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“Homem-Aranha: De Volta ao Lar” prova que dá, sim, para fazer um bom reboot

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Uma das principais criações vindas da cabeça brilhante de Stan Lee (ao lado do desenhista Steve Dikto, vale lembrar), o Homem-Aranha é realmente um fenômeno nos quadrinhos e em outras mídias, cuja popularidade não mostra sinais de cansaço. Em apenas 15 anos, o personagem ganhou três releituras diferentes para o cinema. A primeira resultou numa trilogia comandada por Sam Raimi, que rendeu dois bons capítulos e um desfecho com muitos equívocos (embora seja o que mais arrecadou nas bilheterias). A segunda procurou “modernizar” o personagem, deixando-o mais descolado e menos abobalhado. No entanto, os dois filmes dirigidos por Marc Webb não conseguiram obter o resultado esperado, tanto de crítica quanto de público. E a terceira veio de um acordo entre a Sony Pictures, detentora dos direitos do herói, e a Marvel Studios, que tinha planos de usá-lo em “Capitão América: Guerra Civil”, que adapta uma das sagas recentes mais amadas entre os fãs de quadrinhos e na qual o personagem é uma peça essencial da história.

Com o ótimo resultado obtido com essa nova versão, a curiosidade de ver o teioso num filme solo, agora com o dedo da Marvel Studios, cresceu consideravelmente e deixou também muita gente desconfiada de que algo poderia não dar certo. Felizmente, boa parte dos temores foram infundados, porque “Homem-Aranha: De Volta ao Lar” (“Spiderman: Homecoming”, 2017) entrega tudo o que os fãs queriam ver do Amigão da Vizinhança há muito tempo: uma história bem contada, com muito bom humor, bom ritmo e a sensação de que, após um pouco mais de duas horas, a diversão ficou garantida, com o Cabeça de Teia agora fazendo parte de algo realmente muito maior.

Ambientada alguns meses depois dos acontecimentos de “Capitão América: Guerra Civil”, a trama mostra que Peter Parker (Tom Holland) voltou para o colégio, onde é tratado como um Zé Ninguém, sempre acompanhado do único amigo Ned (Jacob Batalon). Enquanto espera ser chamado novamente para a ação por Tony Stark (Robert Downey Jr), Peter passa o tempo estudando, suspirando pela colega Liz (Laura Harrier) pelos corredores e, é claro, fazendo o possível para ajudar as pessoas e, ao mesmo tempo, aprendendo a lidar com seu sofisticado traje que foi dado pelo alter-ego do Homem de Ferro.

Os problemas começam quando ele descobre um esquema de venda de armas feitas a partir de tecnologia alienígena de uma maneira ilegal por uma quadrilha liderada por Adrian Toomes (Michael Keaton), que se torna o Abutre depois de criar um traje especial para realizar seus crimes. Empenhado em mostrar a Stark que está pronto para desafios maiores, Peter acaba se metendo no caminho de Toomes para impedir que ele concretize seus planos.

O que torna “Homem-Aranha: De Volta ao Lar” um filme bem superior às três últimas produções estreladas pelo personagem é que a Sony/Marvel se preocupou em desenvolver muito bem o seu protagonista sem repetir tudo aquilo que já foi visto anteriormente. Assim, não há recriações do momento em que Peter é picado pela aranha que lhe deu poderes ou lembranças sobre a morte do Tio Ben, elemento importante para a formação do herói, mas que poderia se tornar supérfluo para a narrativa. Espertamente, o roteiro escrito pelo diretor Jon Watts, junto com Jonathan Goldstein, John Francis Daley, Christopher Ford, Chris McKenna e Erik Sommers faz rápidas referências à gênese de Peter e se preocupa muito mais em desenvolvê-lo em sua trajetória para o amadurecimento (sempre de forma bem divertida, mas sem soar exagerada).

Falando no humor, ele vem de várias pessoas, não só de Peter. Especialmente do amigo Ned, que funciona muito bem como o parceiro fiel do teioso, tanto em suas questões heroicas, como também em seus conflitos sociais na escola, como num típico filme de John Hughes (cujo maior hit, “Curtindo a Vida Adoidado”, é homenageado em uma cena). Assim, o espectador se vê torcendo tanto por Peter quanto por seu alter-ego (e por Ned também, por tabela), para que ele se dê bem no fim das contas. Afinal, o que o tornou tão popular foi ele ter características que o fazem ser bastante humano, criando uma identidade instantânea com o público.

