Marcelo Torres é pernambucano da cidade de Palmares, nascido em 1984. Reside em São Paulo na região do ABCD. Publicou “Vertigem de Telhados”, livro de poemas que marca sua estreia como poeta e o livro também de poemas “nadar em cima da rua”, ambos editados em 2015 pela Kazuá, em 2017 lançou “Páthos de Fecundação e Silêncio” pela editora Patuá. Tem poemas publicados em antologias pelo Brasil, em revistas de literatura e cultura. Fizemos quatro perguntas ao escritor. Confira.
1-) Teus versos são pontuados como uma margem de definição onde inúmeras imagens ora se correspondem ora se engalfinham. Ter num verso tantas possibilidades como foi isso?
Sempre trabalho pensando na dimensão e junção da melopeia, da fanopeia para tencionar e estabelecer o sentido final do verso gosto de pensar o poema como um bloco com distintos sentidos. As imagens quebradas, estilhaçadas são como se estivessem realizando um percurso musical, onde a fuga trás outros efeitos, às vezes desconfortáveis. Venho através da utilização da linguagem formatando diferentes esferas narrativas, esses caminhos digressivos estão surgindo naturalmente no exercício da leitura, da escrita, da criação em si. Acho que talvez seja uma busca de dizer de outra forma que não seja a convencional, aquilo que está diante ou ao redor de nós redimensionando pontos de reflexões possíveis.
2-) O poema, sendo atravessado por estes versos que citei na primeira pergunta, tem uma organicidade impressionante. Eles se aglutinam num composto poético perfeito. Você, depois de escrever o poema, fazia algum tipo de revisão semântica neles?
Revisão semântica algumas poucas. Faço alguns ajustes para aperfeiçoar a imagem, o sentido do elemento temático no verso. Tenho uma produção rápida, não demoro muito para acabar um poema ou deixá-lo inacabado, pois um poema sempre pode ser reformulado, ampliado, recriado, enfim um poema nunca acaba. Dou como pronto para me livrar dele, e poder escrever o próximo poema. Apesar da ousadia no uso da linguagem, têm uma formalidade na estrutura muito evidente e delimitada nos meus livros. Isso faz com que o verso incomum se sustente pela organicidade que está implícita no corpo do poema, na musicalidade das palavras, na imagem-pictórica proposta. Tento ser preciso. Isso às vezes foge, principalmente quando escrevo com a consciência alterada que exige outro percurso de imersão criativa e organizacional.
3- ) Seus poemas lidam muito com tipos de opiniões formativas em muitos assuntos. Como foi esta inserção destes tipos de comentários?
Como poeta procuro atingir algumas questões que acho relevantes. Acho que dentro da inutilidade da poesia pensando nela inserida nesse mundo de excesso de consumo, degradação ecológica, massacre de grupos indígenas no caso do Brasil e de pouca vitalidade nas relações humanas atuais, essas opiniões expressam a minha posição como pessoa diante da vida. Escolher ser poeta é uma posição política dentro da sociedade. As colocações sobre temas contemporâneos que aparecem nos poemas são ideias das reflexões que faço nas conversas com o outro, ou com a ausência desse outro. Não dá para ser poeta sem se arriscar e deixar claro qual é o seu corpo-poético. Algumas pessoas falam que minha poesia é hermética. É uma reflexão simplória, tem nada de hermético nos poemas, para mim inelegível é uma pessoa olhar um quadro de Remedios Varo ou ler um poema do Dylan Thomas e não sentir nada. Nada é mais abusivo do que uma pessoa fechada para a vida que evita aprofundar as relações humanas e se posicionar de forma potente, a diversidade é a bola da vez e não podemos deixar que a caretice, o conservadorismo, essa obsoleta moral cristã se sobressaia à experiência, ao lance de dados diário.
4-) Queria que você falasse um pouco de autoria. Parece a mim que você leva a parte da autoria/criação num caleidoscópio de classificações, quebrando uma questão que se fala muito sobre rótulos. Fale sobre isso?
Os rótulos e classificações delimitam o ato de pensar, tenho um viés de influência surrealista nítida e bem resolvida no meu trabalho. O que quero é me alimentar das sensibilidades, das trocas. Vivo na perspectiva oswaldiana de aprofundar-se nas questões do meu país e olhar para o resto do mundo absorvendo distintas estéticas, um duplo olhar onde o que me interessa é ampliar cada vez mais o conhecimento, a sensibilidade, o delírio poético. Quero estabelecer um projeto literário pessoal, não preso em uma classificação exclusiva, mas que converse com várias vertentes. Minha “Zona” no sentido marginalizado da coisa é atravessar aquilo que me chama a atenção. Quero ter a flexibilidade de criar um inventário que possa utilizar ou descartar quando me cansar. Meu percurso de criar uma voz pessoal/autoral não está preso às classificações, mas a minha pesquisa de linguagem, as variantes de leitura de mundo, ao cinema, a música, as artes visuais, a literatura, aos meus afetos, na imanência que Deleuze fala. Essa partida de futebol dúbia muitas vezes da experiência. Somos produtos das relações que estabelecemos com o outro e com o mundo. Só consigo dimensionar esse espaço de autoria/criação nesse campo aberto de multiplicidade.
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