George VI foi um rei fora dos padrões. Filho de George V, não era o primeiro da linha sucessória, já que era o caçula, mas acabou herdando a coroa de seu irmão Edward que renunciou e não tinha herdeiros. Daí, Albert Frederick Arthur George assumiu o trono da Grã Bretanha, mas isso acarretou alguns problemas. Albert não tinha sido preparado para governar, era tímido, inseguro e ainda por cima gago, o que lhe trouxe uma série de situações embaraçosas. O peso da coroa foi tamanho que contribuiu para sua morte em 1952 com apenas 57 anos, vitima de um câncer de pulmão (fumava compulsivamente) agravado pelo forte estresse.
A família Real britânica sempre rendeu filmes, desde Henrique VIII até a Rainha Elizabeth II (A Rainha, de 2007), e O Discurso do Rei (The King’s Speech E.U.A/ Austrália/ GB 2010) é a mais recente transposição para as telas de um episódio pitoresco da realeza britânica. Dirigido pelo britânico Tom Hooper, o longa, que é o campeão de indicações ao Oscar desse ano, enfoca o drama trazido pela dificuldade fonológica do rei, que já o incomodava seriamente antes mesmo de assumir o trono. O filme é baseado no livro homônimo escrito por Mark Logue, neto de Lionel Logue, o fonoaudiólogo australiano incumbido da árdua tarefa de amenizar a gagueira do rei para discursos públicos. Por ter guardado todos os diários e fichas médicas do avô, Mark teve a sua disposição um rico material de pesquisa para a composição do livro.
Colin Firth, indicado para o Oscar de melhor ator, encarna George VI com maestria. No tom exato, ele reproduz a personalidade insegurança e ao mesmo tempo temperamental de Bertie (como era chamado em família), passa para o espectador a agonia causada pelo sério problema de gagueira, fazendo com que muitas vezes nos sintamos na pele do monarca. Se Helen Mirren interpretou a Rainha Elizabeth II, que vem a ser filha de George, majestosamente em um filme que ficou na história mais por sua atuação do que por outros aspectos, Firth só não faz o mesmo porque a forma como é contada a história não fica abaixo de seu desempenho. O roteiro de David Seidler (que escreveu animações como O rei e Eu e Quest for Camelot) é enxuto, não se notam aquelas gordurinhas que muitas vezes atrapalham as adaptações de livros para as telas, sobretudo quando se trata de personagens reais. O resultado é um filme de “apenas duas horas de duração”, não muito para uma cinebiografia oscarizável.
Geoffrey Rush é a grata surpresa do filme. Depois de receber o Oscar por Shine em 1997, Rush passou por um período irregular na carreira, mas fez as pazes com a atuação de alto nível com seu Lionel Logue magistral. Em cada cena em que está presente dá um verdadeiro show de atuação, não seria absurdo se a mais que merecida indicação ao prêmio de melhor ator se revertesse em vitória. Logue esteve com George durante toda sua vida após assumir o trono atuando como speech coach inclusive nos discursos de natal e a química entre Rush e Firth funciona muito bem. Helena Boham Carter também tem forte presença em cena. Concorrendo pelo prêmio de melhor atriz coadjuvante, a britânica interpreta a esposa de Albert, Elizabeth I também conhecida posteriormente como a Rainha Mãe, sua atuação não é menos brilhante e compõe um belo triunvirato de atuação com Firth e Rush.
A imponente fotografia de Danny Cohen, que também filmou o ao vivo no Apollo Theater do Artic Monkeys dá contornos ainda mais expressivos às atuações e com uma temperatura de cor quase neutra dá um tom documental histórico à película e aliado á direção de arte igualmente primorosa, forma um dos grandes trunfos do filme.
O Discurso do Rei é sem dúvida um filme de Oscar, no bom sentido, é aquele filme que traz ao espectador o deleite de apreciar um elenco de peso em boas atuações, roteiro bem desenvolvido, direção precisa e parte técnica irretocável. Para sorte dos cinéfilos a briga pelo prêmio da Academia desse ano está em um nível muito acima do ano passado, dos dez que concorrem pelo menos sete merecem estar ali e O Discurso do Rei configura entre eles com louvor
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