Fotos: Patrícia Moura
No segundo dia de Hell In Rio, no Rio de Janeiro, o tempo firmou, chegou até a sair um tímido sol, o que levou um público maior do que o do chuvoso dia anterior. Hatefullmurder e Eros aqueceram o público já numeroso no início da tarde de domingo. O John Wayne, banda paulista da nova safra do hardcore nacional, subiu ao palco justificando o seu lema de fazer um triturador parecer música de ninar.
Ao contrário do que se pensa, o nome não é uma homenagem ao cowboy do cinema americano e sim uma forma de protesto à violência, fazendo uma referência ao serial killer John Wayne Gacy, conhecido como o palhaço assassino. O som consiste em um paredão sonoro com o vocal que parece desafiar qualquer limite que um ser humano pode berrar. No palco, mostram domínio de cena e empolgaram o público. O vocalista Fabio Figueiredo ainda elogiou a prática dos cariocas que fecham vans para os festivais similares em São Paulo.
O clima de celebração headbanger (com muita roda de pogo se abrindo) se manteve durante toda a apresentação do Project 46, que, assim como o John Wayne, esteve no Rock In Rio em 2015 no palco Sunset. Por mais de 40 minutos foram desferidos petardos como ‘Violência Gratuita’ e ‘Foda-se (Se Depender de Nós)’.
Na sequência, entrou o Velhas Virgens para dar um toque de humor com seu blues hard rock indecente cheio de letras picantes, sugestivas (ou explícitas mesmo), com muita galhofa e picardia. “Preciosidades” da estirpe de ‘Só Pra Te Comer’, ‘De Bar Em Bar Pela Noite’, ‘Abre Essas Pernas’, ‘Madrugada e Meia’ foram acompanhadas pelo público que entrou no espírito da brincadeira.
O Korzus veio em seguida trazendo de volta o chumbo-grosso e as rodas de pogo. A lenda do metal brasileiro, com 33 anos de estrada, veio com moral de headliner. O thrash metal old school dos paulistas agitou o público com um repertório priorizando músicas dos discos mais recentes entre elas ‘Guilty Silence’, ‘What Are You Looking For?’, ‘Correria’ (do “Ties of Blood” de 2004), ‘Discipline of Hate’, ‘Never Die’ e ‘Truth’ (de “Discipline of Hate”, de 2010).
Ainda houve espaço para uma dos primórdios, ‘Guerreiros do Metal’, de 1985. O show se encerrou com ‘Legion’, faixa-título do último álbum, de 2014. No intervalo, o cicerone Bruno Sutter deu uma canja de seu trabalho solo – sem encarnar a paródia Detonator – com a música ‘My Boss is a Corpse’.
A atração seguinte, o Matanza, veio embalada pelo lançamento do novo single “Assim Começa a Bebedeira”. O conjunto capitaneado pelo do gigante ruivo Jimmy London traz uma sonoridade que seria como se Johnny Cash encontrasse Megadeth. As letras versam sobre bebedeiras, brigas de bar e desilusões amorosas e descontentamento em geral, alternando niilismo com sarcasmo e fanfarronice.
O Matanza estava escalado, de acordo com a programação oficial, para fechar a noite, e de fato boa parte do público trajava camisetas da banda. Foi um dos shows mais animados do festival, calcado nas pérolas ‘O Chamado do Bar’, ‘A Arte do Insulto’, ‘Pé na Porta e Soco na Cara’, ‘Clube dos Canalhas’ e ‘Ela Roubou Meu Caminhão’.
Eis que chega a derradeira banda do dia e do festival. Junto com Sepultura, o Angra é a maior referência do metal brasileiro no exterior e possui um séquito de seguidores que se mantêm fiéis apesar das mudanças na formação. Dos membros originais ficou apenas o guitarrista Rafael Bittencourt, que nos últimos anos ele vem se aventurando nos vocais. Junto a ele estão o vocalista italiano Fabio Lione, o baixista Felipe Adreoli, o baterista Bruno Valverde e o guitarrista Marcelo Barbosa.
O Angra conta ainda com o percussionista Dedé Reis, que tem no currículo Caetano Veloso, Scorpions (DVD Amazônia Live In The Jungle), Carlinhos Brown, Ivete Sangalo, Daniela Mercury, Margareth Menezes e Ricky Martin.
A música que abriu os trabalhos foi ‘Newborn Me’, do último disco, “Secret Garden”. Em seguida vieram duas da fase áurea, que contava com André Matos nos vocais, ‘Wings of Reality’, do álbum “Fireworks”, de 1998 e ‘Nothing to Say’ do “Holy Land”, de 1996. Além das músicas dos referidos álbuns e de “Angel’s Cry”, de 1993 (como ‘Time’), também foi lembrada a fase Edu Falaschi, atual vocalista do Almah, que se apresentou na noite de sábado. Da época do substituto de Matos vieram ‘Waiting Silence’ e duas que já podem ser consideradas clássicas: ‘Rebirth’ e ‘Nova Era’.
Lione cumpre bem o papel à frente da banda, ao mesmo tempo com o estilo estabelecido pelo vocalista original, mas sem se reduzir a imitá-lo. E ainda houve um inesperado bis. Quando realmente parecia que o show já havia terminado, Bruno Sutter chamou a banda de volta ao palco e fez com Lione um dueto no clássico ‘Carry On’.
No balanço geral do Hell In Rio, o evento foi um belo acerto, selecionando a nata do metal nacional, presenteando o Rio de Janeiro, carente de festivais de maior porte destinados a nichos. A iniciativa de levar o gênero para além da “noite do metal” do Rock In Rio é louvável e certamente todos torcem para que entre no calendário da cidade.
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