A banda Arcade Fire, atração principal do festival Lollapalooza deste ano, regalou os fãs cariocas, incluindo a cidade na turnê, que também passou por Chile e Argentina. Geralmente as principais atrações do festival que ocorre em São Paulo não vêm ao Rio, somente as secundárias. E a iniciativa foi da própria banda, que tem boas recordações da última apresentação que fez na cidade em 2005.
O público presente no Citibank Hall, na Barra da Tijuca na última sexta feira era de aproximadamente 4 mil pessoas, o que leva a avaliar se o copo da trupe está meio cheio ou meio vazio. Meio cheio se for levar em conta que foi um público duas vezes maior do que aquele que compareceu ao segundo dia da edição 2005 do finado Tim Festival. Na ocasião a banda estava em seu debut, divulgando o primeiro álbum, Funeral, e abria para o Wilco na menor tenda do festival. Porém, o copo está meio vazio considerando que a ocupação foi menos da metade da lotação máxima do local, que comporta 9 mil pessoas. A sensação de espaço vazio não foi sentida porque foi colocada uma cortina preta isolando a metade para trás da pista.
A procura abaixo do esperado para uma banda de tanta relevância no cenário internacional atual talvez se deva pelo fato de que os apreciadores do chamado indie/alternative rock, no qual o Arcade se insere, se concentram, em sua maioria, na zona sul da cidade, e uma viagem à longínqua zona oeste costuma gerar uma certa preguiça. Pois azar de quem não foi. Quem desafiou a inércia e foi até a casa de shows no shopping Via Parque presenciou uma banda no seu auge tanto criativo quanto performático. Com quatro discos lançados, e surpreendentemente mantendo o mesmo nível de qualidade, o grupo radicado no Canadá já entrou em campo com o time ganho.
A plateia, formada em sua maioria por jovens de visual hipsters, caras pintadas e fantasiados (atendendo ao pedido da banda) recebeu com entusiasmo a dançante faixa título do último álbum, Reflektor, que abriu os trabalhos. A segunda, Flashbulb Eyes, também do último disco, teve a mesma boa recepção. Porém, a festa começou para valer nas primeiras batidas da vigorosa Neighborhood #3 (Power Out), do primeiro e já clássico disco, seguida de outra do álbum de estreia, Rebellion (lies), um dos maiores sucessos da banda, que fez o público pular e gritar o refrão a plenos pulmões “everytime we close our eyes (lies, lies).”
O setlist estava bem distribuído, privilegiando os quatro discos, e os principais hits estavam todos ali: The Suburbs, representando o disco homônimo de 2010, assim junto com Ready to Start; No Cars Go, a única da noite tirada de Neon Bible de 2007, e mais clássicos de Funeral Neighborhood #1 (Tunnels) e Neighborhood #2 (Laika).
A estrada fez muito bem para a banda em termos de performance. Ter feito os shows de abertura da perna americana da turnê Vertigo do U2 em 2005 deu cancha a eles. A começar pela produção. Projeções de fundo, espelhos refletores na parte superior, e até uma estrnha figura vestida de espelhos dos pés à cabeça. Foi o cicerone da noite anunciando o inicio do show e depois voltou na música After Life, para produzir um efeito de globo espelhado (!!!). Win Butler (que além do vocal principal ainda toca guitarra e piano) se revelou um frontman completo, indubitavelmente formado na escola de Bono, e sua presença de palco ainda tem como apoio o carisma da ‘patroa’ Régine Chassagne (a única canadense da gema no grupo) que toca teclado, acordeom, percussão, xilofone e até uma mini bateria e a eficiência do irmão Will no sintetizador, percussão e baixo.
A vantagem de uma apresentação em um lugar menor é que a comunhão com o público se torna mais intensa. Butler várias vezes se aproximava do gargarejo pegava a câmera de alguém e fotografava a plateia ou fazia selfie. O resto da banda também interagia bastante com o público, parecia até um daqueles shows do ‘Queremos’. Houve homenagens ao Brasil, logo no inicio do show quando foram mostradas nos telões laterais imagens do filme Orfeu Negro de 1959. Regine fez um snipet de O Morro Não Tem Vez antes de It’s Never Over (Oh Orpheus), faixa de Reflektor, que também é uma homenagem à clássica produção franco brasileira. Em seguida, veio Sprawls II (Mountains Beyond Mountains) com Regine e seu vocal a la Björk na fase Sugarcubes. Pausa para o tradicional bis. Na volta, uma banda fake toma o palco com as máscaras gigantes do videoclipe de Reflektor tocando Nine Out of Ten de Caetano Veloso, e logo é expulsa pela banda de verdade. Na sequência, Normal Person, a apoteótica Here Comes the Night Time, com direito a chuva de papel cromado e para finalizar, uma versão acústica de Wake Up.
Depois de quase duas horas de um show mágico, a banda se despediu já deixando saudades. Tomara que não levem mais nove anos para voltar. Para aqueles que acham que o rock morreu junto com Kurt Cobain há 20 anos, o Arcade Fire mostrou que ainda há relevância artística no gênero que completa seis décadas esse ano.
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