Cristina Fürst lança “Êxtase”, pelo selo feminino Maat, da Ibis Libris Editora, trazendo “a bênção do desconhecido, dos acasos objetivos, das coisas preexistentes e efêmeras, mas que, mesmo assim, são permanentes”, por meio de contos e crônicas, poemas e aforismos.
Uma obra que parece simples, mas que encanta o leitor e mostra por que a autora lhe deu o título “Êxtase”, um estado em que nos sentimos fora de nós mesmos, como se estivéssemos em transe, com sentimentos intensificados de prazer e alegria, superando todos os obstáculos.
Os lançamentos acontecerão na Blooks Botafogo/RJ (dia 4/10), na Blooks Niterói/UFF (dia 20/10), a partir das 18h, e na Travessa de Pinheiros/SP (dia 6/11), a partir das 19h, com a presença da autora.
“Êxtase”, apresentado por Cristina Gaulia
A escritora, contista e poetisa, CRISTINA FURST, é, seguramente, uma das revelações promissoras da escrita feminina da contemporaneidade. Suas criações literárias são independentes, corajosas e têm um propósito muito claro: a desconstrução do aparentemente óbvio e da discriminação, do preconceito perverso e do ódio ao diverso em que a cultura colonial, hipócrita e reacionária da sociedade brasileira está imersa e afogada há séculos.
Reflexões sobre os comportamentos mascarados, que sempre tivemos e que se aprofundaram com a pandemia, circulam livremente pelas crônicas autênticas de Cristina, que conhece o verso e o anverso. Se não nasceu rica e sempre precisou trabalhar, sabe que seu merecimento está na palavra escrita, arma para a luta constante que sabe bem lutar.
Nunca se escondeu nem pintou de rosa sua sexualidade. Todos sempre souberam onde estava, e sua meta mais gloriosa, valente e talentosa, é gritar, em alto e bom som, que vai sim “viver até o último dia”.
Não se duvide da força dessa escritora, que faz parte de uma resistência resiliente, e que na busca de suas próprias verdades navega nas incertezas com uma luz que nos ilumina a todas, todos e todes. Sua paixão pelas palavras, pois “as palavras falam” e dialogam com o inconsciente social, demonstram que todo amanhecer vale a pena e que nenhuma mulher deve aceitar ser coadjuvante na vida.
Trans, lésbicas, cis, pretas, indígenas, aborígenes, deficientes, ruivas, diferentes todas merecem ser protagonistas, e Cristina sabe mostrar isso como ninguém, pois como refere muito bem “prefere ter calo no cotovelo que na língua”.
Em seu êxtase, que nasceu de sua desiderata, a autora nos motiva a entender que as coisas que desejamos valem a luta diária, e que as palavras podem ser ferramentas de solidariedade e reumanização.
Prefácio de Thereza Christina Rocque da Motta
Começando pela pandemia (por que não?), Cristina fez o percurso ao revés de tudo o que a assombrou nesses dois anos perversos, como se não bastasse a pandemia em si, houve outra que ela teve de enfrentar: a dos sentidos.
Cristina Fürst luta pela palavra, pelo dizer, pelo que está escrito, pelo sentir, pelo entender, pelo mostrar-se, e dizer a que veio. Ela enfrenta suas lutas há muito tempo. Embora se pudesse dizer que ela não precisaria ter brigado com ninguém, foi essencial para ela se construir de dentro para fora, como faz qualquer semente. A pandemia ensinou a todos nós que não estamos aqui por acaso e, se sobrevivemos, foi porque há mais coisas por vir.
Conheci Cristina Fürst graças ao meu trabalho de editora, recebendo o primeiro livro que ela queria publicar, em 2021. Só que eu não a conhecia só dali. Eu a conheci antes, sem saber. Ela estava no meu caminho desde a minha adolescência. E nós não sabíamos. Tivemos que dar uma volta olímpica para nos defrontamos novamente por causa do seu A onipotência festiva do nada.
Enquanto preparava o livro, nem poderia imaginar que estivemos no mesmo lugar quando tínhamos, eu, 18 e, ela, 12 anos. Conhecíamos as mesmas pessoas, intimamente, da mesma família que adorávamos, por meio de dois irmãos: ela, Lygia e, eu, Jorge Mauad. Jorge tornou-se meu pai afetivo, porque assumiu essa posição por ser um pai inclusivo, como ele mesmo dizia. E Lygia é madrinha de batismo de Cristina. Como a vida pode reunir de novo duas pessoas que poderiam ter se conhecido há mais tempo? Isso tem nome: chama-se “acaso objetivo”, de que os surrealistas tanto falam. É o que faz a poesia existir.Por meio dos acasos objetivos, a poesia existe.
E Cristina não sabia disso, nem eu. A partir dessa descoberta, tudo mudou. Quem era ocasional tornou-se permanente. O acaso tornou-se real. E passamos a fazer tudo juntas. Passamos tanto por bons como maus bocados, mas, saímos do outro lado, invictas. Foram dois anos de gestação para este segundo livro. Cristina não abandonou seu estilo ecumênico, em que é “um por todos e todos por um”. Aqui ela pinta e borda do mesmo jeito que fez no primeiro livro, com uma diferença: agora ela sabe o que está fazendo. Não é mais marinheira de primeira viagem, não é mais uma estreante, nem principiante, nem neófita. Aprendeu do jeito mais complicado o que é lançar um livro e arcar com as consequências. Um livro é um ser de papel (canso de dizer isso), que vive fora de nós, vem através de nós, mas tem ideias e vontades próprias. Um livro é um mestre. Ele sabe mais do que nós.
Assim, este “Êxtase” é perfeito em sua forma e conteúdo, capa, orelha, contracapa, foto, todas as minúcias que fazem um livro. Deixo a avaliação literária para quem ler. O que é preciso dizer aqui é que o livro existe, porque ele quis. E porque Cristina quis. Os dois quiseram em conjunto, cada um por um motivo. Cristina, porque precisa escrever o próximo livro, contando as peripécias de uma viagem muito especial, da qual eu também participei de uma forma transcendental. Tudo entre Cristina e eu acontece assim, dessa forma. Imagine o que é reencontrar alguém que você já deveria ter conhecido, mas que não houve tempo para sermos apresentados? E, depois, quando ela parte para a Espanha, para fazer o Caminho de Santiago, os presentes de aniversário que dei a ela têm tudo a ver com a viagem em si mesma, sem que eu soubesse?
Então, este livro tem a bênção do desconhecido, dos acasos objetivos, das coisas preexistentes e efêmeras, mas que, mesmo assim, são permanentes. Permanentes enquanto duram, porque tudo um dia acaba, mas enquanto durarem, dão-nos essa sensação de infinito.