Logo na primeira sequência de “Wish: O Poder dos Desejos”, a primeira coisa que você vai pensar será certamente “já vi isso”. E essa foi mesmo a intenção dos estúdios de Walt Disney, nessa que é a animação que comemora o centenário de uma das marcas mais poderosas do nosso tempo. A divisão de animação do conglomerado decidiu festejar com um produto que colocasse em um liquidificador todos os elementos identificáveis em um desenho da Disney como receita de um belíssimo bolo de aniversário.
Uma jovem dadivosa chamada Asha (Ariana DeBose na versão original e Luci Salutes na dublada) deseja uma estrela e obtém uma resposta mais direta do que esperava quando uma estrela problemática desce do céu para se juntar a ela em uma jornada para salvar os desejos de uma comunidade, provando que quando a vontade de um humano corajoso se conecta com a magia das estrelas, coisas maravilhosas podem acontecer.

Daí é fácil adivinhar o rumo que a história vai tomar. Não é de se surpreender que a direção tenha sido encomendada a Chris Buck, do já clássico “Frozen: Uma Aventura Congelante”. Se você já viu o trailer, ou a propaganda de TV, percebeu que há uma forte semelhança. Inclusive ele buscou se cercar de sua parceira na franquia protagonizada por Elsa e Anna, a roteirista Jennifer Lee. A eles se junta Allison Moore (“Powers” e “Beacon 23”). Ou seja, o estúdio procurou apostar no seguro ao escalar o time que comandaria sua valiosa animação comemorativa, afinal, precisava salvar um ano de bilheterias minguadas (apenas “Guardiões da Galáxia Vol. 3” fez bonito e ainda assim não bateu o bilhão que era costumeiro em tempos pré-pandêmicos).
Mas observando friamente, fica difícil acreditar que a casa do Mickey Mouse apostou mesmo suas fichas nessa produção para figurar na mesma prateleira do já citado “Frozen” ou mesmo “Moana: Um Mar de Aventuras”. Com uma trama genérica, roteiro extremamente previsível e canções nada marcantes (embora abusem da fórmula de sucesso estabelecida em outros títulos), a festa dos 100 anos da empresa ganhou tonalidades foscas. O excesso de familiaridade acabou sendo uma armadilha em “Wish”. O caráter autorreferencial deixou a Disney presa à mesmice, esbarrando no autoplágio. Até os easter eggs de sucessos anteriores ficam empalidecidos dada a forma gratuita com que são inseridos.
Chris Buck até se sai bem nas cenas mais aventurescas e consegue extrair algum encantamento nos momentos mágicos. Ele conta com o auxílio da codiretora Fawn Veerasunthorn, que atuou como animadora em “Zootopia” e “Raya e o Último Dragão”, além de trabalhar no departamento de arte de “Frozen” e “Moana”. A experiência de ambos é o que não deixa o barco naufragar.

Uma das marcas registradas da Disney são os coadjuvantes fofinhos. Em “Wish” eles funcionam em parte. O mascote que acompanha a heroína (outro elemento que já vimos à exaustão) é engraçadinho até começar a falar. Marcelo Adnet (na versão dublada) até se esforça para adicionar graça, mas mas esbarra nos limites do script. Já a estrelinha, que funciona como o mascote mágico, lembra bastante animações orientais, e isso pode ter sido uma inspiração, ao mesmo tempo que uma forma de cativar o mercado chinês, que, depois de se tornar o fiel da balança para as bilheterias hollywoodianas, tem se tornado cada vez mais difícil, com o impulsionamento de suas próprias produções.
Um trunfo inegável da produção é a técnica empregada para a animação. É sabido que a Disney abandonou a animação tradicional em 2D após “A Princesa e o Sapo”. No entanto, como os maiores clássicos foram concebidos com essa técnica, optou-se aqui por utilizar o 3D mas com a textura que emula o nanquim, alcançando o desiderato de mesclar modernidade a o artesanal, algo que poderia perfeitamente ser seguido nas próximas animações.

“Wish” até acerta em apostar na diversidade, apresentando uma princesa negra (com traços caribenhos), a segunda depois da Tiana, colocando mais cor no antes monocromático paradigma de protagonistas. Mas o carisma da personagem não foi o bastante para compensar a falta daquilo que faz as animações da Disney serem únicas: o toque mágico, a fórmula que parece secreta e sempre funciona. A exemplo de outras animações que não foram tão recebidas na época de seus lançamentos, essa aqui pode até encontrar redenção no futuro, sendo redescoberta e revisada. Contudo, tendo como referencial animações recentes mais felizes em suas propostas (os lançamentos de 2021 “Raya” e “Encanto” são bons exemplos), deixou a desejar para quem esperava algo memorável na data comemorativa. Como diversão ligeira funciona.







Deixe um comentário
Você precisa fazer o login para publicar um comentário.