Com uma longa carreira no cinema, onde tem mais acertos do que erros, Roman Polanski ainda é um nome forte entre os cinéfilos. Embora não faça tantos filmes nos últimos anos quanto deveria ou poderia, ainda mais por causa dos problemas causados por uma acusação e condenação de estupro de uma menor em 1977, que o impede de ir aos Estados Unidos e que culminou com a sua prisão domiciliar em 2009 na Suíça (que durou um ano), Polanski mantém o status de grande cineasta, cujas obras são sempre aguardadas tanto pela imprensa especializada quanto pelo público.
Seu mais recente trabalho, felizmente, mantém a boa qualidade que apresenta desde que realizou, em 2002, “O Pianista” (que lhe deu vários prêmios, inclusive o Oscar daquele ano). Com “A Pele de Vênus” (“La Vénus à la fourrure”, 2013), Polanski volta a encantar e a instigar o espectador com sua direção firme e consistente, que mostra todo o seu domínio como todo um bom contador de histórias deve ter.
Ambientada numa tarde chuvosa em Paris, a trama se passa dentro de um teatro, onde acontecem testes para uma versão da peça “A Pele de Vênus” de Sacher Masoch, escrita e dirigida por Thomas (Mathieu Amalric). Prestes a sair do teatro após o fim das audições, ele é surpreendido pela chegada de Vanda (Emmanuelle Seigner), uma atriz insistente e, aparentemente, pouco culta, que deseja muito ganhar o papel principal. Após muitos pedidos, Thomas aceita avaliar a atuação de Vanda, que acaba usando não só o seu talento dramático, mas também seu poder de sedução para impressioná-lo. Aos poucos, os dois acabam num verdadeiro jogo de cena, onde revelações sobre suas personalidades são reveladas e realidade e ficção se misturam, trazendo impressionantes consequências tanto para o erudito autor quanto para a bela candidata.
Com o total domínio sobre os elementos que tem em suas mãos, Polanski realiza um pequeno grande filme, que trata de questões universais, como a relação entre homens e mulheres, que gera, aqui, uma verdadeira guerra dos sexos. Mesmo com um elenco reduzido a apenas dois atores e nunca escondendo a forma teatral que escolheu para conduzir a sua narrativa, com diálogos longos e muita verborragia, o diretor cria uma dinâmica não menos do que atraente, onde até o humor tem espaço, mas é a constante tensão entre Thomas e Vanda que mantém o interesse.
O roteiro, escrito pelo cineasta e David Ives (que criou a peça que inspirou o filme) também é bastante feliz ao fazer com que as camadas internas de seus personagens sejam mostradas gradativamente, reservando algumas surpresas que deixam o espectador ainda mais interessado com o que acontece na telona. O que pode desagradar alguns, no entanto, é que o excesso de falatório pode cansar quem não for acostumado com esse tipo de proposta. Mas quem não se importa com isso certamente ficará bastante satisfeito.
Esposa e atual musa de Polanski, Emmanuelle Seigner tem aqui a melhor interpretação de sua carreira. Quando o filme começa, ela parece não ter entendido a proposta do filme e surge com uma atuação alguns tons acima, como em outras produções do marido, como “Busca Frentética” e “Lua de Fel”. Mas quando as coisas começam a esquentar, percebe-se que, na verdade, tudo fez parte sua estratégia para seduzir e envolver, tanto Thomas quanto o público de uma maneira realmente arrebatadora.
Mathieu Amalric, mais conhecido por protagonizar “O Escafandro e a Borboleta” e como o vilão de “007 – Quantum of Solace”, também não fica atrás e impressiona ao construir Thomas como um homem que tenta impor a sua vontade, embora seja subjugado tanto por seus traumas do passado quanto pela bela atriz que está diante de seus olhos.
Com “A Pele de Vênus”, Polanski prova mais uma vez que é um diretor como poucos no cinema atual e que a sétima arte tem muito a ganhar com suas obras que realmente têm algo a dizer. Ao final da projeção, o impacto é tão intenso que o espectador sai com várias reflexões na cabeça, o que é bastante positivo, especialmente num trabalho que comprova aquela máxima de que menos é mais. Vale muito a pena conferir.
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