Com apenas uma década de existência, a Marvel Studios conseguiu ultrapassar a concorrência (até mesmo de outras empresas que trabalharam com alguns personagens do mesmo universo dos quadrinhos) e se estabeleceu como uma verdadeira potência cinematográfica quando o assunto é adaptar super-heróis para a telona. Mesmo com várias críticas a respeito de seu modo de trabalho ou da insistência em apelar para uma mesma fórmula, a verdade é que seus filmes sempre são esperados com a maior expectativa, mesmo sob o risco de ela não ser totalmente cumprida.
Mas felizmente o estúdio inicia o ano de 2018 mostrando sinais de que não está acomodado em seu sucesso e se permite ousar (ainda que não saindo totalmente da zona de conforto), lançando um filme que dialoga não só com os fãs de quadrinhos mas também com aqueles que procuram histórias mais relevantes, que tratem de questões que acontecem no mundo atual. Por isso, é um alívio ver que, no meio de tiros, explosões e muitas cenas de ação, “Pantera Negra” (“Black Panther”, 2018) tem algo a mais para dizer do que o trivial da maioria dos blockbusters. Com um roteiro esperto, um visual incrível e um elenco sensacional, o longa se revela uma experiência e tanto e certamente ficará por muito tempo na memória do espectador.
Ambientada pouco depois dos eventos ocorridos em “Capitão América: Guerra Civil”, a trama mostra o retorno do príncipe T’Challa (Chadwick Boseman) ao seu país natal, Wakanda, para assumir o trono após a morte de seu pai, T’Chaka (John Kani). Enquanto é preparado para liderar seu povo, ele fica sabendo do ressurgimento de Ulysses Klaue (Andy Serkis), velho inimigo dos wakadianos por causa de seu desejo de extrair o Vibranium (material raro que existe em abundância no país e que foi usado, por exemplo, no escudo do Capitão América) e decide detê-lo. Mas o que T’Challa não contava é com o surgimento de Erik Killmonger (Michael B. Jordan), um perigoso e misterioso terrorista que se tornou parceiro de Klaue e também tem planos para Wakanda. Assim, o Pantera Negra precisa descobrir se pode ser um bom rei e se pode deter essa nova ameaça.
O que torna “Pantera Negra” um filme mais que interessante está no incrível visual criado pela equipe técnica para tornar a fictícia Wakanda num país plausível. O design de produção é bastante criativo ao mostrar a nação africana que abraça a tecnologia (gerada pelo Vibranium), ao mesmo tempo que não abandona as tradições. Basta reparar no formato das naves reais, que lembram uma máscara tribal. O universo que surge desta fusão é bem mais interessante, por exemplo, do que a Asgard mostrada nos filmes do Thor. Os figurinos, assinados por Ruth E. Carter, também são bastante felizes ao utilizar adornos típicos da África com elementos de determinados animais, que são os símbolos de cada tribo, de forma respeitosa e de bom gosto, nunca parecendo exagerado ou para fazer graça, como aconteceu em “Um Príncipe em Nova York”, uma das comédias mais famosas de Eddie Murphy.
Além disso, o roteiro assinado pelo diretor Ryan Coogler (ao lado de Joe Robert Cole) é bem mais sóbrio do que os que têm sido feitos em filmes do estilo, tratando de temas que geralmente não são abordados em blockbusters como geopolítica, terrorismo (utilizar uma alegoria do Boko Haram, grupo conhecido por sequestrar mulheres jovens para doutriná-las foi um grande achado), racismo, representatividade, entre outros. Tudo dentro do formato criado pela Marvel de forma compreensível para o grande público, sem soar didático ou pedante, e que leva à reflexão. O texto também privilegia a construção dos personagens, especialmente o vilão, tornando-os mais tridimensionais, com fraquezas e questionamentos que os torna bem mais cativantes.
