Thor – Scifi com fantasia?

Thor é o quarto filme produzido pela Marvel Studios, depois dos dois Homem de Ferro e do “novo” Hulk, juntos eles contam uma história que culminará no longa “Vingadores” dirigido por Joss Whedon e que será lançado no meio de 2012.

Thor (Chris Hemsworth) conta a saga do príncipe dos Asgardianos, uma raça de seres super-poderosos que vivem no espaço distante. O protagonista é um forte guerreiro que não está preparado para assumir o trono de seu pai, Odin (Antony Hopkins), por causa de seu temperamento afobado e violento. Depois de uma fracassada tentativa de roubar a Caixa dos Antigos Invernos por parte dos gigantes de gelo (os imortais inimigos de Asgard), Thor parte para invadir o planeta (Jotunheim) destes ladrões sem o consentimento do Rei.

Nesta pequena jornada de Vingança ele é acompanhado por seus três bravos amigos guerreiros, Lady Sif (Jamie Alexander) e Loki (Tom Hiddleston), seu irmão. O Rei de Asgard, Odin, havia feito um pacto de não-agressão com o atual Rei dos Gigantes, Laufey, que resultou em longos séculos de paz para ambos os povos. Com a invasão de Thor, os termos do pacto são rompidos, forçando Odin a recomeçar uma guerra que havia sido muito dolorosa no passado.

Desapontado com o filho, Odin decide banir Thor para a Terra (ou midgard) retirando-lhe todos os seus poderes até que ele se prove mais uma vez digno de sua herança como asgardiano. Na terra Thor conhece a bela astrofísica Jane Foster (Natalie Portman), e na busca por seu martelo, agora sob o poder da organização Shield,  ele começa a aprender os valores que seu pai queria lhe impor. Enquanto isso, em Asgard, Loki se mostra o mentor do banimento de seu irmão e um traidor de sua própria herança como Asgardiano.

Esta é uma pequena sinopse do roteiro do filme, mostrando uma história simples e capaz de facilmente agradar o público que desconhece o personagem. Infelizmente o filme peca tanto em sua execução quanto em sua tentativa de simplificar demais as coisas. Quando Kenneth Branagh foi escolhido como diretor, alguém que fez seu nome filmando obras de Shakespeare, imaginei que o filme teria o tom apropriado de fantasia arcaica, imaginando um novo e mais dramático Senhor dos Anéis da mitologia nórdica, mais ou menos como quase todas as histórias de origem de Thor e Loki nos quadrinhos. Claro que esta fantasia caiu por terra quando anunciaram que pelo menos metade do filme seria nos EUA, mas ainda sim me mantive esperançoso.

A Marvel se encontrava com um problema muito grande em Thor. Como vendê-lo ou colocá-lo no mesmo universo onde todos os heróis têm a ciência como origem (Homem de Ferro, Hulk e Capitão América)? E eles resolveram este suposto problema apostando pesadamente nas relações de Thor com a ficção científica. No filme Thor e os habitantes de Asgard são seres alienígenas muito poderosos que foram confundidos com deuses em sua passagem pela Terra no passado (o que nos leva a um dos maiores furos do filme, que abordaremos posteriormente), a ponte arco-íris se tornou um canhão que atira os asgardianos até os diferentes planetas (e não Reinos) do universo, e outras coisas semelhantes.

Esta questão dos Asgardianos como alienígenas não foi concebida agora, ela foi apresentada em momentos bem importantes do personagem nos quadrinhos (como nas fases de Simonson e de Waren Ellis), mas minha opinião pessoal é que esta é uma idéia muito ruim e bem mais difícil de engolir do que as demais versões do personagem. Gosto bem mais quando os autores ignoram estes trechos da cronologia e voltam a escrever ele como um Deus (voltando-se para os aspectos religiosos dos nórdicos e o conflito que isso traz para a fé dos demais personagens), coisa que tem sido mais predominante nas fases mais recentes do herói, como a de Straczynski e Matt Fraction. Ele também é um Deus pleno em praticamente todos os demais universos alternativos, como a linha Ultimate ou a brilhante interpretação do personagem por Gaiman em 1602.

Ainda que lembre a Asgard de Simonson, o filme do Thor passa bem longe dos modelos mais recentes da cidade.

