Adaptação de musical da Broadway para o cinema é sempre uma manobra de risco. Pode dar muito certo ou demasiadamente errado. E adaptar uma peça tão amada, com um fandom tão gigante quanto “Wicked” é, no mínimo, mexer em um vespeiro. E o diretor John M. Chu topou o desafio de levar o prólogo das bruxas de “O Mágico de Oz” para as telonas.
Seguindo o mote dos palcos, “Wicked” explora a história das personagens mais icônicos (ou controversos) de Oz, com foco na Bruxa Má do Oeste e sua inesperada amizade com Glinda, a Bruxa Boa. A trama segue a trajetória de Elphaba, uma jovem de pele verde, passando por eventos marcantes que acabam lhe conferindo a fama de “má”. Quando chega à universidade, ela conhece Glinda, uma garota rica e vaidosa; Fiyero, um príncipe charmoso e irresistível; e o próprio Mágico de Oz, um homem muito diferente do que imaginamos.
Vemos também que há algo de podre no reino de Oz, ao passo que vão sendo revelados segredos obscuros e tragédias que moldam o destino do mundo mágico. É esse o fio condutor, além das personalidades das protagonistas, que defende a existência de dois lados sempre. E o roteiro de Winnie Holzman e Dana Fox busca ser fiel a essa desconstrução de maniqueísmo proposta pela versão teatral, que conquistou um séquito fiel de seguidores justamente por transformar completamente a perspectiva sobre a história original.
Em se tratando do universo de “O Mágico de Oz”, era de se esperar que o diretor recorresse à linguagem visual do filme de Victor Flaming. A fonte utilizada no título, a fotografia que acena para o cinema dos anos 1940, inclusive vários números musicais parecem saídos daquela Hollywood. Um deleite para os fãs do período, dada a organicidade, diferente da homenagem plastificada.
Chu mostra mais uma vez a sua destreza para direção de musicais. Assim como em “Em Um Bairro em Nova York”, o cineasta consegue fazer a acertada transposição de plataformas se valendo dos recursos mais variados disponíveis na sétima arte. Ele se mantém fiel à identidade visual e à ideia cênica, mas sempre buscando expandir aquilo que encontrava limitações no palco. O resultado são números grandiosos, de coreografia opulenta e sem cerimônia de pecar pelo excesso, o que em alguns momentos acaba sendo um pouco prejudicial.
O principal excesso é o de duração. O filme cobre apenas o primeiro ato do espetáculo, que possui, em sua totalidade, 2 horas e 45 duração (fora os 15 de intervalo). Apenas cinco minutos a mais do que o tempo de projeção. Por mais que a intenção tenha sido lotar a tela de homenagem tanto à peça quanto ao clássico de 1939, não faria mal se alguns momentos não fossem prolongados. Além disso, nem todas as músicas são brilhantes (isso acontece em todos os musicais), e algumas composições que rendem bem no palco não funcionam da mesma forma na tela, mesmo amparada pelas maiores possibilidades de uma superprodução cinematográfica.
Ainda assim, a grandiosidade e a graciosidade são asseguradas pela direção segura de Chu, que conta também com um desempenho de elenco fundamental para o bom funcionamento da adaptação. Cynthia Erivo se mostra a melhor escolha para o papel da versão jovem da Bruxa Má do Oeste, com uma atuação magnética e naturalista que geram empatia imediata. Ariana Grande mostra um timing perfeito para o humor e surpreende os que desconheciam o lado atriz da popstar. A química entre as duas é, de fato, o maior trunfo do longa. E encabeçando o elenco de coadjuvantes temos Michelle Yeoh, que também trabalhou com o diretor em “Podres de Rico”, e rouba a cena várias vezes aqui, o galã estereotipado e propositalmente canastrão Fiyero, bem defendido por Jonathan Bailey, além de Jeff Goldblum como mais uma encarnação do Mágico, bastante interessante.
Por fim, “Wicked”, pelo menos nessa parte 1, figura no hall das adaptações de musical bem-sucedidas, embora possa sim cansar os que não são muito fãs do gênero. E ainda termina de uma forma que lembra “O Império Contra-Ataca” ou “O Senhor dos Anéis: As Duas Torres”, deixando o espectador aflito pela conclusão. Ao que tudo indica (e quem conhece a peça sabe bem), vai valer muito a pena.
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