Entre o político e o íntimo: conheça os dilemas, complexidades e tensões sociais e morais de “A União das Coreias”, de Luiz Gustavo Medeiros

Paulo é um rapaz de trinta e poucos anos lidando com tensões relacionadas ao emprego, ao passado familiar trágico, à herança negra e, sobretudo, aos impasses amorosos. Esse é o personagem principal do romance de duração “A União das Coreias”, escrito por Luiz Gustavo Medeiros e publicado pela editora Reformatório.

O  livro busca traçar um retrato das complexidades da vida e seus dilemas morais, embora temas como o amor, o sexo, a infidelidade, a política, os abismos sociais, ajudem a compor o cenário existencial por onde os personagem se movem. A obra, contemplada pelo Fundo de Arte e Cultura de Goiás em 2023, conta com orelha assinada pela Noemi Jaffe e comentários na quarta capa de André Sant’Anna e Maria Fernanda Elias Maglio.

Luiz Gustavo nasceu no Rio de Janeiro, capital, passou a infância praticamente toda em Curitiba (PR) e se mudou para Goiânia (GO) em 2002, onde vive desde então. Ele é graduado em Ciências Sociais e mestre e doutorando na área de Letras. O seu primeiro livro “O corpo útil” foi vencedor do Prêmio Hugo de Carvalho Ramos de 2020 e publicado em 2021 pela Editora Patuá.

Conheça um pouco mais sobre a obra e escritor na entrevista abaixo:

Quais são os temas centrais de “A União das Coreias”??

O romance se passa em um só dia e gira em torno de um personagem que, às vésperas do primeiro turno das eleições de 2018, retoma o passado enquanto avalia o presente e o futuro. À grosso modo, o livro trata de temas comuns como o amor, o sexo, a política, os costumes e os abismos sociais. O título surgiu a partir da leitura de uma tese de doutorado em psicologia chamada Cartas sobre o envelhecer, de Luciana de Oliveira Pires Franco. A tese é toda composta de cartas e, em uma delas, é citado um documentário chamado A vida em um dia, que registra um determinado dia na vida de várias pessoas pelo mundo. Um dos relatos é o de um homem que atravessa a Ásia de bicicleta sonhando com a união das Coreias. Gostei da imagem e achei que ela batizaria bem essa tentativa de captura, que é o livro, do percurso mental de um sujeito atormentado por forças contrárias em duelo constante.

Por que você escolheu esses temas?

Não penso que a escolha dos temas, das tramas e subtramas, tenha uma motivação especial. Os conflitos do romance fazem parte da trajetória de muitas pessoas e podem servir como material pra boa literatura, onde mais importa como dizer do que o que dizer

O que motivou a escrita do livro?

Lembro quando um estudante foi assassinado em Goiânia pelo próprio pai por participar das manifestações contra a PEC do teto de gastos durante o governo Temer. O pai se matou em seguida. Sou servidor do CREA e, pouco depois, acabei atendendo a mãe desse jovem, que foi lá apresentar a certidão de óbito do ex-marido, que era engenheiro, pra que o registro dele fosse cancelado. Lembro também de assistir a apuração das eleições de 2018 em um bar numa região de classe média alta de Goiânia e um homem sacar uma arma, depois que o resultado se confirmou, só pra exibi-la. E o livro começou a ser escrito quando a pandemia estourou e o país parecia ensaiar uma divisão entre os que queriam aderir às recomendações dos órgãos de saúde e os que não aceitavam qualquer mudança de comportamento. Quis examinar essa situação, esse afunilamento da tolerância, tentar me aproximar do convívio entre essas pessoas que não compactuam com as mesmas ideias, num momento em que elas ainda pareciam se suportar.

Como você chegou à escolha do formato narrativo da história?

Eu queria uma narrativa que tentasse simular o ritmo da consciência, cheia de idas e vindas. Ao mesmo tempo, eu queria um narrador em terceira pessoa que fosse uma espécie de voz interior do personagem, exigente e debochada, e que fosse muito próxima dele a ponto dos dois se confundirem.

Como a bagagem do seu livro anterior ajudou na construção da obra?

No meu primeiro livro, de contos, eu já vinha experimentando esse narrador em terceira pessoa muito colado no personagem, além dos diálogos diluídos no texto, em itálico. No mais, são livros bem diferentes.

O que você espera alcançar com a publicação de “A União das Coreias”?

Espero alcançar leitores. Espero conseguir colocar o leitor diante do contraditório, esticar os limites da sua percepção.

E o que a obra significa para você? Ela te mudou de alguma maneira?

É meu primeiro romance. Foi escrito ao longo de quatro anos, quatro anos e meio. Foi um desafio cujo resultado me agradou. Não vejo um poder de transformação imediato na escrita. Mas escrever – e ler – ajuda, pouco a pouco, a ampliar nosso horizonte de percepção, a ampliar o mundo e a fazer com que a gente se encaixe melhor dentro dele.

Quais são os seus projetos atuais?

Tenho uma tese pra escrever, mas venho trabalhando devagar em um livro de contos e no esboço de um futuro romance

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