“Ghostbusters: Apocalipse de Gelo” peca pelo apego excessivo à nostalgia

Se há uma franquia que nos remete imediatamente aos anos 80 é Caça-Fantasmas. Basta visualizar a logo do serviço de dedetização de espectros que nos vem à cabeça o tema de Ray Parker Jr., ou vice-versa. Seguindo a retomada da franquia, que se deu com “Ghostbusters: Mais Além” (assim como Star Wars resolveram universalizar a marca com o nome em inglês), “Ghostbusters: Apocalipse de Gelo” chega com a proposta de levar a história adiante, mas na verdade representa um literal retrocesso.

O apego excessivo à nostalgia se mostra claro já na ambientação. A família Spengler retorna ao local onde tudo começou. Agora eles moram no icônico corpo de bombeiros de Nova York, de onde partem para suas missões como a nova equipe de caçadores de fantasmas. Enquanto isso, os heróis originais desenvolveram um laboratório de pesquisa ultrassecreto para levar a destruição de fantasmas ao próximo nível. Mas quando a descoberta de um artefato antigo desencadeia uma força maligna, as duas gerações de Caça-Fantasmas devem unir forças para proteger seu lar e salvar o mundo de uma segunda Era Glacial.

Se “Ghostbusters: Mais Além” trazia um certo frescor e elementos nostálgicos na medida certa para arrancar sorrisos dos antigos fãs, neste segundo optaram pelo esquematismo, praticamente reproduzindo o roteiro do filme de 1984 (como o fez a continuação não tão brilhante de 1989). Subvertendo a regra das retomadas de franquia, aqui, o primeiro filme buscou inovar de certa forma e o segundo tenta emular o clássico ao invés de apresentar novidades. Só que o faz recorrendo a facilidades como referências e easter eggs inseridos gratuitamente.

Que um filme escapista, ainda mais imbuído da alma oitentista apresenta uma configuração de parque de diversões, isso já é esperado e a produção o faz muito habilmente, proporcionando momentos realmente divertidos. O problema é que foi esquecido um elemento de suma importância para uma aventura funcionar que é a sensação de perigo. Em nenhum momento os personagens estão realmente correndo um risco. E nenhum dos eventos causa consequências. Em meio a novas mochilas de prótons, mini-marshmallows fazendo estripulias no estilo Gremlins e o Ecto-1 disparando a sua icônica sirene, esqueceu-se de mostrar, mesmo que com humor, que lidar com espectros correndo soltos em Nova York é uma tarefa bastante arriscada.

A direção de Gil Kenan pode até se justificar pelo fato de ter sido roteirista de Mais Além (aqui ele também assume o script, dividindo a caneta com Jason Reitman, diretor do anterior e filho do criador, Ivan) e ter comandado o remake de Poltergeist. Mas apesar das credenciais, não fez muito mais do que prestar tributo ao estilo de Ivan Reitman dos anos 80, deixando a autoralidade de lado.

Com a nova turma devidamente apresentada no longa de 2021, agora é o momento de explorar a dinâmica entre eles e conflitos. Gary Grooberson (Paul Rudd) assumiu o papel de pai dos filhos de Callie Spengler (Carrie Coon). Mas Phoebe (McKeenna Grace) passa pela adolescência e deixa tudo mais complicado. Inclusive esse ponto específico poderia ser desenvolvido mais satisfatoriamente. Os Caça-Fantasmas originais estão ali para mostrar quem são os donos do show afinal de contas, e a passagem de bastão acenada no longa anterior parece ter sido revogada. No fim das contas, a nova geração acaba mesmo dependendo da anterior para quase tudo. Ainda que seja um deleite vê-los em tela novamente, fica a impressão de que estão ali somente para aquecer os corações saudosistas, sem uma função que os justifique na maior parte do tempo.

“Ghostbusters: Apocalipse de Gelo” até consegue se sair bem como uma diversão ligeira em uma sessão da tarde. No entanto, quem for ao cinema esperando algo marcante, ou um divisor de águas na franquia, vai se decepcionar. Apoiar-se na nostalgia não é o bastante para se construir uma história que mobilize os corações e mentes. E que, cientes disso, façam do próximo um verdadeiro passo adiante na saga.

Sair da versão mobile