Pobre Sofia Coppola. Fico imaginando o quão tediosa foi sua vida de pobre menina rica em Hollywood, que muitas vezes tinha que ficar sozinha, ou acompanhar seu papai em viagens cansativas, ouvir constantemente a pergunta “como é ser filha de alguém famoso” e por aí vai. Sua infância e adolescência só pode mesmo ter sido um mar de solidão e tédio, pois esses são o tema central de TODAS as tramas de autoria da moça.
O filme que a tornou famosa, não apenas por ser filha de quem é, Encontros e Desencontros tratava – de forma belíssima -dessa questão, assim como sua Maria Antonieta mimada como uma popstar que devia ser na sua época. Em Um Lugar Qualquer (Somewhere E.U.A/2010) já estamos familiarizados com a estética da solidão de Sofia Copppola declamada em longos planos, muitas vezes sem um diálogo e uma câmera que faz questão de enquadrar o olhar perdido do personagem central, é incrível, como a cineasta consegue arrancar o mesmo olhar de atores tão distintos como Scarlett Johansson, Kirsten Dunst e agora Stephen Dorff (Garganta do Diabo e Inimigos Públicos).
Dorff é Johnny Marco, um ator ítalo americano que tem tudo o que deseja ao estalar de dedos, menos realização pessoal. Por isso sua vida é estagnada, sem utopias, tudo é corriqueiro, ordinário e sem emoção, inclusive o sexo, embora troque constantemente de parceiras. Separado, vive em um hotel caro e ocasionalmente exerce o papel de pai da menina prodígio Cléo (Elle Fanning brilhante) que traz alguns matizes coloridos para o cinza que predomina em sua rotina pessoal e profissional (paralisada por um acidente que o forçou engessar a mão). A partir daí já reconhecemos alguns elementos usados pela cineasta em filmes anteriores. A desglamourização e decadência de um astro é uma delas. Assim como o personagem de Bill Murray, astro de outrora, mas que, no ostracismo, faz anúncios de TV no Japão, ou mesmo a Maria Antonieta pop e seu vazio existencial em meio ao luxo e mimos da corte, aqui vemos Johnny, na mais perfeita tradução do que a grande indústria do entretenimento americana faz com suas celebridades: dá-lhe tudo, menos um sentido para suas vidas e o personagem, (in)consciente disso, vai, num crescendo, gritando por socorro. Um grito silencioso, por isso mesmo agonizante e aflitivo.
A passagem em que o ator vai a Itália divulgar seu filme é onde Sofia estabelece a metáfora do isolamento e dificuldade de se comunicar com o mundo (que nos lembra o Japão de Encontros), nessa viagem promocional, um desconfortável Johnny apenas muda seu cenário de um hotel na Califórnia para outro na Itália, mas com o agravante de que quase ninguém fala sua língua, a televisão é toda na língua local e, para dar ao espectador a mesma sensação de estar perdido tida pelo personagem, os diálogos em italiano não são legendados. Além de dar mais uma alfinetada no fato de que para os americanos tudo que existe além de suas fronteiras é estranho e incompreensível.
A menina Cléo é claramente o alterego de Sofia. Filha de pai famoso, talentosa, perspicaz, não é muito difícil visualizar a pequena Sofia Coppola na personagem de Elle Fanning, que rouba todas as cenas em que está presente. Cléo é patinadora artística de talento incontestável, mas sem muito reconhecimento, num contraposto do pai que apesar do sucesso tem um talento duvidoso, está mais para celeb do que para ator de talento insofismável (alfinetada em vários de Hollywood, será que também para o primo Nicholas?). No decorrer da película, vemos Cléo se tornar mais uma babá de Johnny do que o contrário, que era a proposta inicial quando é deixada pela mãe aos cuidados do pai.
Referências musicais pop também permeiam este filme, mais um marca registrada da cineasta. Atenção para as versões de Teddy Bear de Elvis Presley e You Live Only Once dos Strokes, além de outras que são tocadas em suas versões originais. Atenção também para a participação – do tipo piscou dançou – de Benicio Del Toro.
Por fim, Sofia Coppola mais uma vez fez um filme bem filmado, bem musicado, que dialoga com o (já nem tão) novo cinema de autor, mas fica aquela sensação de repetição do mesmo tema. Sugeriria a ela que seu próximo filme versasse sobre um personagem feliz, bem resolvido e sem nenhum tipo de conflito interno. Pode até dar um filme abaixo de sua média, mas só pela variação do assunto, valerá o ingresso.
