. Um deles é Alice e o Prefeito (2019), também sobre os bastidores da política, numa história sobre a relação profissional de um prefeito e uma filósofa que é contratada para ajudá-lo. O outro é Edifício Gagarine (2020), sobre um conjunto habitacional semelhante aos Bernardins, e a luta de um garoto para que o local não seja botado abaixo.

Muito sutilmente Belas Promessas faz uma crítica à situação das mulheres no política, no momento em que Esposito se refere a Clémence como histérica. Não é raro que mulheres no poder, quando são firmes em sua decisão, sejam questionadas sobre sua sanidade ou mesmo sobre sua vida íntima. É uma pena que o filme não se aprofunde nesse assunto, que também já foi abordado pelo cinema em obras como A Candidata Perfeita (2019), da diretora Haifaa Al-Mansour. Outro assunto que Belas Promessas pincela, mas não se aprofunda, é a condição de moradia e exploração de imigrantes nos conjuntos habitacionais.

Não é exagero – mas talvez seja redundância – dizer que Isabelle Huppert é uma das maiores atrizes da França. Em Belas Promessas ela tem mais um desempenho sólido, sem grandes arroubos emotivos. Muitos críticos e também o público destacaram a atuação de Reda Kateb como Yazid, o burocrata de bom coração. Com uma carreira sólida que inclui um pequeno papel no filme hollywoodiano A Hora Mais Escura (2012), Kateb merece o reconhecimento que vem tendo com este filme.

O diretor e co-roteirista Thomas Kruithof sempre teve interesse pela política, e aqui em Belas Promessas se debruça menos sobre os jogos de poder – embora eles existam na trama – e mais sobre a ação concreta do fazer político. Nas palavras dele:  “O que é muito difícil em filmes sobre política é a representação das pessoas. Ali queria que víssemos os moradores da cidade empenhados, ativos na defesa dos seus interesses”.

Por vezes a trama de Belas Promessas se torna um pouco enfadonha, e nos dá preguiça de acompanhá-la. Mas por Isabelle Huppert persistimos, e com ela e Reda Kateb passamos 98 minutos que podem não acrescentar muito em nossos conhecimentos imobiliários, mas que entretêm e despertam, ao menos, algumas emoções.

NOTA 7 de 10

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