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"A Grande Jogada" não blefa ao contar a história da Princesa do Pôquer

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Jessica Chastain in MOLLY'S GAME
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Depois de se destacar na realização de alguns dos melhores roteiros já transformados em filmes hollywoodianos, como “Questão de Honra” (1992), “A Rede Social” (2010), “O Nome que Mudou o Jogo” (2011) ou “Steve Jobs” (2015) – sem falar nas consagradas séries “West Wing: Nos Bastidores do Poder” e “The Newsroom” – Aaron Sorkin resolveu se aventurar na direção com a adaptação do livro de Molly Bloom sobre sua trajetória no mundo milionário do pôquer organizado por astros do cinema e milionários de Wall Street, onde chegou a ser conhecida como a “Princesa do Pôquer”. O resultado atende pelo nome no Brasil de “A Grande Jogada” (“Molly’s Game”, 2017), onde o cineasta de primeira viagem (e também roteirista) mostra um bom dinamismo para contar a sua história e mantém o interesse durante boa parte do tempo, fazendo com que seu filme seja bastante agradável até mesmo para quem nunca sentou numa mesa para jogar cartas.
O filme mostra como Molly (vivida por Jessica Chastain), ex-esquiadora que, após um grave acidente durante as eliminatórias das Olimpíadas de Inverno e antes de entrar para a faculdade de Direito, decide dar uma pausa para espairecer em Los Angeles. Ao começar a trabalhar para o produtor Dean Keith (Jeremy Strong), Molly passa a ter contato com pessoas com muito dinheiro para apostar em jogos de pôquer particulares, incluindo um famoso ator de cinema, que ela passa a chamar de Jogador X (Michael Cera). Cada vez mais interessada por esse novo mundo, não demora para que Molly não apenas entenda todas as regras do jogo, como também vê que pode criar o seu próprio negócio.
Assim, ela passa a gerenciar sua própria mesa de pôquer e rapidamente seu lucro vai crescendo de uma forma que ela jamais imaginou. Até que, um dia, é presa e investigada pelo FBI por suspeita de organizar eventos ilegais além de ter um possível envolvimento com a máfia russa. Disposta a provar a sua inocência, mesmo sem dinheiro (já que sua fortuna foi confiscada), Molly pede ajuda ao advogado Charlie Jaffey (Idris Elba) para livrá-las das acusações e, por tabela, de um longo período atrás das grades.
A principal qualidade de “A Grande Jogada” é o que tornou Sorkin conhecido em Hollywood: seu roteiro. O texto conta, com riqueza de detalhes, os pormenores do pôquer, os nomes das principais jogadas, o perfil de cada tipo de jogador, os efeitos causados por uma aposta bem sucedida (e a má também), enfim. Todos os elementos que fazem muita gente pelo mundo se dedicar a esse tipo de jogo que seduz, mas também pode arruinar a vida de uma pessoa. Tudo num ritmo intenso que chega a lembrar, em alguns momentos, o ótimo (e superior) “Cassino”, de Martin Scorsese. Além disso, o diretor-roteirista constrói bem a narrativa, contada fora de ordem cronológica e sempre narrada em off pela protagonista, num vai-e-vem de passado e presente que não chega a incomodar nem a confundir o espectador.
“A Grande Jogada” também mantém o interesse pela boa construção de seus personagens. Molly sempre é mostrada como uma mulher que, apesar dos excessos que acaba cometendo, como o vício em drogas (que aparece de forma superficial), consegue manter o controle sobre sua vida, nunca misturando negócios ao prazer.  O advogado vivido por Elba também é curioso por se mostrar, inicialmente, cético em relação a ela e vai mudando lentamente sua opinião em relação à “Princesa do Pôquer”, a ponto de se esforçar mais pela sua cliente no tribunal. Os jogadores também não são jogados na trama de qualquer jeito e alguns deles mostram facetas mais humanas, embora tenham morais questionáveis, como o Jogador X (que seria, na verdade, alguém que ficou famoso ao interpretar um famoso herói escalador de paredes), ou um outro, vivido por Harlan Eustice, que literalmente perde a cabeça ao cair num blefe.
O que, talvez, seja o ponto fraco do filme é a problemática relação entre Molly e seu pai, Larry (Kevin Costner), que não guarda grandes surpresas e, por isso, se mostra meio óbvia para entender por que a ex-esquiadora olímpica se enveredou por este mundo, como se quisesse provocá-lo depois de anos de conflitos. Esta parte da trama parece fazer parte de um outro filme diferente do que está sendo mostrado e não alcança a emoção necessária para criar alguma empatia do espectador, apesar do esforço dos atores. Talvez por Sorkin ainda não saber, como diretor, como desenvolver melhor dramas familiares.
Com mais uma ótima performance em sua carreira, Jessica Chastain (que foi sugerida pela própria Molly Bloom para interpretá-la) domina o filme com seu carisma e sua beleza estonteante. Ela torna críveis as questões da personagem e já conquista a todos com um tom irônico que coloca em sua narração em off que introduz a história (com direito a uma divertida piada sobre os brasileiros e o futebol) e prova que é uma das melhores atrizes da atualidade. Idris Elba também chama a atenção como o advogado classudo que só mostra insegurança em relação ao modo que educa a filha adolescente, fã de Molly. Kevin Costner não se sai mal como o pai durão da protagonista e tem, pelo menos, um bom momento em cena, quase no final. Michael Cera faz um pouco de mais do mesmo, mas pelo menos deixa de lado o jeito desligado que costuma fazer em seus personagens para deixar o Jogador X uma pessoa sonsa, que cai bem para o papel.
“A Grande Jogada” é um bom começo para Aaron Sorkin na direção, embora ele ainda seja mais craque como roteirista. Tanto que o texto para este filme foi indicado ao Oscar 2018, nesta categoria. Mas a produção possui bem mais qualidades do que defeitos, o que o torna uma obra bem realizada, mesmo não sendo inesquecível. Será que Sorkin é capaz de fazer um trabalho ainda melhor como cineasta em breve? Façam suas apostas.
Filme: A Grande Jogada (Molly’s Game)
Direção: Aaron Sorkin
Elenco: Jessica Chastain, Idris Elba, Kevin Costner
Gênero: Drama
País: EUA
Ano de produção: 2017
Distribuidora: Diamond Films
Duração: 2h 20 min
Classificação: 14 anos

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