Essa humanidade também é sentida no principal vilão do filme, já que o Abutre, ao contrário de outros antagonistas dos filmes da Marvel, não se resume a um louco de pedra que só quer destruir ou conquistar o mundo. Adrian Toomes é mostrado como um homem que apenas quer garantir o pão nosso de cada dia, mesmo que de uma maneira ilegal e nada convencional. Só por essa diferenciação, o Abutre acaba se tornando o melhor vilão que surgiu no Universo Cinematográfico da Marvel desde o Loki de “Thor”. Ajuda também o fato de que Michael Keaton, de volta ao mundo dos quadrinhos no cinema quase 30 anos depois de encarnar o Batman do Tim Burton, agarre o papel com unhas (ou seriam garras?) e dentes para interpretar o personagem com vigor e muita presença, tornando-se, sem sombras de dúvida, um dos destaques do elenco.

No entanto, o filme derrapa justamente na escalação de alguns atores para papéis importantes e que acabam desperdiçados, como Logan Marshall-Green, que foi visto com destaque em “Prometheus” e aqui faz praticamente uma ponta como um dos capangas do Abutre. Mas a maior estranheza é ver Flash Thompson, conhecido nos quadrinhos por ser um dos principais atletas do colégio onde Peter estuda e que adora implicar com o rapaz, ser representado pelo franzino Tony Revolori, de “O Grande Hotel Budapeste”. Apesar de atuar bem, o espectador não compra a ideia de que ele é capaz de intimidar seus colegas, como Peter e Ned.

Outro problema reside nos efeitos especiais, que nem sempre tornam convincentes os movimentos acrobáticos do Aracnídeo. Mesmo o bastante criticado “O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro” foi bem mais eficiente em criar as sequências em que o herói aparece balançando pelas ruas com suas teias. Aqui, alguns momentos parecem tão cartunescos que mesmo um espectador mais distraído percebe a versão digital do protagonista, o que cria um certo distanciamento do público nas cenas de ação. Aliás, elas também revelam que Watts, embora se mostre um bom diretor de atores, não consegue torná-las mais empolgantes ou memoráveis, apenas corretas. Talvez melhore nas (prováveis) sequências que deve dirigir nos próximos anos.

Mas se há algo que funciona 100% e que é o verdadeiro motivo para “De Volta ao Lar” ser muito bem sucedido é a ótima atuação de Tom Holland como Peter Parker e o aracnídeo mais querido do mundo. O ator convence ao dar um ar ansioso, típico de um adolescente, para o protagonista que só deseja provar o seu valor para todos, mesmo que nem sempre tome a decisão correta. Holland também torna crível a bravura do personagem, que mesmo diante de algumas adversidades não desiste de lutar pelo que acredita.

No elenco, além de Holland, Keaton e também Jacob Batalon, muito divertido como Ned, chama a atenção da participação de Marisa Tomei como a Tia May, que demonstra sinceridade ao se preocupar com o comportamento suspeito que o sobrinho toma após fazer parte do “estágio” promovido por Tony Stark. A propósito, Robert Downey Jr continua mostrando que a melhor decisão que a Marvel Studios tomou foi contratá-lo para ser o Homem de Ferro nos cinemas. Transbordando carisma, o astro prova que ainda é muito relevante para o Universo Cinematográfico Marvel e que (se quiser, claro), deveria continuar como o ferroso por muitos anos.

Jon Favreau ganha aqui bem mais espaço como Happy Hogan, o fiel escudeiro de Stark, e faz rir com os momentos em que mostra sua rabugice para Peter. As jovens Laura Harrier, como Liz, e a diva teen Zendaya, como Michelle, estão apenas corretas como suas personagens. Vale destacar também a participação mais que especial de Jennifer Connelly, que lembra bastante o que Scarlett Johanson fez no sensacional “Ela”, de Spike Jonze. Contar mais tira um pouco da graça.

Embora alguns fãs mais tradicionalistas possam não gostar do uniforme altamente tecnológico usado por Peter e feito por Stark, “Homem-Aranha: De Volta ao Lar” tem o suficiente para deixar todos com um belo sorriso no rosto ao final da projeção (aliás, não saia antes do final dos créditos por causa de duas cenas extras – a segunda é muito bem bolada). O retorno do Cabeça de Teia ao braço cinematográfico da Casa das Ideias foi realmente muito bem pensado e realizado, e dá vontade de ver mais aventuras logo, logo. Quem sabe, num futuro não muito distante, o mesmo aconteça com o Quarteto Fantástico?

Filme: Homem-Aranha: De Volta ao Lar (Spiderman: Homecoming)
Direção: Jon Watts
Elenco: Tom Holland, Michael Keaton, Jon Favreau, Marisa Tomei e Robert Downey Jr
Gênero: Ação e Aventura
País: EUA
Ano de produção: 2017
Distribuidora: Sony Pictures/Marvel Studios
Duração: 2h 13 min
Classificação: Livre

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