O comediante Will Ferrell, assim como muitos humoristas que conseguiram fama e sucesso nos Estados Unidos e no mundo, é uma cria do programa Saturday Night Live, que há quase 30 anos, revela grandes nomes do humor americano, como Steve Martin, Eddie Murphy e Tina Fey. Seu jeito meio histrônico e sua cara de pau para dizer as coisas mais absurdas garantiram sua popularidade dentro e fora da TV, onde conseguiu alguns acertos (“Um Duende em Nova York”, “Escorregando Para a Glória”), mas também alguns erros (“A Feiticeira”, “O Elo Perdido”) no cinema. Mas o tipo mais divertido que já criou em sua carreira foi, com certeza, o apresentador de TV machista e não muito inteligente Ron Burgundy, que surgiu em 2004 com “O Âncora: A Lenda de Ron Burgundy”. Apesar do grande sucesso (pelo menos nos EUA), levou nove anos para que fosse feita uma sequência. Mas valeu a pena esperar, pois Ferrell e sua equipe fazem rir (e muito) com “Tudo Por Um Furo” (“Anchorman 2: The Legend Continues”).
Ambientada no início dos anos 80, a trama mostra Ron, ainda casado com a apresentadora Veronica Corningstone (Christina Applegate), sofrendo um baque quando é mandado embora de seu programa de TV pelo seu ídolo Mack Tannen (Harrison Ford, numa rápida ponta), ao mesmo tempo que sua esposa é promovida no trabalho. Ele resolve largar a família, que inclui também o filho Walter (Judah Nelson), e acaba indo parar na sarjeta. Até o dia em que é convidado por Freddie Shapp (Dylan Baker) a ingressar no primeiro canal de notícias que funcionaria 24 horas por dia. Apesar de achar a ideia absurda, Ron acaba aceitando a proposta e resolve trazer de volta toda a sua antiga equipe: Brian Fantana (Paul Rudd), Champ Kidd (David Koechner) e o amalucado Brick Tannen (Steve Carrell). O grupo acaba batendo de frente com o convencido astro do canal, Jack Lime (James Marsden) e tem que produzir um telejornal num péssimo horário para a audiência. Mas tudo muda quando Ron e seus amigos decidem exibir notícias que parecem inúteis, mas que acabam conquistando o público médio. O sucesso é tão grande que Ron consegue a atenção da produtora Linda Jackson (Megan Good) e chega ao ponto de ofuscar Veronica, especialmente quando ele narra uma perseguição de carros numa rodovia ao vivo, na mesma hora em que ela entrevistaria Yasser Arafat, numa das melhores cenas do filme.
O que chama a atenção em “Tudo Por Um Furo” é que, mesmo sendo um besteirol, o filme faz uma crítica sutil ao que é exibido na TV e o que as pessoas realmente gostam de ver. Afinal, se olharmos atentamente para o que os canais de notícias exibem hoje em dia não é muito diferente do que Ron e sua equipe fazem na GNN (a emissora do filme) e isso é muito bom, já que a proposta do roteiro (escrito por Ferrell e pelo diretor Adam McKay) é, além de divertir, fazer pensar. Além disso, é bom ver um projeto que procura ser mais politicamente incorreto do que os existentes por aí no campo da comédia, enfatizando que algumas questões, hoje consideradas tabu, eram amplamente divulgadas nos anos 80.
O elenco está super afiado. Will Ferrell está mais do que à vontade com Ron Burgundy. Tanto que não dá para pensar em outro ator para interpretá-lo. Ele consegue fazer rir, mesmo quando toca em questões complicadas, quando faz piadas preconceituosas sobre as mulheres no trabalho e relações inter-raciais. Embora a cena em que janta na casa de Linda possa soar mesmo ofensiva. Paul Rudd e David Koechner são ótimos como os parceiros do protagonista, assim como as belas Christina Applegate e Megan Good, que disputam o coração do âncora. Mas o grande destaque ainda é Steve Carrell, como o completamente sem-noção Brick Tamland, capaz de se emocionar e fazer um discurso inusitado no próprio (falso) funeral. As melhores cenas de Carrell são aquelas em que ele divide com Kristen Wiig, que vive a bizarra atendente do canal Chani Lastnamé, que parece ter mais de um parafuso solto na cabeça, e encontra em Brick a sua alma gêmea.
Com várias cenas hilárias (uma delas envolve um acidente com motorhome no meio de uma estrada, acredite!), “Tudo Por Um Furo” pode deixar o espectador sem fôlego de tanto rir, especialmente na sequência final do filme, que é tão inusitada que não vale a pena escrever muito sobre ela para não estragar a surpresa. Mas quem for conferir, com certeza não se arrependerá, especialmente pelas participações especiais que surgem na tela, tirando sarro de si mesmas. A produção se revela uma boa sequência para “O Âncora: A Lenda de Ron Burgundy” e, por incrível que pareça, dá vontade de ver novas histórias envolvendo o mais insólito dos apresentadores de TV a surgir no cinema.
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