Logo na escura entrada da atmosférica exposição Queremos Miles, no primeiro andar do CCBB/RJ, você encontrará fotos e textos sobre o garoto negro que cresceu em meio a uma forte segregação racial e largou o sonho de seu pai de se tornar um dentista para correr atrás do próprio sonho, tocar com seus ídolos, os venerados Charlie “Bird” Parker e Dizzie Gillespie. Já no último ambiente da exposição, quase 50 anos depois, você verá o trompetista na tela da MTV, em desfiles de moda ao lado de Andy Warhol e em comerciais de grandes empresas japonesas. Um verdadeiro rock star.
Miles Davis, um dos maiores trompetistas do Jazz – e um dos grandes inovadores da música, de um modo geral – chega ao Rio de Janeiro numa exposição completa, com sua vida e obra dividida cronologicamente em diferentes ambientes à altura de sua obra, contando com uma imensa variedade de objetos pessoais, roupas, instrumentos musicais, partituras, cartas, discos, fotos, videos e tudo mais o que possa ajudar a ilustrar sua camaleônica carreira. E não é necessário ser um conhecedor de sua obra ou do estilo, já que os textos apresentados se encarregam do contexto necessário.
Além do acervo de objetos que ajudam a inserir Miles no contexto de cada época – e isso inclui, entre outros, um filme de Louis Malle, um videoclipe de Spkie Lee e um quadro de Jean-Michel Basquiat – os grandes acertos da exposição ficam por conta pequenas câmaras acústicas em cada um dos ambientes, onde é possível ouvir faixas do principais discos de sua longa carreira, e entender o quão diversa foi sua discografia. E não são apenas os seus maiores clássicos – Birth of the Cool, Kind of Blue, Miles Ahead, Bitches Brew, On The Corner, etc… – mas quase toda sua imensa discografia.
O visitante também tem a chance de assistir apresentações raras – como intenso e elétrico show no festival Isle of Wight, em 1970 ou uma rara apresentação orquestrada ao lado de Gil Evans nos anos 60. Além disso, fotos raras de suas apresentações e artes originais que deram origem às capas de alguns de seus discos completam a excelente parte visual da exposição. Tudo isso num clima noir que faz o visitante esquecer que existe outro mundo, se não o de Miles.
E para quem não entendeu por que uma exposição sobre um músico merece um andar inteiro, vale ressaltar que Miles Davis teve várias fases na sua carreira, reinventando-se inúmeras vezes, tendo criado sozinho algumas vertentes do jazz. Além disso, foi o primeiro a dar mais espaço criativo em sua banda para nomes como John Coltrane, Chick Corea, Cannonball Adderley, Wayne Shorter e Herbie Hancock.
No dia 28 de setembro, data do falecimento de Miles e encerramento da exposição, uma mesa redonda mediada pelo jornalista Antonio Carlos Miguel reunirá especialistas o critico José Domingos Raffaelli e o músico Vittor Santos.
Queremos Miles, que foi concebida pela Cité de la Musique de Paris em 2010 e agora chega ao Brasil, é uma verdadeira imersão – gratuita, vale ressaltar – na carreira do trompetista. É recomendado reservar uma tarde inteira para bem desfrutar de tanta informação e boa música.
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