O Brasil e o Iron Maiden vivem uma lua de mel que já dura mais de três décadas. O antológico show na primeira edição do Rock In Rio não só tornou a banda uma das mais queridas atrações estrangeiras como popularizou de vez o heavy metal no país, que já tinha adeptos, é claro, haja vista a multidão que foi às duas apresentações do quinteto inglês no festival, mas foi após se render ao carisma de Bruce Dickinson que o gênero passou a fazer parte do vocabulário musical.
Depois de sete anos de ausência (a banda só voltaria em 1992), a donzela de ferro passou a ser visita constante no período de baixa popularidade quando contava com Blaze Bayley no lugar de Dickinson e lançava discos sem relevância, mas após a volta do vocalista, continuou mantendo o país como parada obrigatória em suas turnês.
Agora chega a vez da turnê de divulgação do álbum “The Book Of Souls”, lançado no ano passado, e que passará por mais quatro cidades brasileiras. A primeira parada foi o Rio de Janeiro, no HSBC Arena, mais ou menos próximo da cidade do rock original, onde a banda fez seu debut no país. Na aberura dos trabalhos, outros veteranos do chumbo grosso e com boa popularidade no Brasil, os americanos do Anthrax.
Com um set curto por ser a abertura, Scott Ian, Joey Belladonna e Cia cumpriram seu papel de coadjuvante de luxo aquecendo a plateia para a atração principal, mas com uma presença numerosa de fãs que também estavam ali para vê-los.
Às 21 e 15, quinze minutos depois do horário marcado, os dois telões laterais do palco exibem o vídeo do Ed Force One caído na selva sulamericana e recebe a ajuda de uma entidade – o próprio Eddie, mascote da banda, como um espírito da floresta – para decolar e chegar ao destino.
O palco do Iron Maiden segue a configuração clássica de passarela superior em U em volta da bateria, por onde Dickinson passeia por boa parte da apresentação, e motivações do disco que está sendo trabalhado, no caso aqui, construções pré-colombianas. Precedida do frontman encapuzado introduzindo o tal livro das almas, é executada a primeira música, ‘If Eternity Should Fail’, que também abre o disco. Em seguida, o primeiro single de “The Book Of Souls”, ‘Speed Of Life’, recebida com entusiasmo pela plateia antes do primeiro clássico da noite, a nem tão manjada ‘Children Of The Damned’, do álbum “The Number Of The Beast”.
No calor do momento político por que passa o país, o vocalista não deixou o turbilhão passar em branco, e quando uma bandeira nacional foi jogada no palco, e Dickinson, com a diplomacia de sempre, se enrolou nela e disse: “Eu tenho visto muito essa bandeira nos noticiários. E espero que os caras maus se f****, quem quer que sejam”, declarou de forma apartidária.
Não é exagero dizer que o Iron Maiden é a banda britânica mais popular no Brasil depois dos Beatles e dos Rolling Stones, e é sem dúvida a maior referência do metal por aqui. Os fãs brasileiros são apaixonados, como se a banda fosse o time do coração, e muitos ali sequer eram nascidos no show do primeiro Rock In Rio. Assim como Ramones, Nirvana e Pearl Jam, o Maiden tem uma renovação constante de fãs. A paixão é tanta que não se vê o mar de celulares que normalmente se observa nos shows atuais. Quem vai ao show do Iron maiden vai pela experiência.
Com isso, todo show em território brasileiro eles já entram com time ganho. Daí, cientes disso e do fato de que têm em mãos um ótimo disco de divulgação, puderam optar por um setlist generoso com canções novas (quase metade do show é composto de músicas de “The Book Of Souls”, 6 das 15 músicas) ao invés da zona de conforto do “greatest hits”.
Contudo, por mais que novas canções como ‘Tears Of The Clown’, e ‘Death Or Glory’ e ‘The Red And The Black’ tenham sido bem recebidas pelo público que lotava a arena na Barra da Tijuca, todo mundo queria ouvir os cavalos de batalha. A epifania veio em ‘The Trooper’, com o vocalista trazendo a Union Jack perfurada como se saída de uma batalha e a capa clássica do single ao fundo. A música foi seguida de outro clássico, ‘Powerslave’, do disco homônimo de 1984.
Na épica ‘The Book Of Souls’, a tradicional invasão do boneco articulado de Eddie no palco, que ao final da música teve o “coração” arrancado por Dickinson. Daí por diante só clássicos. ‘Hallowed Be Thy Name’, a sempre apoteótica ‘Fear Of The Dark’ com o tradicional coro da plateia, e Iron Maiden, que contou com outra aparição do Eddie estilizado da capa do novo disco, só que em forma de boneco gigante ao fundo do palco.
Na volta para o bis, ‘The Number Of The Beast’, com muita pirotecnia e um belzebu gigante no palco. Em seguida, um clássico mais recente, ‘Blood Brothers’, do disco “Brave New World” de 2000, que foi precedido de um discurso criticando as guerras mundo afora. E para o gran finale, ‘Wasted Years’, outra das favoritas dos fãs, que passou a figurar constantemente no setlist desde a turnê Somewhere Back In Time de 2008/2009.
No palco, o Iron Maiden mostra porque é a maior banda de metal do planeta. Dickinson continua com seu carisma inabalado, e dá muito gosto ver aquele senhor de 57 anos correndo como um garoto depois do recente susto que os fãs tiveram por conta de sua saúde – o cantor teve um câncer na língua, já curado. O inconfundível baixo de Steve Harris, o dono da bola, é responsável pela marcação precisa em simbiose com a bateria de Nico McBrain, deixando os guitarristas Dave Murray, Adrian Smith e o sempre presepeiro Janick Gers deitarem e rolarem em solos e bases. E mantendo a tradição dos shows do Iron Maiden, a plateia saiu de alma lavada
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