A maior sensação na música no Reino Unido depois da Beatlemania foi o Glam Rock. O movimento tinha muito mais a ver com a atitude e o visual do que propriamente com a sonoridade. Consistia em um rock básico, muitas vezes adornado com floreios de cordas e teclados elaborados. Mas era no conceito visual que o Glam (ou Glitter) chamava mais atenção. Homens (e mulheres também) usavam visual andrógeno, com maquiagem, roupas e cabelos espalhafatosos. O consenso coloca a apresentação do T. Rex com a música ‘Hot Love’ no programa de TV britânico Top of the Pops em fevereiro de 1971 como o marco inicial do Glam.
O T. Rex foi formado a partir de um desdobramento do Tyrannosaurus Rex de Marc Bolan. Era um duo folk de pegada hippie formado em 1967 por Bolan e o percussionista Steve “Peregrin” Took. Com o fim da parceria com Took, substituído por Mickey Finn, Bolan encurtou o nome para T. Rex e lançou um disco homônimo em 1970. Em seguida, com a entrada do baterista Bill Legend e do baixista Steve Currie, ganhou a configuração de banda. Com essa formação, gravariam sob a tutela do produtor Toni Visconti o álbum “Eletric Warrior”, maior êxito comercial do grupo, que chegou às lojas em setembro de 1971. A sonoridade eletrificada, introduzida no trabalho anterior, se acentuou. A capa já traduz essa intenção. Traz a silhueta de Bolan empunhando uma Gibson à frente do amplificador. Desse disco saíram clássicos como ‘Get It On’, ‘Cosmic Dancer’ e ‘Jeepster’.
No álbum, há apenas alguns vestígios dos dias de baladas acústicas. Rocks de melodias simples como nos anos 50 ganham roupagem pomposa e autoindulgente. A guitarra de Bolan se mostra raivosa e cortante na maioria das faixas. As letras versam sobre misticismo e espiritualidade, ainda que haja um estímulo para uma interpretação (homo)erótica. Em alguns momentos soam abstratas e em outros meio absurdas mesmo. E inegavelmente irresistíveis. Assim ficavam definidos os elementos que delineariam o Glam.
Logo em seguida, viria “The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders From Mars”, de David Bowie. Lançado em 1972, o álbum também fora produzido por Visconti e Bowie sempre declarou a influência de Bolan sobre seu trabalho. Estava consolidada ali a era Glam. Nomes como Gary Glitter, Roxy Music, Slade e Sweet engrossaram o caldo daquela tendência que àquela altura já virara febre, espalhando-se por outras partes. O sucesso de Bowie e do T. Rex nos Estados Unidos e em diversos países do mundo desencadeou o surgimento de outros ícones. Entre os principais a serem citados, os americanos New York Dolls, Susi Quatro, os finlandeses do Hanoi Rocks. Podemos considerar o Secos & Molhados como o representante brasileiro do movimento Glam. Até mesmo artistas já bem sucedidos como Lou Reed, Iggy Pop (parceiros de Bowie) beberam um pouco no Glam.
Na segunda metade dos anos 70 o sucesso do T. Rex começou a diminuir. Depois de uma sequência de discos aclamados após “Warrior” (“The Slider” e “Tanx”), os discos passaram a amargar críticas mornas e baixas vendagens. A egotrip “Zinc Alloy and the Hidden Riders of Tomorrow” não foi muito bem compreendida. Tampouco o massacrado “Bolan’s Zip Guns”. Em “Futuristic Dragon”, Bolan foi seduzido pela ideia de disco conceitual. No entanto também não logrou êxito, tal como o derradeiro “Dandy in the Underworld”. Em 1977 Bolan morreu em um acidente de carro, dirigido pela namorada, Gloria Jones, com quem teve um filho. Para muitos foi o fim da era Glam, uma vez que David Bowie já havia direcionado sua música para outras vertentes e outros artistas do gênero estavam enfrentando queda de popularidade.
No entanto, engana-se quem acha que o Glam foi sepultado pelo punk e a disco. Nos anos 80 ele ganhou sobrevida em sua versão hard rock, que ficou conhecida como Glam Metal, ou metal farofa aqui no Brasil. Bandas como Poison, Twisted Sister, Cinderella e toda uma leva encheram arenas e os cofres das gravadoras. Já na década de 90 houve uma espécie de renascença, encabeçada pelos ingleses do Suede e um pouco mais adiante pelo Placebo. Sem contar com homenagens prestadas por bandas como o Oasis, que usou o sampler de ‘Get it On’ em ‘Cigarettes and Alcohol’. O cinema também lembrou o movimento. Filmes como “Velvet Goldmine”, inspirado na trajetória de Bowie, Lou Reed e Iggy Pop, e “Billy Elliot”, que trazia várias músicas do T. Rex na trilha, reforçaram o revival Glam.
Se vivo estivesse, Marc Bolan teria completado 70 anos no último dia 30 de setembro. Esse que foi um dos maiores ícones da História do rock merece celebração incessante, uma vez que vive através de seu legado. O T. Rex não foi popular no Brasil. Mas graças à internet, mesmo aqui ele é lembrado constantemente em festas descoladas e encontros de amantes da boa música.
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