Um dos grandes furos de roteiro do filme se dá justamente por ele ignorar que a mitologia nórdica existe no mundo. Veja bem, entendemos que o filme tinha que ser uma história de origem, mas se é para contar plenamente esta questão da primeira traição de Loki e sua descendência gigante eles tinham que situar o filme tão somente em Asgard. Nos quadrinhos quando Loki aparece pela primeira vez, ele já é um vilão e é assumido que todas as narrativas que aparecem nas Eddas (o livro onde se encontram estas narrativas mitológicas) já aconteceram há centenas de anos.

Não dá para entender no filme, como humanos viveram durante séculos seguindo esta religião, sem os Asgardianos tomarem conhecimento de nada. Na terra qualquer livro de mitologia para crianças vai mostrar que Loki na verdade é um trapaceiro filho de gigantes e, no entanto, nenhum dos deuses/alienígenas-poderosos sabe disso. Mesmo que consideremos pela história do filme, que Odin e cia. apenas tenham visitado os Vikings e os germânicos uma vez, ainda é muito estranho que eles não tenha conhecimento destas lendas (ou que elas sejam tão apuradas) mesmo porque Heimdall passava o dia todo olhando para Midgard.

No próprio filme, o núcleo humano usa um livro infantil de mitologia para entender melhor o Thor, e fiquei na esperança de ver a Jane ou o cientista falarem para o deus do trovão algo que fosse mais ou menos assim: “Mas e aí Thor? E aquele teu irmão? Ele continua tentando te matar sempre?” O que nos leva a um dos grandes problemas do roteiro, ou se conta uma história de origem ou conta sua chegada na terra. A forma com que o texto  ficou deixou a história de Thor como uma versão meio clone do Super-Homem, o alienígena ultra poderoso exilado na Terra (e isso é muito reforçado nas cenas de vôo onde ele usa sua imensa capa vermelha).

Ao tentar juntar uma história de origem com o núcleo terreno do roteiro eles tiveram que simplificar muita coisa, e no fim, o filme acabou bem mais raso do que deveria. Todo o drama familiar secreto de Loki, por exemplo, ficou meio ridículo por ser baseado em uma falha de roteiro. Ainda que o próprio Loki seja de longe o melhor personagem do filme.

Esta escolha dupla (história de origem e exílio na Terra) exige muito mais complexidade do filme, e por isso o roteiro acaba ficando mais raso. Thor passa um final de semana na terra, vivendo o paradigma do peixe fora d’água, e consegue (todos sabemos que ele consegue, isso não é spoiler) aprender a ser humilde e ao mesmo tempo se apaixonar por uma humana, um suposto imortal que viveu durante séculos resolve isto em dois dias. Tudo é muito rápido demais, e carece de melhor desenvolvimento, ainda que as cenas sejam bem mais engraçadas nesta parte do filme. Faltou um pouco mais de densidade emocional, quase não se viu o tão falando elemento “shakespeariano” pelos atores e pelo diretor.

Claro que Thor ainda consegue divertir, e alguma de suas escolhas mais questionadas parecem ser as que melhor funcionam. A parte na Terra, como já mencionei, me pareceu bem mais divertida do que todos os momentos em Asgard, que ficaram um pouco falsos em seu manto futurista. Outra questão que foi muito batida pelos fãs, mas que se provou errônea é a escolha de um ator negro (Idris Elba) para o Deus Viking Heindall, o cara rouba completamente todas as cenas em que aparece, e tenho certeza que calou a boca de seus críticos pelo seu desempenho.

As atuações em geral não comprometeram, ainda que seja importante dar um destaque para o Loki de Tom Hiddleston, que atuou de forma impecável e convincente e também para o já mencionado Idris Elba. Loki também ficou com o visual mais legal, já que as demais armaduras, inclusive a de Thor (baseada no excelente design de Coipel) ficaram um pouco artificiais, mostrando claramente o uso de plástico pintado em boa parte das peças.

Thor é um filme ruim? Não, você irá ao cinema e conseguirá se divertir, não estamos falando de nenhuma bomba como Elektra ou Quarteto Fantástico, mas não espere também ver um excelente filme de super herói como o primeiro Homem de Ferro ou o Cavaleiro das Trevas. No fim, é importante dizer que as cenas de ação são bem executadas, as piadas são divertidas em sua maioria, e o filme também tem diversas conexões legais para agradar aos fãs, como a presença do Gavião Arqueiro (Hawkeye) ou da manopla do infinito.

[xrr rating=2.5/5]

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