[xrr rating=3/5]
Não assisti nenhum filme da Sofia ainda, mas pretendo. Gosto de temas como a solidão e utopia, mas quando são bem contados, é claro. Os filmes do Woody Allen, por exemplo, tratam constantemente desses temas, "nem sempre a vida dá certo".
Eu recomendo começar sempre com o começo da carreira dela: "Virgens Suicidas". Se tem um filme que fala de solidão e siutações que demonstram que a vida nem sempre vai ser como queremos, é esse.
Cesar vi o filme agora pouco e discordo da sua visão que dá para comparar os personagens com Lost in Translation (Encontros e Desencontros). Achei o filme bastante diferente, apesar de falar da mesma coisa. E eu prefiro a Sofia assim do que se rendendo aos filmes com final Disney. Mas tirando isso, realmente parece que a Sofia tava falando das experiências dela através da Cleo.
Pois justamente, Sal, por falar da mesma coisa que eu estabeleço a comparação, não só com o lost mas também com o Maria antonieta. É legal, claro, mas parece que ela só sabe falar sobre isso, se fizesse algo diferente seria interessante
Eu entendi o que você quiser dizer e consigo ver, mas como disse discordo na parte crítica. De qualquer modo minha visão não necessariamente é a correta, achei sua crítica bem legal.
Não vi o filme ainda, mas a Sofia já deixou bem claro que está sempre contando a sua história através de seus filmes, mesmo quando baseados em livros e personagens históricos. Então é claro que num roteiro original seu, ela vai estar bastante "presente" na história. Estou ansioso para assistir.
Gosto dos filmes de Sofia, são sensíveis, pode até parecer repetitivo, mas eu penso que ela trabalha com os elementos que tem, com os elementos que conhece; e ao mesmo tempo que concordo que uma mudança poderia ser bom, penso que descaracterizaria o estilo da diretora, fico na dúvida, portanto. No mais, ótimo texto, PRECISO VER ESSE FILME.
Falou bonito!
Assisti esse filme despretensiosamente principalmente pelas péssimas sinopses que circulam por aí. Gostei muito do filme, achei que a direção de arte utiliza bem os tons pálidos durante o filme que reforçam a idéia de vida insossa do personagem Johnny Marco.
A fotografia usa travellings/zooms muito lentamente de uma maneira que fica delicado e não brega. A cena em que o personagem está com a cabeça coberta para fazer um molde tem zoom in e dá a sensação de que algo pode vir a acontecer, que não acontece e reforça a idéia de vazio interior do personagem, por exemplo.
Gostei muito também da atuação da Elle Fanning, sua personagem poderia ter ficado exageradamente feliz ou madura, mas a atriz conseguiu balancear de forma com que o resultado ficasse muito bom. Um exemplo disso é a cena em que ela está na mesa com uma amante do pai, onde ela faz 'caras e bocas' para o pai, mostrando que não está gostando nada da visita.
Gosto dos filmes que a Sophia Coppola faz, As Virgens Suicidas (1999) também fala do vazio interior dos personagens porém tem mais ação e não é tão parado quanto Encontros e Desencontros (2003) que por sua vez também trata de personagens/ícones decadentes que nem Maria Antonieta (2006) e Um Lugar Qualquer (2010). Mesmo ainda sendo filmes sobre o mesmo pensamento acredito que sejam filmes bem distintos. O primeiro com mais cara de hollywoodiano e o último, mais experimental. Não acho que ela deva mudar, como muito citaram, gostaria de ver outro filme na mesma linha, ainda mais maduro e mais experimental.
Achei um saco esse filme, prontofalei.
meudeus!
O final diz tudo. Pena que muita gente nao entendeu. O abandono da Ferrari e o sorriso na face do personagem significa que a felicidade verdadeira estah no desapego material. Lindo filme.
Assisti ao filme hoje, e posso dizer que minha admiração por Sofia Coppola só faz aumentar. Sim, ela discorre sobre o tema solidão em todas as suas obras, mas de maneiras muito distintas, com diferentes abordagens. Não vejo repetitividade no trabalho dela. Sofia criou um estilo próprio de comunicação com o espectador, priorizando as imagens em detrimento das palavras, e não acho que isso deva se perder nunca. Todo seu estilo e sensibilidade se perderiam ao retratar um personagem plenamente bem resolvido e sem conflitos. Além do que, pessoas sem conflito, que não sentem nunca o peso da solidão em suas vidas, não existem. E Sofia Coppola retrata, antes de mais nada, realidade.