Filmes

Festival do Rio: Somewhere é humano… é maduro… é Sofia Coppolla

Compartilhe
Compartilhe

Einstein não era só um gênio, era também um sábio quando dizia “…deixo de pensar, mergulho em profundo silêncio e eis que a verdade se me revela”.

Foi nessa frase (antológica) que pensei assim que acabou – de forma um tanto exprimível – a sessão do filmaço Somewhere (Em algum lugar, em boa tradução brazuca) de Sofia Coppolla, num dos últimos dias do Festival do Rio, no tradicional cinema Odeon inteiramente lotado.

Costumo dizer que Sofia maneja com perfeição seus filmes a darem forma(s) a um estado de espírito. Essa máxima só se aprimora a cada novo filme que lança. Somewhere guarda semelhanças discursivas em relação ao primeiro grande sucesso da diretora, Encontros e Desencontros (2003), contando, sob a reflexiva ótica da inadequação, as desventuras cotidianas de um ator (Stephen Dorff, perfeito e ressurgindo das cinzas) em seu mundo que conjuga glamour e vazio no mesmo verbo viver.

Respingando em tintas autobiográficas pela sua condição de filha de um dos diretores mais incensados do mundo, Francis Ford Coppolla, ou seja, conhecedora da rotina do mainstream hollywoodiano, Sofia vai destilando ironia ao estabelecer a apatia personalista de seu protagonista no circo midiático que a própria indústria alimenta – o que não deixa de ser curioso, uma vez que a própria cineasta vive nessa linha tênue entre a badalação de seu nome e o intimismo de seus filmes. Aliás, nesse filme ela amadurece o uso de metáforas e vai compondo cada cena com muitos signos representativos, seja no olhar “de ressaca” de Dorff diante de um show de pole dance de duas strippers; seja nos círculos que o mesmo dá em seu carro, completamente a ermo, em alta velocidade, no início do filme.

Sofia está interessada em expor o seu personagem de dentro para fora, para que o espectador não só entenda como compreenda que aquela inadequação não é apenas pontual, mas sim representativa da possível falta de um sentido para a vida. E isso é arregimentado com a chegada de sua filha, de um relacionamento passado, que passa um período com ele: a (des)construção de uma intimidade entre pai e filha chega a ser comovente, não pelos clichês, que o filme foge eficientemente, mas pela forma como isso é mostrado na tela.

A câmera de Coppolla é espertamente discreta, o que resulta num filme íntimo, mas com distanciamento exato para que as imagens falem por si. A cineasta comprova mais uma vez a sua marca como diretora, que remete muito ao que se vê no chamado “cinema de arte europeu”. Mas cá entre nós, ela consegue dar voz ao silêncio de forma muito mais objetiva que um Antonioni da vida… E nessa “subjetividade objetiva”, quase que parafraseando o mestre Fellini, Sofia Coppola consegue injetar mais do que verdade em seu filme; ela injeta humanidade em todas as arestas de sua ficção.

Compartilhe

1 Comentários

  • Filme dessa natureza faz repensar o nosso modo de vida cada vez mais consumista e sem sentido.O enfoque dado por sófia nos remete a outros cenários.É uma bela viagem!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Sugeridos
CríticasFilmesLançamentos

Parthenope: Os Amores de Nápoles

Juntas, elas têm 26 Oscars de Melhor Filme Internacional. Itália e França,...

CríticasFilmesLançamentos

“Máquina do Tempo” muda o rumo da História com narrativa ousada

Se você gosta de História tanto quanto eu, já deve ter se...

AgendaFilmes

CAIXA Cultural Rio de Janeiro recebe mostra gratuita da cineasta Paula Gaitán

A CAIXA Cultural Rio de Janeiro apresenta, entre os dias 6 e...

FilmesPremiaçõesVideocastVideos

Por que Fernanda Torres perdeu o Oscar?

O Brasil está em festa pela vitória de “Ainda Estou Aqui” no...

FilmesNotíciasPremiações

Oscar com vitória inédita do Brasil leva clima de Copa do Mundo ao Carnaval

Foi uma situação atípica no último domingo (2). Um Oscar no meio...

EntrevistasFilmesNotícias

Fernanda Torres pede para mandarem “só amor a Mikey Madison”

Diretor e atores do filme brasileiro vencedor do Oscar conversaram sobre "Ainda...

CríticasFilmes

Ad Vitam: filme traz intrigas e conspirações emaranhadas

Depois de escapar de uma tentativa de assassinato, Franck Lazareff precisa encontrar...

CríticasFilmes

“Um Completo Desconhecido” adapta com fidelidade a trajetória de Bob Dylan

Se o filão das cinebiografias musicais é inevitável, nenhum grande nome da...