Quando “Twisters” foi anunciado, mais de 25 anos após o longa original, acreditava-se que viria na forma de uma legacy sequel (ou sequência de legado), nos moldes do que vem sendo a tendência dos estúdios. Trata-se da receita em que se ressuscita uma marca há muito adormecida (ou que tenha fracassado em filmes recentes) em um misto de continuação e reboot, de forma que agrade os fãs nostálgicos, ao mesmo tempo que aponta para a construção de um novo universo para a franquia, garantindo nova leva de filmes.
A regra é clara: os personagens dos filmes originais devem voltar, ou pelo menos um amado coadjuvante, mas é igualmente importante introduzir uma geração de novos rostos, que interagem com os antigos, recebendo deles o bastão para levar a história adiante, atraindo o público mais jovem que não tem uma relação assim tão estreita com a marca.
Como principais exemplos temos a trilogia sequel de “Star Wars”, “Jurassic World” e os dois recentes “Caça-Fantasmas”. E o que pode ser considerada a única surpresa dessa continuação de “Twister” é o fato de fugir um pouco dessa tendência.
Em “Twisters” Kate Cooper (Daisy Edgar-Jones) é uma ex-caçadora de tornados que acaba sendo atraída de volta à ação por conta de seu amigo Javi (Anthony Ramos), para testar um novo sistema experimental de rastreamento meteorológico. No caminho deles surge o fanfarrão Tyler Owens (Glen Powell), um ícone das redes sociais que compartilha suas aventuras de caça à tempestade. Conforme a ação da natureza se intensifica de forma aterrorizante, Kate e Tyler, até então antagonistas, acabam colocando suas vidas em risco em meio a uma situação nunca vista antes.
Apesar de se desprender bastante do blockbuster dirigido por Jan de Bont, lançado em 1996, “Twisters” recria a mesma estrutura narrativa e a mesma dinâmica dos personagens, pendendo mais para um reboot do para uma legacy sequel.
No roteiro assinado por Mark L. Smith (“O Regresso”, “Operação Overlord”) e Joseph Kosinski (que dirigiu duas sequências de legado: “Top Gun: Maverick” e “Tron: O Legado”), vemos novamente uma protagonista que carrega o fardo de um trauma do passado com a personagem Jo, de Helen Hunt. No entanto, o script estabelece uma inversão, já que, enquanto a experiência traumática transformou Jo em uma obcecada por tornados, Kate se afastou das atividades tornando-se uma heroína relutante como Bill Harding (Bill Paxton).
Vale notar que se em Twister o peso do evento que marcou a vida de Jo para sempre permeia a narrativa, mesmo sem ser citado, o mesmo não acontece com o episódio que impactou Kate, que, mesmo constantemente lembrado, parece ter tido sua importância diluída.
A direção de Lee Isaac Chung exalta o caráter de espetáculo e conta com o apoio da arrojada fotografia de Dan Mindel. No entanto, falta um pouco de personalidade ao diretor do belíssimo “Minari”, fazendo com que em muitos momentos até emulasse o estilo de de Bont (que já era claramente inspirado na linguagem visual de Steven Spielberg, mais uma vez assinando como produtor executivo). É compreensível, dado que se trata de um resgate de franquia e que Chung atua como diretor contratado que se preserve a identidade visual do primeiro filme, mas uma boa porcentagem de liberdade ao cineasta poderia acrescentar à obra.
O eficaz elenco se apoia sobre uma disciplinada Daisy Edgar-Jones e o sempre carismático Glen Powell, que por mais que esteja repetindo papéis, sempre proporciona atuações que conquistam o público. E o anti-herói Tyler Owens não é diferente. Os dois em cena conseguem trazer muito do entrosamento de Helen Hunt e Bill Paxton, embora com uma dinâmica diferente, e esse é o trunfo para conquistar as novas plateias, que, no fim das contas, é o principal objetivo da produção. O filme conta também com o novo Superman David Corenswet, em um papel menor, mais ou menos como Philip Seymour Hoffman no primeiro longa.
Os efeitos especiais podem não causar o mesmo assombro do longa de 1996, dado que na ocasião o CGI era uma novidade (a vaca voadora se tornou icônica). Todavia, o trabalho da Industrial Light & Magic é bastante convincente e acima da média, ainda que seja, assim como em “Jurassic World”, apenas um aprimoramento do que já vimos há quase trinta anos.
Podemos dizer que “Twisters” se coaduna com seu antecessor até na falta de ambição. Embora tenha sido um sucesso de bilheteria na época de seu lançamento e se tornado um clássico da Sessão da Tarde ao longo dos anos, “Twister” não tem o peso na cultura pop de um Jurassic Park ou De Volta Para o Futuro. Fica na prateleira de um “Jumanji”, por exemplo, justamente por ter sido concebido como nada além de um delicioso e barulhento brinquedo de parque temático. Foi o mesmo caminho escolhido pela nova produção, que busca renovar a franquia, mas sem correr grandes riscos. Afinal, para que mexer em esquema tático vitorioso?