Temos que admitir que o diretor Felipe Bragança, em seu primeiro filme solo após muitas co-participações em direção e roteiro, parece demonstrar uma interessante ambição artística em Não Devore Meu Coração. Talvez o ímpeto seja mais louvável que o que resulta dele. Mas cinema também é isso. Partindo das questões que motivaram a Guerra do Paraguai, o que respinga até hoje pelas fronteiras entre Brasil e o Paraguai, a história é construída pelo ponto de vista de Joca (Eduardo Macedo) que vive a efervescência dos conflitos entre brasileiros e guaranis numa isolada região fronteiriça do Mato Grosso do Sul, com forte representação dramática do rio Apa.
Ele se apaixona pela índia Basano (Adeli Gonzales), num amor impossível que reflete cisões ancestrais. Além de ter que lidar com esse conflito interno e desmedido, ainda está sob o julgo de uma família disfuncional, ainda mais pela figura marginal do irmão, o motoqueiro Fernando (Cauã Reymond), onde o enxerga como protetor e ameaçador.
A visão de Joca se paraleliza pelas tramas dele e do irmão, sempre metido nas confusões de sua gangue de motos, numa relação quase messiânica com o líder do bando. O diretor usa seus personagens para traçar um panorama de como esse antagonismo gerido lá trás, ainda move as razões dos indivíduos que gravitam aquela região. Mas o faz com boa dose de lirismo, numa diapasão ao sobrenatural indígena que ronda aqueles personagens, o que aliás cruzará os destinos dos dois personagens em algum momento.
Trabalhar a urgência geográfica e ilustrar sua vulnerabilidade de maneira lúdica é um recurso interessante, mas delicado. Em algum momento essas vertentes não se aglutinam de maneira fluente e a trama se revela menos estimulante que o aparente entusiasmo de Bragança em contá-la. Parece que ele domina mais a forma que o conceito, e o que domina faz bem (o filme tem boas ideias). É o tipo de diretor para se prestar atenção. Afinal, até a ambição se amadurece…
Filme: Não Devore Meu Coração
Direção: Felipe Bragança
Elenco: Eduardo Macedo, Adeli Gonzales, Cauã Reymond,
Gênero: Drama
País: Brasil
Ano de produção: 2017
Distribuidora: Fênix Filmes
Duração: 1h 46 min
Classificação: 14 anos
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