O principal problema quando surgem refilmagens de produções que deram certo no passado é, obviamente, a comparação com sua obra original. Alguns diretores e roteiristas buscam encontrar novos caminhos para tornar sua nova versão de uma história antiga algo relevante nos dias atuais, que justifique a sua existência. A questão se complica mais quando se trata de refilmar clássicos do terror ou do suspense. Já houve alguns acertos, como “Madrugada dos Mortos”, que tornou conhecido o nome de Zack Snyder. Mas geralmente há completos desastres, como os remakes de “Psicose”, comandado sem nenhuma alma por Gus Van Sant, ou a fraca releitura de “A Hora do Pesadelo”, lançada em 2010. Já o remake de “Carrie, a estranha” (“Carrie”) fica no meio termo.
A trama, adaptada do primeiro grande sucesso do escritor Stephen King, é bastante conhecida do grande público, mas não custa nada relembrar: Carrie White (Chloë Grace Moretz) é uma menina tímida e retraída que vive sendo maltratada pelos colegas da escola e sofre nas mãos da mãe, Margaret (Julianne Moore), uma fanática religiosa. Mas Carrie, aos poucos, descobre que não é tão frágil assim e é capaz de fazer coisas que os outros não conseguem, como mover coisas e até pessoas com o poder da sua mente, graças à sua telecinesia. As coisas se complicam quando a bela Sue Snell (Gabriella Wilde), para compensar os maus tratos aplicados a Carrie, convence o namorado Tommy Ross (Ansel Elgort) a levar a garota ao baile de formatura do colégio. Só que, vítima de mais uma humilhação durante a festa, Carrie descarrega toda a sua raiva e frustração contra todos com seus poderes de uma maneira devastadora.
O roteiro do novo “Carrie, a estranha” foi escrito por Lawrence D. Cohen (roteirista do filme original) e Roberto Aguirre-Sacasa, que apenas atualiza a trama mostrada em 1976 por Brian De Palma, enfatizando questões que estão em voga nos dias de hoje, como “bullying” nas escolas e a importância da internet na vida dos jovens, além de colocar mais questões sexuais de alguns personagens, flertando até com a questão da gravidez na adolescência. Mas o texto é pouco ousado, assim como a direção de Kimberly Pierce (de “Meninos Não Choram”), que não é muito feliz em criar um bom suspense e se mostra bastante inferior se compararmos seu trabalho com aquele realizado pelo cineasta de “Vestida Para Matar” e “Os Intocáveis”. A cena que mostra o nascimento de Carrie é inverossímil (embora seja levemente citada no livro), o que causa um certo desconforto para o espectador, que pode achar que o filme é ruim de ponta a ponta, o que não é verdade. Apenas na sequência em que Carrie está indo para o baile com Tommy e precisa impedir que a mãe a atrapalhe é que a diretora é bem sucedida.
Outros problemas em “Carrie, a estranha” estão na sua edição, que peca até em questões básicas como numa cena de Sue e Tommy conversando. Mas o pior deles está na continuidade, especialmente quanto ao penteado da protagonista. Numa sequência, Carrie aparece com os cabelos mal tratados num corredor da escola. Mas logo em seguida, ao entrar numa biblioteca, eles já estão escovados, como se ela já está pronta para sair, o que fica estranho, já que a intenção era mostrá-la como uma pessoa descuidada e isolada do mundo. Os efeitos especiais são competentes, mas nada espetaculares, embora se destaquem na cena em que Carrie para um carro com o poder da mente.
Mas o que realmente vale a pena nesta refilmagem são as interpretações das protagonistas, que conseguem dar humanidade às suas atuações. Chloë Grace Moretz mostra, mais uma vez, porque é uma das jovens atrizes mais interessantes dos últimos anos. Ela mostra doçura e, ao mesmo tempo, firmeza nas doses certas para a composição de sua Carrie, com uma performance bem diferente da Hit Girl dos dois filmes da série “Kick-Ass”, não ficando nada a dever a Sissy Spacek, que fez a personagem no filme de De Palma. Porém, quem realmente arrebenta é Julianne Moore, que está magnífica e completamente enlouquecida como Margaret White, ficando tão boa quanto Piper Laurie, da produção de 1976. As cenas em que a mãe se autoflagela são bastante tensas, principalmente por causa da atuação da ótima atriz, que poderia até ser lembrada em indicações para prêmios importantes, como o Globo de Ouro e o Oscar. O resto do elenco (incluindo Judy Greer, como a professora de Educação Física, Senhorita Desjardin) vai de regular a fraco.
A nova versão de “Carrie, a estranha” serve apenas para quem não conhece o filme de Brian De Palma e só quer levar alguns (poucos) sustos numa sessão da tarde no cinema. Mas os que quiserem realmente se assustar, é melhor procurar na locadora (ou na internet) o original, que ainda preserva algumas de suas qualidades como obra de terror e suspense.
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