A direção de Coogler (responsável também pelos ótimos “Fruitvale Station: A Última Parada” e “Creed: Nascido para lutar”) é muito boa, apesar de não conseguir se livrar de algumas conveniências de filmes de ação. Alguns de seus trunfos residem na uma cena de luta realizada em plano sequência (ou editada para parecer uma) e no confronto final. Mas o que merece destaque é como ele conduz seus atores nas cenas dramáticas e dá o toque certo para as que precisam ser bem humoradas, já que uma das principais reclamações dos detratores dos filmes da Marvel, o excesso de piadas, não acontece aqui. Há humor no filme, com certeza. Porém, ele é feito na medida certa e não destoa do tom mais sério que se buscou alcançar.
Outra grande qualidade de “Pantera Negra” está em seu impecável elenco, no qual ninguém destoa negativamente (embora Andy Serkis exagere um pouco com suas caras e bocas, mesmo fazendo um bom vilão). À frente de um verdadeiro “Dream Team”, Chadwick Boseman volta a mostrar seu talento e carisma como o protagonista, mas tem a oportunidade de trabalhar outras facetas de seu personagem, como suas incertezas se consegue ser um bom rei para Wakanda. Lupita Nyong’o se sai bem como Makia, interesse amoroso de T’Challa, mas que não está na história apenas para fazer par com o herói (os dois mostram bastante química na tela). Ela mostra personalidade e uma honesta vontade de ajudar as pessoas sem precisar da ajuda de ninguém.
A atriz Letitia Wright, que vive Shuri, irmã do Pantera Negra e responsável pelos aparatos tecnológicos do monarca (como se fosse uma versão feminina de Q, personagem constante dos filmes de James Bond), também se destaca pela sua simpatia e chama a atenção sempre que surge na história. Outra que também merece destaque é Danai Guirra (a Michonne da série “The Walking Dead”), interpretando Okoyo, uma das principais integrantes das Dora Milaje, a guarda real de Wakanda. Ela se sai bem nas cenas de luta, com bastante vigor, mas também durante seus questionamentos éticos. Entre os homens, vale a participação de Winston Duke, que dá muita fisicalidade e um humor irresistível a M’Baku, líder de uma tribo rival.
Mas o principal destaque do elenco (que inclui também Forrest Whitaker, Angela Bassett e Daniel Kaluuya, de “Corra!”, todos competentes em seus papéis) é mesmo Michael B. Jordan, em sua terceira parceria com Ryan Coogler. Ele torna Erik Kilmonger um personagem fascinante e ao mesmo tempo para se temer com sua fúria e obstinação para conseguir o que quer, além de ter motivos muitos mais plausíveis para as suas ações do que a maioria dos vilões da Marvel, tornando-o tão marcante quanto o Loki de Tom Hiddleston, ou o Abutre de Michael Keaton (visto em “Homem-Aranha: De Volta ao Lar”). Algumas pessoas que virem o filme, certamente, refletirão sobre as questões que ele levanta, graças ao talento do ator.
Embora seja o filme mais longo da Marvel Studios até hoje (com 2 horas e 14 minutos de duração), “Pantera Negra” nunca cansa graças ao encanto que ele proporciona e isso é um grande mérito. Se há uma coisa a dizer contra o filme está em seus efeitos especiais, que são inconstantes. Algumas sequências são muito bem construídas, como a da perseguição de carros na Coreia do Sul, enquanto outras pecam pela artificialidade de sua computação gráfica, que pode causar um estranhamento por parte do público. Mas esse é um pecado menor, que é compensado pelas suas outras grandes qualidades. Longa vida ao Pantera Negra!!!!
Ah, sim!!! O filme tem duas boas cenas pós-créditos.
Filme: Pantera Negra (Black Panther)
Direção: Ryan Coogler
Elenco: Chadwick Boseman, Lupita Nyong’o, Michael B. Jordan
Gênero: Aventura
País: EUA
Ano de produção: 2018
Distribuidora: Disney/Marvel
Duração: 2h 14 min
Classificação: 14 anos
Simplesmente um filme incrível! Ótimos personagens, uma boa construção de mundo, figurinos lindíssimos e uma trama bem acertada. Eu achei um dos melhores filmes do ano. É como você ressaltou na crítica, bem mais do que estes filmes de super-herói que são apenas cheios de ação e efeitos especiais. Este tem uma ótima história que nos prende do início ao final. Não vejo a hora de ver o segundo filme.